quinta-feira, 26 de julho de 2012

CPP/AULA I e II


AULA I – Introdução

Questão: O que é o Direito Processual Penal? De acordo com Frederico Marques, “é o conjunto de princípios e normas que regulam a aplicação jurisdicional do direito penal, bem como as atividades persecutórias da Polícia Judiciária, e a estruturação dos órgãos da função jurisdicional e respectivos auxiliares”. Para Guilherme de Souza Nucci, “é o corpo de normas jurídicas cuja finalidade é regular a persecução penal do Estado, através de seus órgãos constituídos, para que se possa aplicar a norma penal, realizando-se a pretensão punitiva no caso concreto”. Em síntese, o Direito Processual Penal visa ferir efetividade ao direito penal, fornecendo os meios e o caminho para materializar a aplicação da pena ao caso concreto (Nestor Távora).

1.1 A finalidade do processo penal pode ser dividida em: (1) mediata [diz respeito à própria pacificação social obtida com a solução do conflito] e (2) imediata [ligada ao fato de que o direito processual penal viabiliza a aplicação do direito penal ao caso concreto].

1.2 Características do Direito Processual Penal:

a) autonomia
b) instrumentalidade: é o meio para fazer atuar o direito material penal, consubstanciando o caminho a ser seguido para a obtenção de um provimento.
c) normatividade: é uma disciplina normativa, de caráter dogmático, inclusive com codificação própria (CPP – Dec-Lei 3.689/41). Nucci lembra que o CPP nasceu em pleno “Estado Novo”, no governo ditatorial de Vargas (influência fascista). Nesse ponto, vale lembrar que o CPP vem recebendo alterações fracionadas. Contudo, há um Projeto de Lei (PL 8.045/10) buscando a reformulação conjunta do sistema processual brasileiro (Pacelli).

Obs.: O professor Eugênio Pacelli lembra que a primeira legislação codificada do Brasil foi o Código de Processo Criminal de Primeira Instância (1832).

1.3 Relembrando os estudos de TGP:

Questão: A existência de lide no processo penal é obrigatória? Trata-se de questão controvertida. Gustavo Henrique Badaró apregoa que a lide não é condição essencial para o surgimento e desenvolvimento do processo. Ela pode até existir quando o acusado resistir à pretensão formulada pela acusação, mas é absolutamente irrelevante para o desenvolvimento e decisão do processo. Lembre-se que, o fim do processo penal é aplicação adequada da lei penal.

Nestor Távora lembra dos aspectos que circundam o processo:
1) Aspecto objetivo: procedimento – sequência de atos praticados no processo.
2) Aspecto subjetivo: relação jurídica processual – é o nexo que une e disciplina a conduta dos sujeitos processuais em suas ligações recíprocas durante o desenrolar do procedimento, sendo seus elementos identificadores:

ð os sujeitos processuais.
ð o objeto da relação (material e processual)
ð pressupostos processuais: (i) subjetivos [relativos ao juiz: investidura, competência e ausência de suspeição; relativos às partes: capacidade de ser parte, de estar em juízo e postulatória]; (ii) objetivos [extrínsecos: ausência de fatos impeditivos para o regular trâmite do processo; intrínsecos: regularidade formal].

1.4 Sistemas Processuais

1) inquisitivo: caracterizado pela ausência de contraditório e ampla defesa, com a concentração das funções de acusar, defender e julgar numa única pessoa (juiz inquisidor). O procedimento é escrito e sigiloso (inspirado no Código Rocco – fascismo italiano). Inicia o processo com a notitia criminis.

2) acusatório: é o adotado no Brasil. Há a separação das funções de acusar, defender e julgar. Os princípios do contraditório, ampla defesa e publicidade regem todo o processo. Concede imparcialidade ao julgador e valoração probatória com base no livre convencimento motivado (origem no Direito grego). Perceba que o sistema acusatório brasileiro não é um sistema estático (ortodoxo ou puro), pois permite-se ao juiz a prática de alguns atos de ofício (Nestor Távora). Inicia-se o processo com o oferecimento da peça acusatória (denúncia ou queixa).

3) misto/acusatório formal: possui uma instrução preliminar, secreta e escrita, a cargo do juiz, com poderes inquisitivos, no intuito da colheita de provas, e por uma fase contraditória (judicial) em que se dá o julgamento, admitindo-se o exercício da ampla defesa e de todos os direitos dela decorrentes, mas somente após a instrução probatória (origem na Revolução Francesa). Para Norberto Avena, há uma face desse sistema denominada “sistema inquisitivo garantista”. Trata-se de um modelo processual intermediário que não é completamente inquisitivo nem acusatório, pois são permitidas respectivamente garantias constitucionais e produção de provas de ofício.

Questão: Por que o sistema processual brasileiro não pode ser classificado como misto ou acusatório formal? É de se notar que o sistema brasileiro possui uma fase pré-processual. Logo, a fase inquisitória que existe no Brasil não é processual. Por esse motivo, Eugênio Pacelli sustenta a impossibilidade da decretação de prisão preventiva de ofício pelo juiz na fase policial, salvo em hipóteses excepcionais (art. 310, II, CPP).

1.5 A CRFB/88 e o CPP

Eugênio Pacelli lembra que enquanto a legislação codificada (CPP de 1941) pautava-se pelo princípio da culpabilidade e periculosidade do agente, o texto constitucional instituiu um sistema de ampla garantias individuais, a começar pela afirmação da situação jurídica de quem ainda não tiver reconhecida a sua responsabilidade penal por sentença condenatória passada em julgado (princípio da não culpa). Nesse ponto, vale frisar o caminhar do direito penal e processual penal em busca da justiça restaurativa (Nucci).

Leitura obrigatória: (1) Guilherme de Souza Nucci. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 8ª ed. RT. p. 55-78; (2) Exposição de motivos do CPP.



AULA II – Do Processo em Geral (continuação)

2.1 Fontes do DPP

a) Fonte material ou de produção: compete à União legislar sobre direito processual penal. Permite-se aos estados legislarem sobre questões específicas de direito local, desde que exista LC nesse sentido (art. 22, I, CRFB). Vale lembrar que o presidente poderá legislar, via Decreto, sobre o indulto (art. 84, XII, CRFB). Outro ponto que merece destaque é a possibilidade dos estados legislarem em matéria procedimental. Ex.: organização judiciária.

Questão: Qual a consequência para o réu se o Presidente inovar em matéria processual penal através de uma MP? Segundo LFG, se for em favor do réu, poderá ser aplicada, mesmo se inconstitucional. O professor Nestor Távora não concorda com esse entendimento, lembrando da possibilidade do Presidente privilegiar um amigo.

b) Fonte formal ou de cognição: revela a norma
i) direta/imediata – leis (CF, EC, LO e LC) e tratados. Nesse ponto, cumpre mencionar a criação de três regras pela Convenção Americana dos Direitos Humanos (Dec. 678/92): (1) direito ao julgamento por um juiz ou tribunal imparcial; (2) o direito ao duplo grau de jurisdição; e (3) a vedação ao duplo processo pelo mesmo fato.

ii) indireta/mediata/supletiva – costumes (praxe forense – art. 4º LIDB) e princípios gerais do direito (de acordo com a consciência ética do povo).

Obs. 1: para LFG, essa classificação de fontes formais recebeu outro tratamento após a EC 45, veja:

IMEDIATAS
MEDIATAS
Lei – fonte única do direito penal incriminador interno
CRFB; tratados internacionais de direitos humanos; MP e jurisprudência
Doutrina (explica ou interpreta as fontes formais imediatas).
Os costumes figuram como fontes informais de direito. Ex.: vestes talares no tribunal do júri.

Obs. 2: Consoante ao entendimento acima, Nucci defende que o STF passou a ser fonte material do direito processual e as súmulas vinculantes fonte formal.

Questão: A analogia é fonte? A analogia é um processo de integração da norma, por um método de semelhança, voltado ao suprimento de lacunas (ubi eadem ratio, ubi idem ius – onde houver a mesma razão, deve ser aplicado o mesmo direito). Assim, inexistindo lei específica para regular determinada situação, permite-se sua utilização. Nessa linha, entende-se ser a analogia fonte de expressão do direito e elemento de suprimento de lacunas. A analogia poderá ser legal (aplica-se uma lei semelhante) ou jurídica (aplica-se um princípio jurídico).

Obs.: interpretação analógica – busca-se contemplar um fato partindo de uma regra genérica estabelecida na própria lei. Ex. 1: art. 121, CP - homicídio mediante paga, promessa de pagamento ou outro motivo torpe. Ex. 2: art. 225, II, CPP – suspeição do juiz “estiver respondendo a processo por fato análogo”.

2.2 Interpretação da lei processual penal

(1) quanto à origem:

a) autêntica ou legislativa - realizada pelo próprio legislador que, através de outro texto de lei, faz os esclarecimentos necessários sobre determinado assunto, podendo ser contextual (no próprio texto interpretado) ou posterior (em outro diploma).
b) doutrinária ou científica – realizada pelos estudiosos do direito. Ex.: exposição de motivos do CPP (não tem conteúdo de lei).
c) judicial ou jurisprudencial – aplicação do direito conferida pelos juízes e tribunais. Ex.: súmula vinculante.

(2) quanto ao modo ou aos meios empregados:

a) literal, gramatical o sintática
b) teleológica – finalidade da norma
c) lógica – vale-se das regras de raciocínio e conclusão para compreender o espírito da lei.
d) histórica – analisa o contexto da votação do diploma legislativo, os debates, as emendas proposta etc.
e) sistemática – as normas fazem parte de uma comunidade, interrelacionando-se. Logo, a interpretação sistemática leva em conta a norma colocada num todo, ou seja, com integrante de um ordenamento jurídico (devem ser interpretadas conjuntamente).

(3) quanto ao resultado:

a) extensiva/ampliativa (art. 3º, CPP) – o texto da lei está aquém do que desejava. Ex. 1: o CPP menciona a expressão “réu”, mas permite-se a inclusão de “indiciado”. Ex.: 2: a suspeição do juiz, deverá ser estendida aos jurados.
b) declarativa – exata correspondência entre o texto da lei e o que ela deseja externar.
c) restritiva – a norma disse mais do que desejava.
d) progressiva/adaptativa/evolutiva – o direito é dinâmico e os fenômenos sociais não são estanques, exigindo do intérprete o esmero na atualização dos diplomas normativos, pois a realidade o impõe, dando-se efetividade à norma não trabalhada ou não modernizada pelo legislador (Távora).

2.3 Aplicação da lei processual penal no tempo

regra: tempus regit actum. A norma processual penal tem aplicação imediata, pouco importando se gravosa ou não à situação do réu. Os atos anteriores já praticados antes da vigência da nova norma continuam válidos, pois devem ser respeitados o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Vale lembrar que a norma penal, diferentemente da processual, não poderá retroagir para prejudicar o réu (salvo nas hipóteses de leis temporárias).

As normas processuais podem ser:

a) genuinamente processual – cuida de procedimentos, atos processuais e técnicas do processo. Para essas normas aplica-se o art. 2º, CPP.
b) processual material /híbrida/mista - aquela que traz preceitos tanto de direito penal processual quanto de direito material. Há duas correntes que definem essa norma: 1ª corrente – restritiva – é aquela que, embora disciplinada em diploma processual penal, dispõe sobre o conteúdo da pretensão punitiva, acarretando a perda do direito de punir do Estado. Ex.: prescrição, decadência, perempção, direito de queixa etc.; 2ª corrente – ampliativa – é aquela que estabelece condições de procedibilidade, meios de prova, liberdade condicional, prisão preventiva, enfim, todas as normas que produzam reflexos no direito de liberdade do agente.

Com efeito, para a norma processual material aplica-se a irretroatividade da Lei mais gravosa, pois como não poderá haver cisão, deverá prevalecer o aspecto penal.

Obs. 1: não confunda com a norma processual heterotópica (aquela que possui natureza diversa do diploma em que foi inserida. Ex.: direito ao silêncio (norma penal dentro do CPP – art. 186, CPP).
Obs. 2: Paulo Queiroz e Antonio Vieira defendem a irretroatividade da lei penal mais gravosa também deve ser aplicada à processual penal, de sorte a potencializar as garantias inerentes ao imputado, permanecendo a regra do art. 2º, CPP apenas para as normas genuinamente processuais (aplicação imediata).

2.4 Aplicação da lei processual penal no espaço

É regulamentada pelo princípio da territorialidade absoluta (art. 1º CPP e art. 5º, CP). Excepcionalmente permite-se a aplicação de outros diplomas normativos.
(1) Tratados e convenções: conferir o § 3º do art. 5º, CRFB (novo tratamento aos tratados sobre direitos humanos). Os demais tratados serão recepcionados como lei infraconstitucional. Ex. 1: Decreto 40/91 – convenção contra a tortura e outros tratamentos desumanos ou penas cruéis; Ex. 2: obrigatoriedade da punição pelo Estado (exigência de persecução penal), bem como execução às vítimas; Ex. 3: imunidade diplomática; Ex. 4: submissão ao TPI (para Saulo José Casali Bahia, o TPI passou a integrar o judiciário brasileiro sob a forma de órgão especial).

Obs.: o TPI possui competência para julgar os crimes de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e de agressão. É composto de 18 juízes. Possui aplicação complementar (Estatuto de Roma).

(2) outras normas brasileiras: Ex. 1: crimes militares (CPM); Ex. 2: crimes de responsabilidade (Poder Legislativo); Ex. 3: crimes eleitorais. Perceba que o CPP poderá ser aplicado em caráter suplementar.

Obs.: Tribunal de Segurança Nacional – não mais existe no Brasil. Logo, os crimes da Lei 7.170/83 serão julgados pela Justiça Federal.

[Próxima aula - Aula III - Inquérito Policial]

Trabalho.: Princípios do Processo Penal. Data de entrega: 1ª prova do 1º bimestre (vale 0,5). Vale lembrar que os princípios serão abordados durante o semestre.


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