terça-feira, 30 de outubro de 2012

PENAL 2/AULA XV e XVI


AULA XV - DA AÇÃO PENAL (art. 100, CP e 24 CPP)

15.1 Conceito: é o direito de pedir ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo a um caso concreto. É também o direito público subjetivo do Estado-Administração, único titular do poder-dever de punir, de pleitear ao Estado-Juiz a aplicação do Direito Penal objetivo, com a consequente satisfação da pretensão punitiva.

15.2 Espécies: Ação penal pública (condicionada, incondicionada) e ação penal privada. Em regra a ação será pública, salvo quando a lei dispuser em sentido contrário.

1) Ação penal pública:

a) incondicionada: tem como titular o MP. Aqui existe uma outra espécie: privada subsidiária da pública;         b) condicionada: mediante representação do ofendido ou   Ministro da Justiça; c) a doutrina também menciona a subsidiária da pública.     

Obs.: Uma vez iniciada a ação, o MP assumirá o processo. Ex.: lesão leve; estupro; furto de coisa comum etc.

2) Ação penal privada: substituição processual ou legitimação extraordinária. Aqui o MP não poderá atuar como parte.

a) exclusivamente privada; b) personalíssima (nem o representante pode oferecer); c) subsidiária da pública (por inércia do MP).

15.3 Condições da ação penal: “PLIn” do CPC + condições específicas de procedibilidade: a) representação do ofendido ou requisição do ministro da Justiça; b) entrada do agente em território nacional; c) autorização legislativa para instauração de processo contra o Presidente e Governadores, por crimes comuns; d) transito em julgado da sentença que, por erro ou impedimento, anule o casamento, no crime de induzimento a erro essencial ou ocultamento do impedimento.

15.4 Representação: ver art. 24, § 1º, CPP: “CADI”. Para os incapazes, se não forem representados, nomeiam-se curadores especiais (art. 33, CPP). As pessoas jurídicas podem ser representadas pelos sócios-gerentes ou diretores (art. 37, CPP).

15.5 Prazo para a representação: decadencial de 6 meses. Ver arts. 103, CP e 38, CPP. A lei de imprensa estabelecia esse prazo em 3 meses.

15.6 Forma da representação: não há peça específica. Logo, um simples boletim de ocorrência demonstrará a intenção do ofendido. Pode ser dirigida ao juiz, MP ou delegado. Todavia, a representação não vincula o MP.

15.7 Eficácia objetiva da representação: decorre da indivisibilidade da ação.

15.8 Irretratabilidade: após o oferecimento da denúncia será irretratável a representação do ofendido (art. 25, CPP).


AULA XVI – EXTINÇÃO DE PUNIBILIDADE

16.1 Punibilidade: não integra o crime, mas é a consequência jurídica deste. Logo, o crime não depende da punibilidade. É o direito que tem o Estado de aplicar a pena cominada no preceito secundário da norma penal incriminadora, contra quem praticou a conduta (ação ou omissão) descrita no preceito primário, causando dano ou lesão jurídica. Muñoz Conde defende ser o 4º substrato do crime.

Essa punibilidade (direito de punir) sofre limites: a) Temporal: prescrição; b) Espacial: princípio da territorialidade (art. 5º, do CP); e c) Modal: princípio da humanização (estão proibidas no Brasil as penas desumanas e cruéis).

Obs. 1: Algumas condutas exigem condições objetivas para a punibilidade, isto é, somente serão punidas se ocorrer a condição externa ao delito (indiferente para a consumação, mas necessária para o aperfeiçoamento da punibilidade). Ex.: (1) prejuízo superveniente no delito de introdução ou abandono de animais em propriedade alheia (art. 164). (2) sentença de falência ou recuperação judicial.
Obs. 2: cuidado com a condição de procedibilidade que possui natureza processual, quer dizer, evita o início ou o prosseguimento da ação penal. Ex.: (1) representação do ofendido; (2) requisição do Ministro da Justiça. Cuidado! as condições objetivas de punibilidade se comunicam aos demais agentes.
           
Questão: O que é escusa absolutória? São hipóteses em que, embora praticado o delito, a imputação do agente fica obstada por expressa previsão legal, por razões pessoais (política criminal). Também é denominada como causa pessoal de exclusão de pena / causa pessoal de isenção de pena / condição objetiva de punibilidade negativamente considerada / causa de não punibilidade em sentido estrito. Por ser inerente ao agente, não se comunica aos demais envolvidos. Ex.: art. 181, CP. Há uma classificação em escusa absolutória anteriores (são as determinada em lei antes mesmo da prática delitiva – são preexistentes) e posteriores (determina após a prática delitiva – o legislador avalia ulteriormente).

Comportamento pós-delitivo positivo (Luiz Régis Prado): refere-se à atenuação da pena ou isenção desta em algumas hipóteses: antes do crime (arrependimento eficaz ou desistência voluntária – escusa anterior); após o crime (arrependimento posterior, reparação do dano, confissão etc. – escusa posterior).

Vale lembrar que há previsão na parte especial do CP de outras hipóteses de extinção de punibilidade, como aquela prevista no art. 312, §3º (peculato culposo). A legislação penal extravagante também prevê causas extintivas da punibilidade, como, por exemplo, o cumprimento da transação penal e do sursis processual, previstos na Lei 9.099/95.      
           
Obs.: Há quem entenda que a imunidade parlamentar absoluta, prevista na CRFB/88, é causa de extinção da punibilidade. Contudo, o STF entende ser excludente de culpabilidade.

Finalmente, há casos de extinção da punibilidade supralegais: Súmula 554, do STF, que deve ser lida a contrario sensu: pagamento de cheque sem fundo ANTES do recebimento da denúncia. Veja: O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta o prosseguimento da ação penal. Nesse ponto, vale recordar algumas causas supralegais excludentes: a) de tipicidade (princípio da insignificância); b) de ilicitude (consentimento do ofendido); e d) de culpabilidade (inexigibilidade de conduta diversa).
           
16.2 Causas de extinção da punibilidade (art. 107, CP):

I- Morte do agente: O termo “agente” abrange o autor do crime em qualquer das fases da persecução penal (indiciado, réu, recorrente ou recorrido e reeducando).  Assim, extingue-se a punibilidade a qualquer tempo e todos os efeitos penais de uma eventual condenação. Fundamento: princípio ou garantia constitucional da personalidade ou pessoalidade da pena. Decorre do P. mors omnia sovt (a morte tudo solve). Nem mesmo a pena de multa pode ser transmitida aos herdeiros do falecido. Entrementes, os efeitos extrapenais permanecem. Ex.: Perdimento de bens estendida aos sucessores no limite da herança (art. 5º, XLV, CRFB/88).

A morte do agente é comprovada mediante original da certidão de óbito (art. 62, do CPP – exemplo de prova tarifada). A declaração de ausente e a guia de sepultamento não têm o condão de comprová-la.

Obs.: A doutrina moderna tem admitido a sentença que presume a morte para gerar a extinção da punibilidade.

Questão: Qual a consequência da extinção de punibilidade fundamentada em certidão de óbito falsa? 1ª Corrente - considerando a imutabilidade do trânsito em julgado da sentença e a vedação de revisão criminal pro societate, apenas restará ao MP deflagrar investigação do crime de falsidade documental (Capez); 2ª Corrente - Mirabete e Pacelli entendem que a certidão atestou uma morte inexistente para fundamentar a sentença, ensejando a inexistência da própria decisão e seus efeitos. Assim, de acordo com essa corrente, o agente, além de responder por falsidade documental, deverá ser julgado na ação pela qual estava sendo processado (O STF adota essa corrente).
           
Questão: A morte do condenado impede a revisão criminal e/ou reabilitação? É possível revisão criminal mesmo após a morte do agente, até porque esse fato não extingue os efeitos civis da sentença penal. Por outro lado, após a morte do agente, não será possível a reabilitação criminal.

Obs. 1: A morte da vítima extingue a punibilidade apenas nos casos de crimes de ações penais privadas personalíssimas (apenas o crime previsto no art. 236, do CP – induzir o contraente de casamento em erro).
Obs. 2: Contra a decisão que extingue a punibilidade pela morte do agente cabe o RESE ou agravo de execução, conforme ocorra, respectivamente, antes ou depois do trânsito em julgado.     

II - Anistia, graça ou indulto (indulgência principis): espécies de renúncia estatal ao direito de punir que só podem ser acolhidas após decisão do poder judiciário (são institutos de política criminal), em outros termos, depende de requerimento ou da ação de ofício do juiz. São possíveis em crimes de ação penal privada, pois o direito de punir continua sendo do Estado, logo, plenamente aplicáveis.

Questão: O que são leis-medidas? São aquelas dotadas de efeitos concretos e específicos, inseridas para regular situações certas e determinadas. Ex.: Lei de anistia.
           
Anistia: É uma espécie de ato legislativo federal (CN), ou seja, lei penal federal devidamente sancionada pelo executivo (pode ser vetada), através da qual o Estado, em razão de clemência, esquece um fato criminoso, apagando seus efeitos penais, permanecendo, todavia, os efeitos extrapenais. É uma lei penal anômala, pois é feita para deixar de punir determinados fatos. Em regra, não é pessoal. Todavia, permite-se uma limitação. Não pode ser recusada pelo destinatário, salvo a condicionada. Outrossim, não admite revogação.

Classificação doutrinária da anistia:

ð Anistia própria: quando concedida antes da condenação;
ð Anistia imprópria: quando concedida após a condenação;
ð Anistia restrita: exige condições pessoais do agente. Ex.: só anistia o primário;
ð Anistia irrestrita: quando não exige condições pessoais do agente (subjetivo);
ð Anistia condicionada: exige o preenchimento de certos requisitos. Ex.: reparação do dano;
ð Anistia incondicionada: quando não exige qualquer requisito objetivo;
ð Anistia comum: será comum quando atinge crime comum;
ð Anistia especial: será especial quando atinge crime político;

Obs.: uma vez concedida não pode a anistia ser revogada, porque a lei posterior prejudicaria os anistiados, em clara violação ao principio constitucional da retroatividade de lei maléfica ao acusado. Em regra, é concedida aos crimes políticos.

Graça / Indulto: Espécies de renúncia estatal do direito de punir. Instituto extintivo da punibilidade concedidos ou delegados pelo Presidente da República (AGU e Ministro da Justiça), através de decreto presidencial (artigo 84, XII, CRFB), atingindo apenas os efeitos executórios e penais da condenação, subsistindo o crime e seus efeitos secundários. Logo, valerá para computar eventual reincidência. Note que somente se exclui o restante da pena a ser cumprida.

A graça e o indulto pressupõem a condenação transitada em julgado. Para o STF, basta o trânsito em julgado para a acusação, em decorrência da possibilidade da execução provisória para o acusado preso. Assim, admite-se graça e indulto com a mera condenação provisória (desde que não haja recurso com efeito suspensivo). Fundamento: súmula 716 do STF; resolução n. 113 do CNJ; e parágrafo único, do art. 2º da LEP.

Diferenças entre graça e indulto:

GRAÇA: Benefício individual que depende de provocação (MP, condenado, Conselho Penitenciário ou autoridade administrativa); tem destinatário certo; possui caráter eminentemente subjetivo.
INDULTO: Benefício coletivo que não depende de provocação (é realizado de ofício); não tem destinatário certo; possui caráter de natureza mista (avalia o quantum, a espécie de pena e o comportamento carcerário).
           
Espécies de graça / indulto:

ð Plenos: quando extingue totalmente a pena.
ð Parciais: quando somente diminuem ou substituem a pena (comutação de pena).
ð Incondicionados: quando não impõe qualquer condição especial ao condenado.
ð Condicionados: quando impõe condição especial para sua concessão (ex.: primariedade).
ð Restrita: exige condições pessoais do agente. Ex: só anistia o primário.
ð Irrestrita: quando não exige condições pessoais do agente.

Obs. 1: Apesar de incomum, não existe vedação legal para a concessão de indulto em medida de segurança.
Obs. 2: Lembre-se que o Decreto é o veículo da graça e do indulto, jamais da anistia.
           
Comentários acerca das renúncias estatais e os crimes hediondos:

A Lei 8.072/90 em seu artigo 2º acrescentou o indulto na vedação constitucional prevista à anistia e graça. Com isso, passou-se a duvidar da constitucionalidade dessa inclusão: 1ª Corrente - a lei nesse dispositivo é inconstitucional, pois a CRFB traz rol taxativo de proibições (traz o rol máximo); 2ª Corrente - o STF entende não ser inconstitucional, pois o próprio constituinte deixou reservado ao legislador regulamentar o dispositivo constitucional. Ademais, a CRFB traz rol exemplificativo (é a corrente predominante).

III - Retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso - ABOLITIO CRIMINIS. Permanecem os efeitos extrapenais. Ver art. 2º, CP. Ex.: adultério.

IV - Prescrição, decadência ou perempção [Prescrição próxima aula]

Decadência – é a perda do direito de ação privada ou do direito de representação, em razão de não ter sido exercido dentro do prazo legalmente previsto. A decadência fulmina o direito de agir, atinge diretamente o jus persequendi. Em regra, o prazo é de 6 meses. Exceção: art. 91, Lei 9.099/95 (30 dias). O prazo aqui não se suspende, não se interrompe e não se prorroga.

Perempção – é a perda do direito de prosseguir no exercício da ação penal privada, ou seja, uma sanção jurídica aplicada ao querelante pela sua inércia ou mau uso da faculdade que o poder público lhe concedeu, privativamente, na persecução de determinados crimes. Há uma presunção de desistência (ver art. 60. CPP). Ex.: não apresentação de contrarrazões de recurso, salvo quando intempestivas. Lembre-se que só existe perempção nas ações penais privadas (exclusiva e personalíssima), pois na ação penal privada subsidiária da pública o MP retomará a titularidade da ação.

Obs.: não será possível o reinício da ação após a perempção.

V – a) Renúncia: a vítima ou seu representante legal abdica do direito de promover a ação penal. É utilizada na fase pré-processual.

Questão: A renúncia para extinguir a punibilidade precisa da aceitação do agente (é unilateral ou bilateral)? Trata-se de ato unilateral, independe da aceitação do agente. Note que, a partir de 1995 é possível renúncia nos crimes de ação penal pública, em decorrência da previsão do art. 74, § único, da Lei 9.099/95 (crimes de menor potencial ofensivo).

Obs.: A renúncia é sempre extraprocessual (impede a formação do processo). Logo, não existe renúncia processual. Note que a renúncia pode ser expressa (art. 50, CPP) ou tácita (vítima comportando-se de forma incompatível com a vontade de processar o agressor). A aceitação da reparação de dano, em regra, não gera aceitação tácita. Contudo, a composição civil dos danos, da Lei 9.099/95, incide em renúncia de queixa ou de representação. É estendida aos coautores ou partícipes.

V - b) Perdão do ofendido aceito: é um desdobramento lógico do P. da disponibilidade, através do qual, o ofendido ou seu representante legal desiste de prosseguir com a ação penal em curso. Cuidado! Trata-se de ato bilateral, isto é, para extinguir a punibilidade precisa ser aceito pelo acusado. Logo, o que extingue a punibilidade é o perdão aceito e só é admitido nos crimes de ação penal privada.

Obs. 1: Perceba que é plenamente possível, em caso de coautoria, o processo continuar em face de um dos autores. Diversamente, isso não é possível na renúncia. Pode ocorrer na fase pré-processual (art. 50 e 56, CPP).
Obs. 2: O perdão é sempre incondicionado, assim como o ato de aceitar. O juiz deve desconsiderar as condições agregadas ao ato processual.

VI - Retratação do agente: retirar o que disse / devolver a verdade / demonstrar arrependimento. É muito mais que uma simples confissão. É ato unilateral que dispensa a oitiva da vítima. Impede o direito punitivo, mas não na esfera cível (reparação civil). Deve ser feito antes da decisão de 1º grau (se for depois poderá atenuar).

Hipóteses:

1) calúnia (art. 143)
2) difamação
3) falso testemunho (art. 342, § 3º)
4) falsa perícia

Obs. 1: não se confunde com a retratação da vítima, na ação penal pública condicionada à sua representação.
Obs. 2: não se aplica aos crimes de injúria, pois não seria possível retirar um gesto ou palavra dita.
Obs. 3: na falsa perícia o testemunho, a retratação deve ser feita até a publicação da sentença no processo que ocorreu a falsidade.
           
Questão: Qual é o prazo para a retratação? Depende do crime: para calúnia e difamação, deve ser realizada antes da sentença de 1 º grau do processo instaurado para julgar esses delitos. Para o falso testemunho e falsa perícia, deve ocorrer antes da sentença de 1º grau que ocorreu o falso, e não no processo instaurado em decorrência deste.

Questão: O que é perdão judicial? Para Bitencourt, trata-se de um direito público subjetivo do réu, pois a partir do momento que este preenche os requisitos legais, não poderá ser negado. Todavia, para a concessão do benefício a conduta deve ser de pequena ofensividade. Ex.: homicídio ou lesão culposos que acarretam consequências tão graves na esfera individual do agente que a sanção penal se torna desnecessária. A Lei 9.807/99 prevê um perdão judicial dificilmente a ser alcançado na prática (colaboração em investigação, com no mínimo 3 criminosos – art. 13). Para o STJ, trata-se de sentença declaratória de extinção de punibilidade (súmula 18).          

16.3 Dispositivos revogados pela Lei 11.106/06:

VII – casamento do agente com a vítima: em decorrência da abolitio criminis do adultério, o legislador achou por bem revogar os incisos VII e VIII do art. 107, CP. Todavia, para Bitencourt, a revogação do inciso VII foi equivocada, pois não há discriminação alguma no dispositivo, que, aliás, deixou sem sentido a previsão do art. 1.520 do CC/02 que previa a redução da idade núbil da vítima para casar com o agressor e evitar a punibilidade.

VIII – casamento da vítima com terceiro, desde que não cometido com violência ou grave ameaça ou que a vítima não requeira o prosseguimento do IP ou da ação penal no prazo de 60 dias, contados da celebração.


PENAL 2/AULAS XIII e XIV


AULA XIIIREABILITAÇÃO CRIMINAL (Art. 93, CP)
           
13.1 Origem: restitutio in integrum – clemência soberana extintiva da pena e restauradora dos direitos patrimoniais e morais (Roma). No Brasil, foi prevista no CP de 1890 como causa extintiva da condenação, concedendo direito automático à reintegração dos direitos perdidos e indenização em caso de inocência (Luiz Régis Prado). O CP de 1940 estabeleceu o instituto como causa extintiva da punibilidade, alcançando unicamente penas de interdição. Hoje está prevista no Título V, Capítulo VII, CP, como causa de suspensão de alguns efeitos da condenação (item 82 da exposição de motivos do CP).

13.2 Conceito: é a declaração judicial de que estão cumpridas ou extintas as penas impostas ao sentenciado, que assegura o sigilo dos registros sobre o processo e atinge outros efeitos da condenação.          

13.3 Natureza jurídica: trata-se de causa suspensiva de alguns efeitos  secundários da condenação (CP, art. 92) e dos registros criminais, ao contrário do que dispunha a lei anterior, que a considerava causa extintiva da punibilidade. Assim, justamente por não se tratar de causa extintiva da punibilidade é que é possível a revogação da reabilitação com o restabelecimento dos efeitos penais da condenação que foram suspensos (Capez).

Trata-se de medida políticocriminal para a reinserção social do condenado (Luiz Régis Prado).

Bitencourt avisa que a redação do art. 93 não possui o alcance desejado pelo legislador, pois a única vantagem pratica é garantir algo que hoje não precisa de declaração judicial: sigilo da condenação.

Para Greco, o único efeito prático é a reabilitação para dirigir veículo, quando este for utilizado na prática de crime doloso.

13.4 Cabimento: somente para condenações com o trânsito em julgado, cuja pena tenha sido executada ou extinta.

13.5 Consequências:

a) sigilo sobre o processo e a condenação: é assegurado o sigilo dos registros criminais do reabilitado, que não serão mais objeto de folhas de antecedentes ou certidões dos cartórios. Note que esse efeito passou a ser automático, dispensando a reabilitação (art. 202 da LEP). Cuidado! O sigilo não é absoluto (art. 748, CPP).

Vale lembrar que esse sigilo também é previsto no art. 163, § 2º, LEP (sursis penal).

b) suspensão dos efeitos extrapenais específicos: é suspensa a perda do cargo ou função pública, a incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela e a inabilitação para dirigir veículo. A lei, contudo, veda a recondução ao cargo e a recuperação do pátrio poder, ficando a consequência da reabilitação limitada à volta da habilitação para dirigir veículo. 

13.6 Pressupostos (cumulativos, para reincidente ou não):

a) decurso de 2 anos da extinção da pena, ou da audiência admonitória, no caso de sursis ou livramento condicional. Em caso de prescrição da pena, conta-se a partir desta. Para as multas, a partir do seu pagamento. Quando houver mais de uma condenação, a reabilitação não poderá ser concedida de forma autônoma. Poderá ser computado o período do sursis penal ou do livramento condicional, desde que não sejam revogados. Agora, se esses benefícios possuírem prazo superior a 2 anos, aguarda-se o cumprimento desses para a concessão da reabilitação.
           
b) bom comportamento público e privado durante esses 2 anos;

c) domicílio no país durante esses 2 anos (Bitencourt contesta a constitucionalidade desse requisito, alegando limitar desnecessariamente o status libertatis do condenado);
           
d) reparação do dano, salvo absoluta impossibilidade de fazê-lo ou renúncia comprovada da vítima. Para o STJ, a insolvência deve ficar completamente provada para que o condenado se livre da exigência de reparação do dano, não bastando meras presunções. Se já se operou a prescrição da dívida no âmbito cível, dispensa-se o requisito da reparação do dano.  
           
Obs.: a não observância dos requisitos gera carência de ação.

13.7 Revogação: pode ser decretada de ofício ou a requerimento do MP, quando ocorrer a reincidência, salvo condenação à pena de multa. Para Mirabete, é também excepcionada essa regra em caso de condenação à penas restritivas de direitos, em observância à nova sistemática da legislação penal.
           
13.8 Competência para a concessão: juiz da condenação, uma vez que a reabilitação só se concede após o término da execução da pena (CPP, art. 743). Se a condenação tiver sido proferida por tribunal, ainda assim a competência será do juízo de primeira instância responsável pela condenação. Não é o da execução penal! Ver art. 66 da LEP.    

13.9 Recurso cabível: Apelação (CPP, art. 593, II). Há, contudo, discussão acerca da subsistência ou não do recurso de ofício (CPP, art. 746), em face da Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984 (LEP), que em nenhum dispositivo trata de semelhante recurso. Lembre-se que nada impede a renovação de requerimento, desde que instruído com novos elementos comprobatórios.

13.10 Provimento n. 5/81 da Corregedoria-Geral de Justiça: concedida a reabilitação, os distribuidores criminais emitirão certidões com a anotação “nada consta”, exceto em caso de requisições judiciais.
           
13.11 Morte do reabilitando:  extingue o processo por falta de interesse jurídico no prosseguimento. Isso significa que os herdeiros não poderão requerer a reabilitação.

13.12 Reincidência: não é apagada pela reabilitação, pois só desaparece após o decurso de mais de 5 anos entre a extinção da pena e a prática do novo crime (prescrição da reincidência).

13.13 Negada a reabilitação: poderá ser requerida a qualquer tempo, desde que com novos elementos (CP, art. 94, parágrafo único).

13.14 Postulação: só pode ser feita por quem tenha capacidade postulatória em juízo, ou seja, por meio de advogado.

13.15 Direito à certidão criminal negativa: tem direito à certidão criminal negativa o réu que teve a ação penal trancada por falta de justa causa.

Ver os seguintes julgados:
            STJ: HC 14202/SP
            REsp. 46538/RJ
           

AULA XIV – DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA          

14.1 Conceito: espécie de sanção penal imposta pelo Estado, na execução de uma sentença, cuja finalidade é exclusivamente preventiva, no sentido de evitar que o autor de uma infração penal que tenha demonstrado periculosidade volte a delinquir.        

14.2 Finalidade: é exclusivamente preventiva, visando tratar o inimputável e o semi-imputável que demonstraram, pela prática delitiva, potencialidade para novas ações danosas. Não possui caráter retributivo.

14.3 Sistemas

a) Vicariante: pena (imputáveis) ou medida de segurança (inimputáveis). Para semi-inimputáveis (ou fronteiriços): pena ou medida (depende do perito).
b) Duplo binário: pena e medida de segurança (bis in idem).

O Brasil adota o vicariante.

14.4 Pressupostos: a) Prática de crime; b) Potencialidade para novas ações danosas; c) ausência de imputabilidade plena.
           
14.5 Não se aplica medida de segurança:

a) se não houver prova da autoria;
b) se não houver prova do fato;
c) se estiver presente causa de exclusão da ilicitude;
d) se o crime for impossível;
e) se ocorreu a prescrição ou outra causa extintiva da punibilidade.

Obs.: ver súmula 525 do STF (veda-se medida de segurança em 2ª instância quando somente o réu tenha recorrido).

14.6 Periculosidade: é a potencialidade para praticar ações lesivas. Revela-se pelo fato de o agente ser portador de doença mental.

14.7 Princípio da legalidade (art. 5º, XXXIX, CRFB/88 e 1º do CP): mesma regra das penas.  

Obs.: Na inimputabilidade, a periculosidade é presumida. Basta o laudo apontar a perturbação mental para que a medida de segurança seja obrigatoriamente imposta. Na semi-imputabilidade, precisa ser constatada pelo juiz (periculosidade real). Mesmo o laudo apontando a falta de higidez mental, deverá ainda ser investigado, no caso concreto, se é caso de pena ou de medida de segurança.

14.8 Espécies de medida de segurança:

1) Detentiva: internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico (CP, art. 97):

i) é obrigatória quando a pena imposta for a de reclusão;
ii) será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação da periculosidade;
iii) a cessação da periculosidade será averiguada após um prazo mínimo, variável entre um e 3 anos;
iv) a averiguação pode ocorrer a qualquer tempo, mesmo antes do término do prazo mínimo, se o juiz da execução determinar (LEP, art. 176).

2) Restritiva: sujeição a tratamento ambulatorial (CP, art. 97). Em regra, para pena de detenção:

i) se o fato é punido com detenção, o juiz pode submeter o agente a tratamento ambulatorial (Para o STF depende do caso);
ii) o tratamento ambulatorial será por prazo indeterminado até a constatação da cessação da periculosidade;
iii) a constatação será feita por perícia médica após o decurso do prazo mínimo;
iv) o prazo mínimo varia entre um e 3 anos;
v) a constatação pode ocorrer a qualquer momento, até antes do prazo mínimo, se o juiz da execução determinar (LEP, art. 176).

14.9 Revogação: desinternação ou liberação (ver arts. 86 e 87, CP).

ð Desinternação: será sempre condicional, devendo ser restabelecida a situação anterior se o agente, antes do decurso de um ano, pratica fato indicativo de sua periculosidade (não necessariamente crime).
ð Liberação: será sempre condicional, devendo ser restabelecida a situação anterior se, antes do decurso de um ano da desinternação, o agente praticar fato indicativo de sua periculosidade (não necessariamente crime). 

14.10 Local da internação: estabelecimento dotado de características hospitalares (art. 99 do CP). Na falta de vaga, a internação poderá ocorrer em hospital comum ou particular, mas nunca em cadeia pública (STF).

14.11 Critério para fixar o prazo mínimo: depende do grau de perturbação mental e gravidade do delito, pois a maior gravidade do crime recomenda cautela na liberação ou desinternação.

14.12 Conversão do tratamento ambulatorial em internação: o § 4º do art. 97 – é possível em qualquer fase do tratamento, se for necessária para fins curativos. O contrário não ocorre, uma vez que não previu a lei a possibilidade de o juiz converter a medida de internação em tratamento ambulatorial.

14.13 A Lei de Drogas e a inaplicabilidade do art. 97 do CP: na antiga Lei de Drogas, aplicada a medida de segurança, a internação só era determinada excepcionalmente, quando o quadro clínico assim o exigisse. A nova Lei de Drogas (Lei n. 11.343/2006) seguiu a mesma linha, deixando a cargo do juiz a avaliação quanto à necessidade ou não de internação, independentemente da natureza da pena privativa de liberdade.
           
14.14 Semi-imputável (CP, art. 98): aplica-se o sistema vicariante: ou o juiz reduz a pena de 1/3 a 2/3, ou a substitui por medida de segurança, desde que fundamentada, inexistindo direito subjetivo do agente. A diminuição de pena é obrigatória.

Cuidado com a súmula 525 do STF, que deve ser entendida apenas como vedação da reformatio in pejus para as medidas de segurança.

14.15 Inimputabilidade do menor de 18 anos: não se aplica medida de segurança, sujeitando-se o menor à legislação própria (Lei n. 8.069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente).

14.16 Competência para revogar a medida de segurança: com o advento da Lei n. 7.210/84 (art. 176), a competência para conhecer do pedido de revogação da medida de segurança, por cessação da periculosidade, é do juiz da execução e não mais da segunda instância, ficando, nesse passo, revogado o art. 777 do CPP.

14.17 Medida de segurança e a detração: o juiz deve fixar na sentença um prazo mínimo de duração da medida de segurança, entre um e 3 anos. Computa-se nesse prazo mínimo, pela detração, o tempo de prisão provisória, o de prisão administrativa e o de internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou estabelecimento adequado (CP, arts. 41 e 42).

14.18 Relatório psiquiátrico do estabelecimento penal: não supre o exame de cessação da periculosidade. O Laudo sem fundamentação e impreciso não tem valor, sendo necessário que seja fundamentado e conclua expressamente se cessou ou não a periculosidade.

14.19 Procedimento para execução da medida de segurança: a) transitada em julgado a sentença, expede-se a guia de internamento ou de tratamento ambulatorial; b) é obrigatório dar ciência ao MP da guia referente à internação ou ao tratamento ambulatorial;       c) o diretor do estabelecimento onde a medida de segurança é cumprida, até um mês antes de expirar o prazo mínimo, remeterá ao juiz um minucioso relatório que o habilite a resolver sobre a revogação ou a permanência da medida; d) o relatório será instruído com o laudo psiquiátrico; e) o relatório não supre o exame psiquiátrico (vide supra); f) vista ao MP e ao defensor do sentenciado para manifestação dentro do prazo de 3 dias para cada um; g) o juiz determina novas diligências ou profere decisão em 5 dias;        h) da decisão proferida caberá agravo, com efeito suspensivo (LEP, art. 179).

14.20 Aplicação provisória da medida de segurança: é inadmissível, por falta de previsão legal. Era prevista no CP de 1940. Suspensão: condicionada ao transcurso de 1 ano sem práticas indicativas da periculosidade.

14.21 Prescrição e medida de segurança: a medida de segurança está sujeita à prescrição, porém não há na legislação disposição específica que a regule. Assim, Deve-se verificar duas situações: A) prescrição punitiva: i) para o semi-imputável, o juiz deve primeiramente fixar a pena em concreto para se ter um parâmetro de prescrição; ii) para inimputável, por ser absolvido impropriamente, não há tempo de duração. Todavia, há corrente em sentido contrário, entendendo que o prazo deverá ser calculado com base no máximo da pena abstratamente cominada, evitando uma punição perpétua (LFG); B) prescrição executória: i) para o semi-imputável, considera-se a pena fixada na sentença; ii) para o inimputável, a pena abstrata cominada ao crime.

Em se tratando de medida de segurança substitutiva, há posicionamento no sentido de que deve ser levada em conta para efeitos de prescrição a reprimenda cominada na sentença e substituída. Observe-se que, operada a prescrição, que é uma das causas de extinção da punibilidade, não mais se impõe a medida de segurança nem subsiste a que tenha sido imposta (CP, art. 96, parágrafo único).

14.22 Conversão da pena em medida de segurança: é possível que no curso da execução da pena privativa de liberdade sobrevenha doença mental ou perturbação da saúde mental ao condenado. Nesses casos, a LEP autoriza ao juiz, de ofício, a requerimento do MP ou da autoridade administrativa, a conversão da pena privativa de liberdade em medida de segurança (LEP, art. 183). Desse modo, realizada a conversão, a execução deverá persistir enquanto não cessar a periculosidade do agente (Capez).
Contudo, há posicionamento no sentido de que a medida de segurança convertida não pode ultrapassar o tempo de duração do restante da pena, de modo que, se, encerrado o prazo da pena, ainda persistir a necessidade de tratamento, deverá o condenado ser encaminhado ao juízo cível nos termos do art. 682, § 2º, do CPP (STJ). O entendimento tem se orientado no sentido de que a medida de segurança imposta em substituição à pena privativa de liberdade não pode ter duração indeterminada, mas, no máximo, o tempo total imposto na sentença condenatória.

14.23 Suspensão e extinção da medida: a suspensão está condicionada ao transcurso de 1 ano da liberação ou desinternação, sem a prática de fato indicativo de persistência de periculosidade. Após o transcurso desse prazo, a medida estará extinta.

Obs.: A LEP assegura o direito de contratação de médico particular, de confiança do paciente ou de familiares, para acompanhar o tratamento. Qualquer divergência entre o médico particular e o oficial será resolvida pelo juiz da execução (art. 43, LEP).

ver julgados: STF: HC 102.489/RS e HC 107.432/RS e STJ: HC 147.343

PENAL 4/AULAS XIII e XIV


AULA XIII – CONTINUAÇÃO: FALSIDADE DOCUMENTAL

13.1 Art. 305 Supressão de documentos

Para Fragoso, é inegável que a falsificação documental e a supressão de documento são fatos da mesma natureza, pois em ambos se atenta contra a segurança jurídica desse meio de prova, para fazer aparecer como verdadeiro o que é falso. A supressão de documento, porém, em relação à fé pública, não deixa de ter um aspecto negativo, pois a alteração da verdade é aqui obtida por via indireta e consequencial (falsidade documental imprópria).

Consiste em destruir, suprimir ou ocultar, documento público ou particular verdadeiro, de que o agente não podia dispor. O objeto material da ação deve reunir, assim, as características de documento, sendo, ademais, verdadeiro.

13.1.1 Sujeitos do crime: (1) ativo - qualquer pessoa, inclusive o proprietário ou co-proprietário do documento, desde que dele não possa dispor. (2) passivo - Estado e, subsidiariamente, o terceiro prejudicado.

Se o documento destruído, suprimido ou ocultado for passível de substituição, como cópias ou translados o crime não se perfaz. Em tais casos, poderá haver apenas o crime de furto ou de dano.  

A conduta punível é a de destruir (arruinar, eliminar etc.), suprimir (fazer desaparecer ou tornar ilegível o escrito, total ou parcialmente) ou ocultar (esconder, sonegar etc.), em benefício próprio ou de outrem (Rogério Sanches). Note que a vantagem visada não precisa ocorrer para consumar o crime.

Obs.: a jurisprudência tem admitido a destruição de filme fotográfico por considerá-lo registro gráfico, merecendo, assim, proteção penal.
13.2 Art. 306 Falsificação do sinal empregado no contraste de metal precioso ou na fiscalização alfandegária, ou para outros fins

Pune-se a conduta de falsificar (conferir aparência enganadora), fabricando-o (criando imitação do original) ou alterando-o (modificando), marca ou sinal empregado pelo poder público (federal, estadual, distrital ou municipal) no contraste de metal precioso ou na fiscalização alfandegária.

Também é incriminado, na parte final do dispositivo, o uso (utilização) da marca ou sinal inautêntico, falsificado por outrem. Se quem utiliza a marca ou o sinal é o próprio falsificador, responderá apenas pela falsificação (crime de ação múltipla). Para Bento de Faria, o sinal é uma determinada impressão simbólica do Poder Público, destinada autenticar a legitimidade do metal precioso. Não se admite a tentativa no uso.

13.3 Art. 307 Falsa identidade

Imputar-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem. Vale lembrar que a troca de fotografia em RG é tema controvertido (predomina que configura falso material, art. 297, CP).

Se o agente silencia sobre sua verdadeira identidade, que foi imputada de forma equivocada, não há falar em crime. A doutrina ensina que a elementar “identidade” envolve o nome, a idade, o estado civil, a filiação, o sexo etc. Note que esse crime é subsidiário, pois o art. deixará de ser aplicado caso o fato constitua infração mais grave. Ex.: (1) estelionato; (2) posse sexual mediante fraude; (3) simulação de casamento. Não é necessário que o agente aufira a vantagem pretendida para configurar o crime.

13.4 Art. 308 Uso indevido de outros documentos

Passaporte, título de eleitor, caderneta de reservista ou qualquer documento de identidade alheia. Consiste a ação criminosa em usar como própria identidade alheia ou ceder para que outrem use. Perceba que os documentos devem ser verdadeiros, pois se forem falsos, o crime será o do art. 304, CP. Não se exige finalidade especial da conduta. Não se admite tentativa.

13.5 Art. 309 Fraude de lei sobre estrangeiro

Somente o estrangeiro (e o apátrida) podem praticar a conduta do caput. No parágrafo primeiro (atribuir falsa qualidade) o crime é comum. Caso algum brasileiro auxilie o estrangeiro na prática do delito, poderá responder como partícipe. O sujeito passivo é o Estado.

A conduta punida no caput é a utilização de nome alheio para entrar ou permanecer no território nacional. Não abrange estado civil, profissão, nacionalidade etc. Na execução do crime, pode o agente valer-se ou não de documento falso. Se o agente falsifica o documento e o utiliza para ingressar no Brasil, haverá concurso material de delitos. Todavia, se outra pessoa realiza a falsificação e o sujeito utiliza o documento, responderá somente pelo delito em estudo.

Para Mirabete, o território nacional deve ser entendido em seu sentido jurídico, incluindo o mar territorial e o espaço aéreo correspondente à coluna atmosférica. Deve ficar clara a intenção do agente (entrar ou permanecer no território usando nome alheio). O crime se consuma no momento do uso do nome, independentemente se o agente consegue ou não permanecer ou entrar no Brasil.

13.6 Art. 310 Falsidade em Prejuízo da Nacionalização de Sociedade 

Tutela-se a fé pública e a segurança nacional. O crime é próprio, já que somente pessoa de nacionalidade brasileira (nato ou naturalizado) pode praticá-lo. O sujeito passivo é o Estado.

Conduta: Há atividades que, em razão do interesse nacional que as cerca, não podem ser livremente desempenhadas por estrangeiros. É o que ocorre, por exemplo, com serviços jornalísticos e de radiodifusão, exploração de jazidas, recursos minerais e potenciais de energia (arts. 176 e 222, CRFB/88). A conduta típica em estudo pune o brasileiro que serve de “testa de ferro” ao estrangeiro, assumindo a qualidade de proprietário ou possuidor de ação, título ou valor pertencente ao não nacional, nos casos em que a este é vedada por lei a propriedade ou a posse de tais bens.  Consuma-se no momento em que o agente passe a figurar como proprietário ou possuidor dos documentos mencionados. Admite-se a tentativa.

13.7 Art. 311 Adulteração de sinal identificador de veículo automotor

O crime é comum, razão pela qual qualquer pessoa pode praticá-lo, e, sendo funcionário público, a pena é aumentada de 1/3.

Rogério Sanches adverte que a pessoa que recebe o veículo já adulterado, sabendo dessa circunstância, não pratica o crime do art. 311, mas o do art. 180 (receptação). O sujeito passivo do crime é o Estado e a pessoa lesada.

É punida a conduta de quem adulterar (modificar) ou remarcar (marcar de novo) número de chassi (estrutura que suporta os elementos que integram o veículo – carroceria) ou qualquer sinal identificador (registro que serve para individualizar o objeto dos demais) de veiculo automotor (todo o veículo motorizado que serve normalmente para o transporte viário de pessoas ou coisas, como por exemplo, carro, caminhão, motocicleta etc.), de seu componente (portas, vidros etc.) ou equipamento (iluminação das placas etc.). Mirabete aduz que a simples raspagem do número do chassi não equivale à adulteração, constituindo apenas ato preparatório do crime. Não é necessário o conhecimento da origem ilícita do bem.

A alteração de placa com utilização de fita adesiva é objeto de controvérsia. Para Damásio, não se apresentando adulteração concreta e definitiva com objetivo de fraudar a propriedade, o licenciamento ou o registro do veículo, trata-se de simples infração administrativa. Parte da doutrina entende que a placa de um veículo motorizado, ao lado de outros sinais de identificação, constitui-se num sinal identificador, ou, como estabelece o CTB (arts. 114 e 115), um sinal externo de identificação. A circunstância de estarem tais sinais em dispositivos separados não significa que devam receber um tratamento penal diferenciado. Consequentemente, a alteração, adulteração ou remarcação de referido objeto perfaz a conduta criminosa do art. 311, CP.

Para Nucci, a falsificação grosseira não constitui o delito. Ex.: motorista que altera número das placas de seu veículo, utilizando fita adesiva, com o propósito de se livrar das multas. Rogério Sanches, discordando de tal entendimento, aduz que esse tipo de remarcação, embora seja rústica, possui idoneidade para dificultar o conhecimento do proprietário, lembrando que muitas vezes esse expediente é utilizado em crimes patrimoniais (roubos).

Caso a intenção do agente é auxiliar autor de crime, praticará em concurso o crime de favorecimento (real ou pessoal).

13.8 Art. 311-A Fraudes em certames de interesse público

Tutela-se a credibilidade (lisura, transparência, legalidade, moralidade, isonomia e segurança) dos certames de interesse público.

13.8.1 Sujeitos do crime: (1) ativo – qualquer pessoa. Aplicando-se o P. da especialidade, a violação de sigilo funcional envolvendo certames de interesse público não caracteriza o crime do art. 325, mas o do 311-A (Rogério Sanches). (2) passivo – Estado e eventuais lesados pela ação delituosa.

13.8.2 Conduta: é punida a conduta de quem utiliza (emprega, aplica) ou divulga (efeito de tornar público, propagar), indevidamente (sem justo motivo), com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso (abrangendo não apenas as perguntas e respostas, mas também outros dados secretos que, se utilizados indevidamente, geram desigualdade na disputa).

Antes da inclusão desse art. no CP, a “cola eletrônica” foi considerada atípica pelo STF e STJ. A doutrina passou a enquadrar a cola eletrônica no tipo em estudo. Contudo, Rogério Sanches adverte que tal enquadramento dependerá do caso concreto: se o modo de execução envolve terceiro que, tendo acesso privilegiado ao gabarito da prova, revela ao candidato de um concurso público as respostas aos quesitos, pratica, junto com o candidato beneficiário, o crime do art. 311-A (aquele, por divulgar, e este, por utilizar o conteúdo secreto), Agora, caso o candidato, com ponto eletrônico no ouvido, se vale de terceiro expert para lhe revelar as alternativas corretas, permanece fato atípico (apesar de seu grau de reprovação social), pois os sujeitos envolvidos (candidato e terceiro) não trabalham com conteúdo sigiloso (o gabarito continuou sigiloso para ambos).

Quem facilita ou permite, por qualquer meio, o acesso de pessoas não autorizadas às informações mencionadas no caput. Não se pune a forma culposa. O crime dispensa a obtenção de vantagem. Caso acarrete dano à credibilidade do certame, o crime será qualificado (cumulado com multa).

13.9 CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (parte especial): localizado no título XI do CP.

Para Raul Machado Horta, a CF é uma constituição plástica, pois os artigos estão colocados em ordem de importância, sequenciados. De igual forma, o CP adota essa hierarquia de importância: 1º crimes contra a pessoa; 2º crimes contra o patrimônio individual; 3º crimes contra a administração pública (Cleber Masson).
Capítulo I – crimes funcionais (praticados por funcionário público)
Capítulo II – praticados por particulares
Capítulo II-A – contra a administração pública estrangeira. Para a doutrina o bem jurídico tutelado é a regularidade na transação comercial internacional.
Capítulo III – contra a administração da justiça
Capítulo IV – contra as finanças públicas

13.9.1 Crimes funcionais: sujeito ativo, em regra, tem que ser funcionário público. O passivo é a administração pública, sozinha ou conjuntamente com particular.

Obs.: art. 7º, I, “c”, CP – extraterritorialidade incondicionada e art. 33, § 4º, condenação por qualquer crime contra a administração terá o regime de pena condicionada à reparação do dano.

ð Funcional próprio (prevaricação, concussão, corrupção passiva): faltando a qualidade de servidor, o fato passa a ser insignificante penal (atipicidade absoluta). Ex.: dar dinheiro por engano a quem não é funcionário público.
ð Funcional impróprio: faltando a qualidade de servidor, o fato deixa de configurar crime funcional, mas permanece como crime comum (atipicidade relativa). Ex: peculato (312, CP), vira apropriação indébita; a concussão (316), vira extorsão para o particular.

Obs.: nem todo crime ímprobo corresponde a um crime funcional (atos de improbidade estão nos arts.: 9º, enriquecimento ilícito; 10, dano ao erário; e 11, violação aos princípios da LIA). Agora, todo crime funcional corresponde a um ato de improbidade. Logo, sempre que ocorrer um crime funcional, uma cópia dos autos deverá ser encaminhada à promotoria do patrimônio público para verificação de improbidade administrativa.

Questão: O que é funcionário público para o direito penal? Aquele que exerce cargo, emprego ou função pública, ainda que transitório ou sem remuneração (art. 327, CP). Ex.: jurado, mesário, cartorários e estagiários. O advogado dativo, para o STJ é funcionário público por equiparação (tese do MP de SP). Outrossim, o servidor de Paraestatal, empresa conveniada ou contratada para exercer atividade típica da Administração Pública, devido a desestatização e não privatização. Não são equiparados a funcionários públicos: pessoas que exercem encargo / múnus público (administrador judicial; síndico de falência – administrador judicial; inventariante dativo; tutor; curador dativo etc.

A pena é majorada (1/3) quando: o cargo for comissionado, direção, assessoramento (SEM, EP, FP e demais órgãos públicos da Administração Pública direta e indireta. Cuidado! A autarquia está fora desse rol). Para o STF, os chefes do executivo exercem função de direção de órgão público, logo, jamais escaparão da majorante. O fundamento dessa causa de aumento é a maior reprovabilidade da quebra na confiança da função exercida.

13.9.2 Art. 312 Peculato: apropriação, desvio, furto, estelionato (313), eletrônico (313-A e B) e culposo. Para a maioria vem do latim peculatus ou depeculatuspecus: significa gado, carneiro, rebanho.

Peculato próprio: caput do art. 312, CP. O bem jurídico tutelado é a moralidade administrativa. Secundariamente se tutela o patrimônio público ou particular. O sujeito ativo é o funcionário público no sentido amplo do art. 317 do CP.

Questão: Admite-se partícipe particular? Depende: se o particular souber da condição de funcionário público do outro agente, responderá como partícipe. Agora, se não souber responderá por crime comum. Note que a condição do agente se estende ao partícipe se esse sabia da condição. Lembre-se que o particular pode figurar como vítima secundária do peculato.

Atenção! O diretor de sindicato não é funcionário público para fins penais (nem mesmo os diretores de Conselhos – CRM, CRP, CREA, etc.). Mas poderá praticar peculato, pois o Art. 552 da CLT equipara o fato praticado pelo diretor ao crime de peculato (equiparação objetiva do fato com o peculato do CP). Dilapidação do patrimônio das associações ou entidades sindicais pelos representantes. Para Sergio Pinto Martins, esse artigo não foi recepcionado pela CF/88 (o art. é de 1969 – ditadura militar), devendo o crime ser convertido para apropriação indébita. Para o STJ, esse artigo da CLT foi recepcionado pela CF/88 e o crime será mesmo de peculato, ainda que o presidente do sindicato não seja funcionário público.

Para prefeitos (Dec-lei 201/67 – norma especial), subsidiariamente aplica-se o CP (norma geral). Crime de responsabilidade dos prefeitos e vereadores: Cuidado! no art. 1º dessa lei, o crime será comum. No art. 4º, o crime será político-administrativo.

Peculato apropriação: apropriar-se de coisa de que tem a posse; inverter a posse (agindo arbitrariamente como se dono fosse). Para bem móvel, capaz de ser transportado (não coincide com o direito civil). Aplica-se para bem público ou particular. A posse deve ser em razão do cargo (nexo funcional inerente às atribuições do agente e não somente por ocasião do cargo). Agir para si ou para outrem. Não confunda com em ocasião do cargo (pegadinha)!

Questão: A mera detenção caracteriza posse? 1ª corrente - a expressão posse em sentido amplo abrange a detenção, assim, a detenção caracterizaria o peculato apropriação; 2ª corrente - Para o STJ, a expressão posse não se confunde com mera detenção. Se o legislador quisesse abranger esta, faria expressamente (ex.: 168, CP). Destarte, apropriar-se de coisa de quem tenha mera detenção configura peculato-furto (subtração).

Questão: E se o agente agir com animus de uso será crime (peculato de uso)? A doutrina divide a coisa em consumível (fungível) e inconsumível (infungível). Caso seja a coisa fungível será peculato. Agora, se for infungível não será crime. Ex.: perito que levou aparelho da repartição para seu escritório. No caso de mão-de-obra, a doutrina entende que não é coisa, mas serviço. Logo, não caracteriza peculato, salvo para os prefeitos que praticarão o crime, não importando ser a coisa consumível ou apenas serviço (Dec-lei 201/67). Para governadores e Presidente da República o delito será de improbidade administrativa, e não peculato como ocorre com os prefeitos. Essa desproporção é proveniente pelo fato dos prefeitos serem nomeados e não eleitos (prefeitos biônicos). Trata-se demais um exemplo de ato de improbidade que não corresponde a crime.

Consuma-se no momento em que o agente exterioriza os poderes de proprietário (admite tentativa e desprezam o enriquecimento do agente).

Questão: É possível a aplicação do P. da insignificância? Para o STF é admitido, salvo nos crimes contra a fé-pública (moeda falsa). Para o STJ não se admite, considerando que o objeto tutelado é a moralidade administrativa e não o valor da coisa. Lembre que esse princípio poderá ser aplicado a qualquer crime que seja com ele compatível e não somente aos crimes patrimoniais.

Peculato desvio: só difere da apropriação no verbo nuclear. Dar à coisa outra finalidade (desviar a coisa). Consuma-se no momento em que o agente dá a coisa destinação diversa prevista (finalidade).

PECULATO DESVIO - 312, CP
DESVIO DE VERBA PÚBLICA - 315, CP
Desvia verbas ou rendas públicas, atendendo interesse particular (próprio ou de terceiros).
Desvia verbas ou rendas públicas, porém atendendo interesse público, jamais particular. Ex.: administrador que retira verba da saúde e aplica na educação.

Peculato furto: bem jurídico tutelado – moralidade administrativa. O Sujeito ativo é o funcionário público; o passivo é a Administração Pública e o particular de forma concorrente. Perceba que não há posse, por esse motivo é peculato impróprio (há subtração da coisa facilitada pelo cargo; qualidade de funcionário público). Agora, se não foi facilitada será furto comum (como se particular fosse).
Tipo subjetivo: dolo + animus definitivo. Consuma-se com a mera apoderação (T. da amotio). Dispensa a posse mansa e pacífica, admitindo-se a tentativa.

Peculato culposo: é o único crime funcional culposo (de menor potencial ofensivo). A conduta incide em concorrer culposamente para o crime de outrem: 1ª corrente - a culpa do agente tem que resultar em outro peculato. Agora, se for um crime comum, não será peculato culposo (predominante); 2ª corrente - responderá por qualquer crime subsequente, sendo outro peculato de crime comum. O agente que age culposamente não poderá ser partícipe do 2º crime por ausência de homogeneidade de vontade. Veja que o delito se consuma quando se aperfeiçoa o 2º delito.

Benefícios exclusivos: Para peculato culposo - extinção de punibilidade quando reparado o dano antes da sentença condenatória irrecorrível. Agora, se for posterior à sentença a pena será reduzida da 1/2.

13.9.3 Art. 313 Peculato estelionato (ou mediante erro de outrem): posse ilegítima. O erro da vítima tem que ser espontâneo; se for provocado pelo funcionário público será estelionato do crime comum (171, CP). Consuma-se quando o funcionário percebendo o erro, não o desfaz apropriando-se da coisa como se dono fosse. Admite-se a tentativa.

Peculato eletrônico:
Art. 313-A
Art. 313-B
Somente funcionário autorizado
Qualquer funcionário
Conduta: inserir ou facilitar a inserção de dados falsos; alterar ou excluir dados completos
Conduta:modificar ou alterar o sistema ou programa
Dolo e fim especial (causar dano ou ganhar vantagem p/ si ou p/ outrem
Dolo sem fim especial
Delito formal. Admite tentativa
Delito formal. Admite tentativa
Muda-se a idéia (falsidade ideológica)
Muda-se o objeto (falsidade material)

13.9.4 Art. 314 – Extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento

A doutrina ensina que o sujeito ativo desse crime é o funcionário público em sentido amplo. Contudo, Nelson Hungria leciona que o sujeito ativo há de ser apenas o agente incumbido ratione officii da guarda do livro ou documento. Se a ação é cometida por um extraneus (ou mesmo outro funcionário não incumbido da guarda do livro ou documento), o crime será o do art. 337, CP.

Rogério Sanches adverte que se o sujeito ativo servidor em exercício junto à repartição fiscal ou tributária, o extravio de livro oficial, processo fiscal ou qualquer documento por ele causado configura crime especial, previsto no art. 3º da Lei 8.137/90.

Atenção! Tratando-se de autos judiciais ou documentos de valor probatório, cuja inutilização ou sonegação seja praticada por advogado ou procurador que os receba nesta qualidade, o crime será o do art. 356, CP. O crime tipificado no art. 314, além de ser próprio, é subsidiário em relação ao delito previsto no art. 305, que exige dolo específico (supressão de documento público).


Art. 305 – Supressão de documento público
Art. 314 – Extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento
Objetividade jurídica
Crime contra a fé pública
Crime contra a administração pública
Sujeito ativo
Qualquer pessoa
Funcionário público
Conduta
Destruir, suprimir ou ocultar documento público ou particular verdadeiro
Extraviar, sonegar ou inutilizar livro oficial ou qualquer documento de que tem guarda em razão do cargo
Tipo subjetivo
Há finalidade específica de tirar proveito próprio ou de outrem, ou visando causar prejuízo alheio
Não se exige qualquer finalidade específica
Pena
Reclusão de 2 a 6 anos e multa, se o documento é público, e reclusão de 1 a 5 anos e multa, se particular
Reclusão de 1 a 4 anos, se o fato não constitui crime mais grave.

13.9.5 Art. 315 – Emprego irregular de verbas públicas

O crime é próprio, pois somente funcionário público que tenha o poder de administração de verbas ou rendas públicas (Presidente da República e seus Ministros, Governadores, Secretários, diretores de entidades paraestatais, administradores públicos etc.). Admite-se a cooperação de particulares. Para os prefeitos municipais, a conduta se subsume ao disposto no art. 1º, III, do Decreto-lei 201/67.
A doutrina ensina que será admitido aplicar o estado de necessidade ou inexigibilidade de conduta diversa, de forma excepcional.


O defeito que aceita conserto é anulável. Há um defeito sanável quando ocorre um vício de competência ou de forma. Não é todo defeito de competência e de forma que será sanável – dependerá de cada ato. O conserto do defeito sanável se chama convalidação. Ato anulável está sujeito à convalidação. Há defeito sanável na competência e na forma. Ex.: Quem tinha que praticar o ato era o chefe da repartição, mas quem praticou foi o subalterno. O chefe convalidará, permanecendo os efeitos do mesmo ato. Corrigindo o vício, ele continuará sendo a mesma coisa, mas sem o vício.


AULA XIV – CONTINUAÇÃO CRIMES FUNCIONAIS

14.1 Art. 316 Concussão: exigência com coerção / temor / represália (pena de 2 a 8 anos). Caso não tenha relação com a função será extorsão. O bem jurídico primário tutelado é a moralidade pública e o secundário é o particular. Trata-se de crime formal, por isso não se admite o flagrante na entrega da vantagem.

Exigir (intimidar / coagir) para si ou para outrem (inclusive entidade pública) direta ou indiretamente (por interposta pessoa) explícita (clara) ou implicitamente (velada) vantagem indevida de qualquer natureza (econômica ou sexual). Caso a vantagem seja devida: i) se for tributo ou contribuição, será excesso de exação; ii) se não for tributo ou contribuição social, será abuso de autoridade. No excesso não está abrangido emolumentos de cartório.

Questão: Quem pode ser concussionário no Brasil? Funcionário público afastado, em exercício ou ainda não assumido (aprovado em concurso, nomeado, mas não entrou em exercício). Caso o funcionário seja fiscal de renda, não se aplicará o art. 316, CP (concussão) e sim, o art. 3º, II, da Lei 8.137/90 (crime contra a ordem tributário); se for militar, art. 305, CPM.

Questão: O que é metus publicae potestatis? É o temor que o cargo público causa nas pessoas. É imprescindível que o agente tenha condição / atribuição / competência / poder para concretizar o mal que prometeu. Se não possuir a competência será extorsão comum (art. 158, CP). Ex.: policial simulando competência de delegado.

Questão: O médico que atende pelo SUS, ao condicionar seu atendimento mediante vantagem, comete qual crime? 1ª corrente - se ele exigir será concussão; 2ª corrente - se ele solicitar será corrupção passiva (art. 317, CP); 3ª corrente - se ele empregar fraude, simulando um pagamento indevido, será estelionato (art. 171, CP).

Exige-se dolo especial (enriquecimento / locupletamento ilícito). É crime formal, não exigindo a obtenção da vantagem. Admite-se tentativa (carta concussionária interceptada ou morte de 3º que iria entregar a exigência). Admite-se coautoria.

14.2 Excesso de exação: encontra-se nos §§ 1º e 2º do art. 316 (concussão): quando o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido; quando emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso não autorizado em lei; quando desvia em proveito próprio ou de outrem a importância que recebeu indevidamente. Pena: reclusão de 2 a 12 anos e multa.

14.3 Art. 317 Corrupção passiva: solicita ou pede para si ou para outrem (pena de 2 a 12 anos). O sujeito ativo é o mesmo da concussão (abrange funcionário público de folga ou férias; particular na iminência de assumir a função). Caso o agente seja fiscal de renda (tributos) será crime tributário. Agora, se o funcionário for militar, o art. 308, CPM, não pune a ação solicitar, mas apenas receber ou aceitar promessa. Caso o militar solicite, a competência será da justiça comum (art. 317). Há julgados excluindo a corrupção passiva quando praticada em favor da administração.

Sujeito Passivo: primário é a moralidade pública; o secundário pode ser o particular, desde que não cometa corrupção ativa (art. 333, CP – oferecer ou prometer vantagem). A ação “dar” livremente não é punível, pois se o corruptor “solicitar” o agente que der será a vítima da corrupção passiva.

Questão: O que é Corrupção passiva própria? Tem por fim a realização de ato injusto (comportamento injusto). O funcionário público comercializa um ato ilegítimo.

Questão: O que é Corrupção passiva imprópria? Tem por fim a realização de comportamento legítimo. O funcionário público comercializa ato justo. O ato em si é legal, mas o servidor realiza mediante vantagem.

Questão: O que é Corrupção passiva antecedente? 1º solicita / recebe / aceita promessa para depois realizar o ato comercializado.

Questão: Corrupção passiva subsequente? 1º realiza o ato e depois solicita / recebe ou aceita a promessa.

Cuidado! corrupção ativa antecedente: 1º oferece / promete visando ato futuro (é crime). Corrupção ativa subsequente: 1º pratica um ato e depois promete ou oferece (não é crime – fato atípico). Na corrupção passiva a condição de funcionário público se comunica ao particular coautor.

Questão: Quando a corrupção passiva se consuma? Depende: nas modalidades solicitar / aceitar promessa o crime é formal. Na modalidade receber, será material. Admite-se tentativa na forma escrita “solicitar”. Perceba que, se o servidor praticar o ato infringindo dever funcional a pena será aumentada de 1/3 (§1º, 317, CP), salvo quando o ato configurar um crime autônomo, sendo hipótese de concurso material de crimes. Isso evita a infringência do bis in idem. Só é possível majorar a pena na corrupção passiva própria, pois é a única que prevê a infração de um dever funcional.

Obs. 1: 337-B – corrupção ativa em transação comercial internacional (prometer, oferecer e dar, para funcionário público internacional).
Obs. 2: 343, p. único – corrupção ativa de testemunha (dar, oferecer e prometer). Há também a conduta do código eleitoral (dar, prometer ou oferecer em época de eleição).
Obs. 3: A corrupção ativa não implica necessariamente na consumação da passiva, ou vice e versa.

Questão: Existe corrupção passiva privilegiada? A previsão está no art. 317, § 2º -  crime de menor potencial ofensivo. Pune-se os famigerados favores administrativos. O CP não menciona se o ato deve ser ilícito, ilegítimo ou contrário ao dever funcional.

CORRUPÇÃO PASSIVA PRIVILEGIADA
PREVARICAÇÃO (art. 319)
o funcionário cede diante de um pedido ou influência de outrem (ato voluntário)
o funcionário que age sem influência ou pedido de outrem (ato espontâneo). Autocorrupção.
Não visa interesse ou satisfação pessoal (o funcionário não quer vantagem pessoal – favor administrativo)
Busca satisfazer interesse ou sentimento pessoal (o funcionário quer a vantagem). Fim específico

Obs.: praticar ato contra expressa disposição de portaria ou resolução não é prevaricação.

14.4 Art. 319-A Prevaricação imprópria: i) deixar de (omissivo próprio); ii) cumprir seu dever legal de vedar ao preso (não é qualquer agente penitenciário); iii) o acesso a aparelho telefônico, rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou ambiente externo. Não exige finalidade específica. Pena de 3 meses a 1 ano.

Fere o P. da proporcionalidade, pois está incidindo na insuficiência da intervenção estatal. O P. deve evitar não só a hipertrofia quanto à insuficiência da punição. Contudo, mesmo insuficiente, a pena deve ser aplicada em observância ao P. da legalidade. Não exige satisfação de interesse / sentimento pessoal.

O bem jurídico tutelado é a segurança interna dos presídios e externa da sociedade.
O sujeito ativo é servidor com o dever de evitar o acesso a aparelho (celular, radio, instrumentos proibidos etc) aos presos. Observe que o preso não comete crime nenhum, apenas falta grave do art. 50, III, LEP.

Questão: E o particular que auxilia (introduz o objeto)? Responderá pelo art. 349-A. Esse tipo penal ainda não possui nome. O sujeito passivo é o Estado e a sociedade envolvida.

Questão: E se o servidor ao invés de apenas permitir o acesso ao aparelho, pessoalmente entregá-lo ou, então, deixar de retirar do preso aparelho que já está em sua posse? A expressão “acesso ao aparelho” não deve ser interpretada restritivamente, mas ao seu real alcance, abrangendo a conduta entregar pessoalmente ou não retirar aparelho já na posse do preso (Nucci). Perceba que o delito se consuma com a simples omissão do dever, sendo dispensável o real acesso. Por ser crime omissivo próprio (unissubsistente), não se admite a tentativa.

Art. 319-A PREVARICAÇÃO IMPRÓPRIA
349-A (não tem nome definido)
Não tipifica a conduta do particular que leva o aparelho ao preso: Ex: advogado.
Tipifica a conduta do particular que leva o aparelho ao preso.
A conduta do preso é atípica. Será falta grave LEP.
A conduta do preso é atípica. Será falta grave LEP.
Sujeito ativo: funcionário que tem o dever de evitar
Sujeito ativo: qualquer pessoa, inclusive funcionário público.
Objeto proibido: Aparelho telefônico de comunicação móvel, de rádio ou similar, sem autorização legal (abrange acessórios: carregador, chip etc)
Objeto proibido: Aparelho telefônico de comunicação móvel, de rádio ou similar, sem autorização legal (abrange acessórios: carregador, chip etc)
Deve haver dolo. Não se pune a forma culposa. Não se admite tentativa.
Deve haver dolo. Não se pune a forma culposa. Admite-se tentativa

14.5 Art. 318 Facilitação de contrabando ou descaminho:

Para Nelson Hungria, contrabando é, restritamente, a importação ou exportação de mercadorias cuja entrada  ou saída no País é absoluta ou relativamente proibida, enquanto que descaminho é toda fraude empregada para iludir, total ou parcialmente, o pagamento de impostos de importação, exportação ou consumo.

Sujeito Ativo: O funcionário público que, infringindo dever funcional (aquele responsável pela alfândega, portos, aeroportos, isto é, somente o policial ou funcionário público encarregado destes locais) facilita a prática do contrabando ou do descaminho. Trata-se, sem dúvida, de exceção à teoria unitária ou monista adotada pelo Artigo 29 - CP.  O Particular (qualquer pessoa) incorre no art. 334 CP.

Obs. 1: Contrabando de arma - responde pelo disposto no art. 18 da Lei 10.826/03(estatuto do desarmamento).
Obs. 2: O Funcionário Público que recebe dinheiro para permitir ingresso de mercadoria contrabandeada incorre em dois tipos penais, responde, cumulativamente, por Corrupção passiva + Facilitação de Contrabando ou descaminho (Art. 317 + 318 CP).

Hipótese: A seleção tetracampeã de 1994 encheu o avião de “muamba” nos EUA e não pagou os impostos devidos. Os fiscais revistaram e queriam apreender os objetos. Por determinação do Ministro do Esporte, os agentes foram impedidos de efetuar a apreensão. Ocorreu a facilitação para a prática de descaminho, ou até contrabando, dependendo da mercadoria. Cuidado! Ordem ilegal não se cumpre.

Aplica-se neste crime o principio da "Insignificância ou Bagatela" (até U$ 1.000,00).

Trata-se de crime federal. Ex.: Se um delegado de polícia estadual faz um flagrante sobre o contrabando e descaminho, o juiz federal, em tese, poderá homologar a prisão.

Atenção! Se um funcionário público der a chamada “carteirada” para ajudar um amigo a contrabandear, não responderá por facilitação, mas por contrabando em coautoria. Agora, o outro funcionário que cede a carteirada responderá pela facilitação.

14.6 Art. 320 Condescendência criminosa

Ocorre quando o superior deixa de responsabilizar seu subalterno diante do cometimento de uma infração. Ex.: Um policial cometeu um crime de abuso de autoridade. O delegado chama a atenção desse policial, diz que ele cometeu um crime, mas resolve dar uma “colher de chá”, já que o infrator é um bom funcionário. O crime se resume na tolerância, brandura ou clemência para não responsabilizar um subalterno.

14.7 Art. 321 Advocacia administrativa

O funcionário público patrocina interesses privados perante a administração pública, sem receber nada em troca (se houver pedido de vantagem, será corrupção passiva). É o chamado “pistolão”. Ex.: advogado que pede ao escrivão tentar convencer o juiz da causa a atender o pedido da inicial.

Questão: O que é Tráfico de Influência? Previsto no art. 332, CP, é o oposto da advocacia administrativa, mas com relação estreita. Aqui é o particular, com prestígio perante a administração, que solicita vantagem para influenciar um funcionário público. Ex.: (1) Pessoa que possui influência na repartição pública e vende uma transferência de servidor. (2) um cidadão quer tirar um porte de arma, e o escrivão se dirige ao delegado para tentar influenciá-lo na decisão de conceder ou não o porte àquela pessoa. O tráfico de influência, normalmente, é praticado por ex-funcionário de alto escalão (desembargador, ministro, comandante de Brigada Militar etc.). Se o particular não receber nada em troca para influenciar num ato administrativo, não se caracterizará o tráfico. O tráfico de influência será qualificado quando o agente alegar ou insinuar que a vantagem é também destinada ao funcionário. É considerado um crime grave, porque o particular estaria se intrometendo na administração pública para influenciar funcionário a praticar atos ilegais.

14.8 Art. 322 Violência arbitrária

O crime de violência arbitrária encontra-se tipificado no artigo 322 do Código Penal de 1940, onde a conduta criminosa se descreve pela prática, por funcionário público, de violência física injustificada contra determinada pessoa.

Art. 322. Praticar violência, no exercício de função ou a pretexto de exercê-la:
Pena –detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, além da pena correspondente à violência.

Em razão da entrada em vigor da Lei nº 4.898 em 1965, que regula o direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa Civil e Penal, nos casos de abuso de autoridade, passou-se a discutir a vigência do artigo 322 do CP.
Porém, a doutrina ensina, segundo o artigo 29 da nova Lei, que houve apenas a revogação das disposições em sentido contrário. Logo, o tipo penal do artigo 322 continua vigorando. 

Jurisprudência sobre o tema:

O Tribunal de alçada criminal de SP possui julgados nos dois sentidos. Todavia, o STF já se pronunciou favoravelmente a não revogação.

Note que a violência de que trata o tipo penal refere-se tão e só à violência física praticada por funcionário público no exercício de sua profissão, violência esta entendida como o emprego de força física, maus-tratos, que resultem ou não lesão corporal, estando, assim, excluída a violência psíquica ou moral (ameaça).

Objetividade jurídica: a regularidade da administração pública pelo correto desempenho das atividades de seu funcionário, tutelando-se assim seus serviços, garantindo, também, a integridade física do particular.

Sujeitos do crime: (1) ativo - somente a autoridade, o funcionário público no exercício do seu cargo. (2) passivo - o Estado e também o particular, vitimado pela violência do agente.

Vale lembrar que, na forma do artigo 5º da Lei 4.898/65, considera-se autoridade, para os efeitos desta lei, quem exerce cargo, emprego ou função pública, de natureza civil, ou militar, ainda que transitoriamente e sem remuneração.

O crime se reveste de caráter doloso uma vez que a autorizada deveria não utilizar-se de violência física para o desempenho de sua regular função.
A consumação do delito se dará no momento da efetiva violência, respondendo ainda a autoridade por eventuais crimes de lesão corporal ou homicídio ou ainda pelas suas tentativas.

A ação penal é Pública incondicionada sendo indispensável a notificação da autoridade à apresentar sua defesa escrita nos termos do Código de Processo Penal.

Questão: Em que consiste o abuso de autoridade? Nos termos do artigo 3º da Lei 4.898/65, consiste na pratica de qualquer atentado à liberdade de locomoção, à inviolabilidade do domicílio, ao sigilo da correspondência, à liberdade de consciência e de crença, ao livre exercício do culto religioso, à liberdade de associação, aos direitos e garantias legais asseguradas ao exercício do voto, ao direito de reunião, à incolumidade física do indivíduo e aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional.

14.9 Art. 323 Abandono de função

O tipo penal aqui tratado tem como objetividade jurídica a regularidade do desempenho das atividades do funcionário público em relação à administração pública. Assim, o dispositivo tutela a manutenção dos serviços prestados pela administração, por meio de seu agente, a fim de evitar prejuízos para o serviço público.

Embora o abandono de função cause prejuízos diretos à administração pública, o particular, indiretamente, também é atingido pela ausência deste funcionário e pela consequente precariedade dos serviços que deveriam ser prestados.

Caso o Estado tenha condições de suprir a falta daquele desertor, não há falar em crime, já que não houve prejuízo para a administração (acefalia do cargo). Note que o agente apenas será enquadrado nas penas do delito, se agir intencionalmente, ou seja, com o dolo consciente de abandonar sua função, mesmo que não tenha o propósito de fazê-lo de maneira definitiva.

Não se admite a forma tentada, já que a consumação ocorrerá com o efetivo abandono do cargo por tempo considerável, capaz de causar danos ao Estado.

Questão: O que é abandono de função qualificada? Ocorre quando constatado dano efetivo ao Estado em decorrência do abandono, bem como se ocorrer nas proximidades de fronteiras (área indispensável à Segurança Nacional - faixa interna de 150 Km de largura, paralela à linha divisória terrestre do território nacional).

14.10 Art. 324 Exercício funcional ilegalmente antecipado ou prolongado

As atividades próprias do Estado devem ser exercidas somente por aqueles que, após satisfazerem todas as exigências legais, tornam-se efetivamente funcionários públicos.

A disposição prevista no art. 324 do CP tem fundamento na confiança que a parte deve depositar no Estado-administração, do qual o funcionário é representante. Se já não o representa mais, por qualquer motivo de afastamento (exoneração, demissão etc.), o Estado não pode garantir à parte que o ato seja escorreito, passível que é até de anulação.

O sujeito ativo do crime, na modalidade de exercício antecipado da função, será o funcionário público nomeado, mas não regularmente investido. No caso de exercício prolongado será o ex-funcionário, exonerado, removido, substituído ou suspenso.

Embora o particular possa a ser afetado por aquele não investido ou destituído de função pública, a doutrina entende figurar no pólo passivo apenas o Estado.

A conduta criminosa se descreve em duas espécies:

1) Entrar no exercício de função pública antes de satisfeitas as exigências legais, tais como o de prestar compromisso solene do empossado; de fiel cumprimento dos deveres e atribuições do cargo; realizar exames médicos, comprovar a quitação com o serviço militar dentre outras previstas no edital público.
2) Continuar a exercer a função pública depois de exonerado, removido, substituído ou suspenso. Aqui o agente, ex-funcionário público, continua a exercer a função, praticando atos de ofício, mesmo depois de comunicado oficialmente sobre sua exoneração, remoção, substituição ou suspensão.

Questão: Esse crime admite a modalidade culposa? O crime do artigo 324 é doloso, consistindo na vontade livre e consciente do agente de antecipar ou prolongar o exercício da função. Todavia, a doutrina diverge quanto à modalidade culposa, já que o agente poderia ingressar na função sem culpa ou, da mesma forma, permanecer sem que tivesse dado causa.

Consuma-se o delito, na forma do exercício antecipado, quando o agente vier a realizar qualquer ato funcional, entendendo-se inclusive consumar-se o crime no momento de sua apresentação para o exercício profissional sem que sequer tenha realizado qualquer ato de ofício. Na forma de exercício prolongado, o crime se aperfeiçoará com a continuidade na função após o recebimento oficial da exoneração, remoção, substituição ou suspensão.

14.11 Art. 325 Violação de sigilo funcional

O tipo penal descreve a conduta de “revelar”, cuja significação é informar, transmitir, comunicar a outrem, seja verbalmente, por escrito ou por qualquer outra forma, circunstância ou fato que deva ser mantida em sigilo. “Facilitar” a revelação significa tornar fácil, afastar dificuldades e empecilhos.

O segredo funcional é tudo o que não é nem pode ser conhecido senão de determinadas pessoas, ou de certa categoria de pessoas, em razão do ofício; é o que não pode, portanto, ser sabido por qualquer um (Bento de Faria). Ex.: Policial que, sabedor de operação a ser deflagrada em dia e hora, comunica, informa ou divulga o ato, prejudicando ou frustrando o êxito da diligência.

Ao incriminar a violação de sigilo funcional, a lei visa impedir a violação de fato que deva permanecer em segredo, porque sua divulgação pode prejudicar ou pôr em perigo os fins que o Estado persegue. Não incrimina a simples indiscrição ou a indesejável bisbilhotice, nem tutela interesses fúteis, carecedores de relevância jurídica. O delito é tido como doloso, pois o agente emprega vontade de transmitir, revelar o segredo. Não basta a simples culpa, não ocorrendo o ilícito se, por esquecimento, o funcionário vier a deixar, acidentalmente, que terceiro tome conhecimento de algo sigiloso.

A consumação do crime ocorrerá no momento em que o segredo é revelado, independente de ter havido ou não prejuízo à Administração Pública. É prevista a punibilidade por tentativa da violação.

Questão: Quem recebe a informação sigilosa pratica esse crime? Caso o terceiro venha simplesmente a receber o segredo não poderá ser responsabilizado pelo delito.

14.12 Art. 326 Violação de sigilo proposta de concorrência

É tutelada a regularidade da administração pública, especificamente no que concerne às relações dos negócios do Estado. Segundo Noronha, somente pode praticar esse crime aquele cujas funções se relacionam com a concorrência: receber as propostas, guardá-las e abri-las no momento oportuno.

Sujeito passivo é o Estado, titular da lisura das concorrências públicas, em especial do sigilo de que devem estar revestidas as propostas. Outrossim, os concorrentes eventualmente prejudicados com a violação.

Note que a violação do sigilo acarretará na nulidade da concorrência. A vontade de devassar ou de proporcionar o devassamento ilegal por outrem, não exige qualquer finalidade especial de agir. Não se admite a modalidade culposa, não se responsabilizando o agente que, por puro engano possibilita a terceiro o conhecimento do conteúdo da proposta. Não se exige a divulgação ou dano efetivo ao Estado ou aos concorrentes.