terça-feira, 23 de outubro de 2012

PENAL 4/AULAS XI e XII


Aulas XI e XII
AULA XI – CRIMES CONTRA A PAZ PÚBLICA

11.1 Art. 286 Incitação ao crime

Incitar (induzir, provocar, estimular, instigar etc.), publicamente, a prática de determinado crime. Inexiste a infração quando visar a prática de contravenção penal ou ato imoral.

Não confunda esse crime com o previsto no art. 29 do CP (instigação genérica), que é crime acessório, pois apenas haverá punição do agente se o crime instigado for praticado (art. 31, CP). O que o art. 286 incrimina é simplesmente a incitação à prática de crime em si mesma, desde que, esta tenha idoneidade para o fim proposto, independentemente de o incitado deixar-se persuadir pela incitação (não depende da prática do crime incitado).

Bitencourt menciona a diferença desse crime com a participação em sentido estrito. Quando o incitado acede à incitação e executa o crime determinado, transforma o sujeito ativo da instigação em partícipe do crime executado. Haverá, assim, concurso material de crimes para o incitador. A diferença, então, reside na desnecessidade do incitado praticar o crime para configurar o delito em estudo. Ao passo que na participação, somente haverá punição se o crime for ao menos tentado (qualquer crime: político, drogas, militar, tributário etc.).

Obs.: o crime será único quando, com uma única conduta, o sujeito ativo incite a prática de vários delitos: a pluralidade resultante de conduta única não implica concurso de crimes.

Esse crime é subsidiário, pois somente será aplicado caso não incida outro tipo penal ou lei especial. Ex.: art. 122, CP.

Não se pode confundir a incitação ao crime com pregações ideológicas ou anarquistas, por mais liberais, críticas ou avançadas que sejam.

11.1.1 Bem jurídico protegido: paz pública (sensação vivenciada e internalizada, pela coletividade, de segurança e confiança nas instituições públicas, transformando esse sentimento coletivo no verdadeiro bem jurídico relevantemente tutelado).

11.1.2 Consumação: ocorre com a incitação dirigida a número indeterminado de pessoas, independentemente da prática do crime incitado (perigo abstrato). Caso o instigado pratique o crime, o instigador poderá responder também por ele, em concurso material. A tentativa é admissível, desde que não se trate de incitação oral.  Ex.: cartazes, gravações, documentos etc. Não se pune a forma culposa.
Para Noronha, a publicidade exigida no crime é constituída também pelo lugar e outras circunstâncias que tornam possível a audição, por indeterminado número de indivíduos, do incitamento. Não é o número que deve ser determinado, mas as pessoas. Ex.: reunião de 50 pessoas. O número é determinado, mas as pessoas não.

Aduz Rogério Sanches, não é bastante que o agente incite publicamente a prática de delitos de forma genérica, pois deve ser apontado fato determinado, como, por exemplo, conclamar publicamente titulares de determinado direito a fazer justiça com suas próprias mãos, o que constitui o crime de exercício arbitrário das próprias razões. Perceba que a incitação vaga e imprecisa, não tem eficácia ou idoneidade necessária para motivar alguém a delinquir. Não basta falar, por exemplo, a favor da sonegação fiscal, mas deve-se determinar a sonegação.

11.2 Art. 287 Apologia de crime ou criminoso (suprimido do anteprojeto)

Trata-se de um induzimento implícito, feito através de elogios, exaltação a fatos criminosos ou a seus autores. Não há falar em crime se a manifestação for sobre contravenção ou contraventor. Apologia de crime culposo não é punível, pois poderá haver instigação, direta ou indireta, à pratica de um ato involuntário. Exige-se publicidade (número indeterminado de pessoas).

Para Hungria, o crime elogiado pode ser pretérito ou futuro. Contudo, a doutrina majoritária entende que tal crime deve ser passado, pois se for futuro, o tipo penal aplicado será o de instigação.

Não configura o crime se os elogios forem sobre as qualidades do agente criminoso, alheias à ação delituosa. É também controvertida a necessidade da existência de sentença condenatória irrecorrível contra o autor do crime elogiado. Para Celso Delmanto e Bitencourt, a apologia que este tipo penal incrimina, em sua última parte, é somente a de autor de crime que assim tenha sido considerado por decisão condenatória passada em julgado. Portanto, a apologia de acusado de crime, isto é, não condenada definitivamente, será atípica. Hungria, por outro lado, entende que tal circunstância não deve ser exigida (entendem da mesma forma: Capez, Fragoso, Noronha, Regis Prado etc.).

Consuma-se com a apologia, independentemente da efetiva perturbação da ordem pública (perigo abstrato). Teoricamente se admite a tentativa, mas de difícil configuração (tentativa de mero ato preparatório – tentativa da tentativa). Não há previsão de modalidade culposa.

Para Bitencourt, esse crime não foi recepcionado pela CRFB/88, pois não passa de simples manifestação pacífica de pensamento, por vezes, um desabafo, um exercício de liderança. Na maioria dos casos, a coletividade ouve como uma das tantas pregações, formando ou não opiniões, a favor ou contra, sem qualquer repercussão positiva ou negativa no meio social. Para o autor, esse tipo penal faz lembrar do filme Minority Report (prisões e condenações antes mesmo da execução, pois criaram a figura do pré-crime).

Fazer apologia não se confunde com defesa de alguém ou de alguma conduta ou defender alguém acusado de algum crime.

11.2.2 Pontos relevantes:

1) Apologia de vários crimes ou criminosos: para a corrente majoritária, haverá concurso formal. Caso um crime seja praticado posteriormente, admite-se concurso material.
2) Marcha da maconha – o STF entendeu não caracterizar o delito em estudo por fazer parte de uma instrumentalidade entre o direito de reunião, livre manifestação e direito de petição (iniciativa popular).

11.3 Art. 288 Quadrilha ou bando

Trata-se de crime coletivo (concurso necessário), de condutas paralelas (umas auxiliando as outras). Trata-se de uma associação estável e permanente de mais de 3 pessoas, ou seja, são pelo menos 4 pessoas com o fim de praticar uma série indeterminada de crimes (Luiz Regis Prado).

Questão: Quadrilha é sinônimo de bando? Para o CP são sinônimos. Todavia, em concursos públicos as bancas estão gabaritando que não são sinônimos: quadrilha é associação organizada; bando é desorganizado. Para Roberto Porto, as expressões são sinônimas, o que muda em ambas é o local da atuação, visto que a quadrilha se destina à zona urbana e o bando à zona rural.

ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA
QUADRILHA
ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA
3 pessoas ou mais
4 pessoas ou mais
2 pessoas ou mais

11.3.1 Bem jurídico protegido: Para Bitencourt, é o sentimento coletivo de segurança e de confiança na ordem e proteção jurídica (caráter subjetivo), pois a paz pública (caráter objetivo) somente é atingida quando o crime é divulgado pela mídia.

11.3.2 Sujeitos do crime: (1) ativo – qualquer pessoa. A doutrina ensina que poderá ser incluído no número legal pessoas inimputáveis (menores de 18 anos e doentes mentais). Bitencourt critica esse entendimento, pois há evidente resquício de responsabilidade objetiva; (2) passivo – coletividade.

Questão: O agente infiltrado poderá ser computado no nº mínimo de 4 pessoas? 1ª corrente - Nucci entende que sim, pois do mesmo modo que se admite a formação de quadrilha com inserção de menor de 18 anos, embora não seja este culpável, é de se considerar válida, para o mesmo fim, a presença do agente infiltrado. 2ª corrente – o policial não pode ser computado, pois não age com o necessário ânimo associativo, pois a sua finalidade, aliás, é diametralmente oposta, qual seja, desmantelar a sociedade criminosa. Perceba que o agente infiltrado não responderá pelo crime de quadrilha ou bando (excludente de ilicitude). Se ele for coagido a matar alguém, recairá sobre ele inexigibilidade de conduta diversa.

11.3.3 Consumação: momento em que aperfeiçoa a convergência de vontades entre mais de três pessoas, e, quanto àqueles que venham posteriormente a integrar-se ao bando já formado, na adesão de cada qual. Considerando que o crime ocorre com a simples associação, não importa que o agente tenha ingressado a quadrilha ou bando após sua formação. De igual modo, é irrelevante que não tenha participado diretamente de eventuais crimes cometidos por membros da associação, bastando sua participação, de alguma forma, na organização da quadrilha (responderá apenas pelo crime de quadrilha e não pelos crimes cometidos). Em razão dessa autonomia, a punição dos membros integrantes independe de condenação pela prática de algum dos crimes pretendidos pelo bando.

Predomina nos tribunais que aqueles que participarem de eventuais crimes praticados pela quadrilha, responderão em concurso material de crimes. Perceba que o crime é permanente. Caso um membro seja retirado, cessa-se a permanência, mas o crime de quadrilha já estará consumado.

Questão: Quando mais de 3 agentes se associam para cometer um único crime, responderão pelo tipo penal em estudo? Não, pois o crime de quadrilha ou bando possui como elementar a finalidade de praticar crimes indeterminados. Se o crime for determinado, haverá concurso eventual de agentes. Perceba que o liame subjetivo no concurso de agentes, por si só, não tipifica crime algum, podendo majorar a pena de alguns crimes.

Questão: O que é criminalidade de massa? Não se confunde com criminalidade organizada. Esta não é apenas uma organização para a prática de crimes, pois vai além disso: corrompe o legislativo, executivo, judiciário, ministério público, corpo policial, etc. Aquela, por seu turno, compreende assaltos, invasões de apartamentos, furtos, estelionatos, roubos e outros tipos de violência contra os mais fracos e oprimidos. São ataques violentos e imediatos, atingindo o equilíbrio emocional da população, gerando sensação de insegurança.

Questão: É possível uma pessoa pertencer a mais de uma quadrilha? O que a lei pune é associar-se em quadrilha ou bando. Caso o agente, por mais de uma vez, se associe, não há dúvidas de que há pluralidade de crimes. Não confunda com organização criminosa (mínimo 3 pessoas com distribuição de tarefas). Logo, é possível ter uma quadrilha sem organização criminosa e vice-versa (são institutos autônomos).

Questão: É possível a suspensão condicional do processo para quadrilheiro? Sim, já que a pena é de 1 a 3 anos, tratando-se de infração de médio potencial ofensivo. Agora, se os crimes que a quadrilha visa forem hediondos, a infração passará a ser de grave potencial ofensivo. Nesse caso, caberá sursis penal e não processual.  O crime de quadrilha não é hediondo, mas poderá ter pena mais grave se visar o cometimento de crimes hediondos. Esse dispositivo não se aplica ao tráfico de drogas, já que existe regra específica para tanto, qual seja, art. 35 da lei 11.343/06 (pena de 3 a 10 anos). Note que foi derrogado o art. 14 da Lei de drogas (quadrilha com fim especial), que previa uma pena de 3 a 10 anos. Contudo, essa pena foi repristinada pela Lei 11.343/06.

Quadrilha ou bando do art. 288 do CP
Quadrilha ou bando do art. 35, Lei de Drogas
Mínimo 4 indivíduos
Mínimo 2 indivíduos
Visando a prática de crimes
Visando a prática de qualquer dos crimes previstos nos art. 33, caput, § 1º e 34.
Pena genérica de 1 a 3 anos Quadrilha com fim específico (crimes hediondos, terrorismo e tortura) cuja pena é de 3 a 6 anos.
Pena de 3 a 10 anos
Não admite tentativa

Não se admite a tentativa, pois os fatos punidos já são atos preparatórios.

Obs.: Rogério Sanches lembra que a Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC – Lei 12.529/11), ampliou as hipóteses de crimes passíveis de acordo de leniência (pacto de colaboração do infrator na investigação de crimes contra a ordem econômica que, uma vez cumprido, é causa de extinção da punibilidade). O acordo até então somente contemplava os crimes dos arts. 5º, 6º e 7º da Lei 8.137/90. Agora a Lei do SBDC (art. 87) admite a celebração de acordo para os crimes diretamente relacionados à prática de cartel, constando o crime de formação de bando/quadrilha, em seu rol exemplificativo.

11.3.4 Pontos relevantes:

1) Porte de arma de fogo – Para Hungria, basta um membro estar armado para qualificar o crime. Bitencourt compartilha com esse entendimento, mas desde que os membros saibam da arma. Para Bento de Faria, a maioria deve estar armada para qualificar o crime. Fragoso, por seu turno, entende que o juiz deverá reconhecer a qualificadora tanto pela quantidade de membros armados ou pela natureza da arma utilizada.
2) Não configura bis in idem a condenação por quadrilha ou bando armado e roubo majorado pelo emprego de arma, porquanto além de delitos autônomos e distintos, no primeiro o emprego da arma está calcado no perigo abstrato e, no segundo, no perigo concreto.
3) Envolvimento de “laranjas” na quadrilha ou bando: não respondem pelo crime, desde que desconheçam a existência ou finalidade da quadrilha, pois deve ser observado a T. do domínio do fato. Perceba que não podem nem mesmo completar o número legal (4 agentes), pois faltará a vontade livre e consciente de se associar.
4) a intervenção de inúmeras pessoas (quatro, cinco ou mais), por si só, é insuficiente para caracterizar a formação de quadrilha ou bando (Bitencourt).
5) o crime de quadrilha ou bando (concurso necessário) admite participação (concurso eventual de pessoas).

Atenção! Para melhor compreensão do tema crime organizado - Pesquisar: (1) direito penal funcional; (2) direito penal de 1ª, 2ª e 3ª velocidades; (3) direito de intervenção.

Art. 288-A - Constituição de milícia privada: Constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste Código: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos.

Foi incluído no art. 121 o § 6º (majorante) e no 129, mudou-se o § 7º.

11.4 CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA

O sentido básico de toda a classe de crimes de falso permanece sendo o de ofensa à fé pública, consistindo esta na confiança que impõem certos objetos, declarações, símbolos ou formas exteriores, por força do costume e das exigências da vida social.

A doutrina ensina que as características gerais dos crimes de falso são:

(1) imitação ou alteração da verdade: se apresenta quando a realidade é alterada de forma a causar uma falsa representação. O essencial é que se apresente como verdadeiro ou autêntico o que é falso, ou, mais propriamente, o que proporciona uma falsa representação da realidade.
(2) possibilidade de dano: relevância jurídica da falsidade. Não se pune o falso inócuo, que não envolve qualquer dano ou perigo de dano (o falso deve ser capaz de iludir qualquer pessoa). Alguns crimes de falso não exigem expressamente o dano. (3) dolo: consciência de causar o dano a que se refere à ação delituosa. Perceba que nem todos os crimes de falso estão entre os crimes contra a fé pública. São casos em que o legislador atribuiu maior relevo a outros aspectos do fato incriminado, o que é decisivo para sua classificação. Ex.: (1) emissão de cheque sem fundos, art. 171, § 2º, VI, nos crimes contra o patrimônio; (2) registro de nascimento inexistente, art. 241 nos crimes contra a família. Por outro lado, não só as hipóteses de falsidade estão previstas entre os crimes contra a fé pública. Ex.: (1) petrechos de falsificação, art. 291 e 294; (2) falsidade pessoal, art. 307.

11.5.1 moeda falsa e crimes equiparados

Art. 289
Art. 290
Art. 291
Tem como objeto material a coisa sobre a qual recai a conduta criminosa, a moeda papel ou metálica
Tem como objeto material a moeda papel fora de circulação.
Tem como objeto material maquinários para a produção de moeda falsa.

Questão: É possível aplicar o princípio da insignificância nesses crimes? Não é possível, pois o que importa não é o valor expresso (STF e STJ).

11.5.2 Bem jurídico protegido: fé pública, no particular aspecto da confiança de todos os cidadãos, indistintamente, na autenticidade da moeda, como símbolo de valor estabelecido pelo Estado. Em regra, é crime de perigo e só eventualmente de dano. Para a sua consumação, basta a potencialidade da ofensa à fé pública (crime formal).

11.5.3 Sujeitos do crime: (1) ativo em regra, qualquer pessoa (há hipóteses de pessoas específicas). (2) passivo – coletividade. Eventualmente, podem ser sujeitos passivos secundários, os indivíduos que tenham direitos ou interesses ofendidos pela conduta delituosa, inclusive o próprio Estado, como administração.

15.5.4 Art. 289 – Falsificação de moeda: Constituem objeto material da ação moedas, que, do ponto de vista jurídico, entende-se por peça metálica cunhada no Estado ou órgão autorizado, tendo curso legal no país ou no estrangeiro. Tem curso legal a moeda que não pode ser recusada como meio de pagamento (poder liberativo declarado por lei). No Brasil, a moeda legal é o real, Lei 9.069/95 (norma penal em branco).

A falsificação da moeda pode ocorrer por fabricação, hipótese em que o agente faz a moeda, ou por alteração, quando o agente modifica ou altera moeda genuína. É irrelevante, na fabricação, o método de que se serve o falsário e o material empregado.

Questão: A expressão “moeda” abrange travels checks ou cheque viagem? Cheque viagem não é moeda de curso legal, mas um meio de aquisição desta.

A moeda retirada de circulação, ou que não tenha curso legal, não pode ser objeto material desse crime, não excluindo, porém, que possa servir para configurar uma fraude (estelionato).

O CP (art. 7º, I, b) estabelece a extraterritorialidade da lei penal brasileira nos crimes praticados contra a fé pública da União, consequentemente, será processado e punido, no país, o autor deste crime, ainda que o pratique no estrangeiro esteja ou não no território nacional.

As falsificações grosseiras capazes somente de iludir os cegos, os simples e imaturos de mente, não constituem perigo para a fé pública e não é punível como moeda falsa, mas, tão só, como estelionato, se for o caso (é imprescindível a imitatio veri). De igual forma, não configura o crime em estudo a fabricação de moedas imaginárias.

Transformar uma nota de R$ 1 real em R$ 10 é crime, mas o contrário não. De acordo com a doutrina e a jurisprudência, somente se configura o crime se a alteração for no sentido de atribuir maior valor à cédula ou moeda metálica.

Configura o crime o recorte e colagem de fragmentos de cédulas sobre papel-moeda, a fim de atribuir-lhe maior valor. A modificação praticada sobre dinheiro recolhido para a recolocação na praça, constitui fabricação, pois a alteração prevista pela lei somente pode dar-se em moeda de curso legal.

Questão: É preciso a colocação da moeda em circulação? Basta a falsificação, sendo dispensável a intenção de colocar a moeda em circulação. Consuma-se no local da falsificação. O dolo é genérico e consiste na vontade livre e consciente dirigida à falsificação da moeda. Exige o conhecimento do curso legal da mesma e pelo menos a consciência da possível circulação do material falsificado. Os motivos e os fins de agir não interessam no tipo.

A quantidade e qualidade das moedas falsificadas são irrelevantes para a configuração do delito, embora possa ser considerada na medida da pena (art. 59, CP). Haverá um crime único se várias moedas forem falsificadas numa só ação, podendo também haver crime continuado, se as ações forem repetidas. Não haverá dolo se a moeda é falsificada numa demonstração de habilidade do agente ou para fim artístico.

A) Circulação de moeda falsa (art. 289, § 1º): Aqui o sujeito ativo é qualquer pessoa que não concorreu com a falsificação, ou seja, quem falsifica a moeda responde pelo caput e quem adquire ou quem coloca em circulação responde pelo §1º. Agora, se a pessoa falsifica e coloca em circulação só responde por um crime, pois a colocação em circulação será um post factum impunível (P. da consunção).

Questão: O estado de necessidade poderá ser alegado pelo agente? O estado de necessidade não tem sido reconhecido como argumento excludente da ilicitude pelos tribunais, ainda que o acusado esteja endividado e na iminência de perder o emprego, pois ausente a proporcionalidade entre o perigo de lesão ao bem jurídico e a ofensa causada.

Ações do tipo alternativo: (1) importar (introduzir no país) ou (2) exportar (enviar a outra nação); (3) adquirir (obter para si, de forma onerosa ou gratuita); (4) vender (alienar de forma onerosa); (5) ceder (entregar a outrem, a outro título); (6) emprestar (entregar a outrem para receber posteriormente idêntica quantidade e espécie), (7) guardar (ter consigo ou em depósito, à disposição) ou (8) introduzir na circulação (passar a moeda a terceiro de boa-fé, usando-a como instrumento de valor ou meio de troca, ou de qualquer outra forma desfazer-se da moeda, ensejando sua circulação como genuína).

Na modalidade guardar o crime é permanente e na modalidade adquirir é possível a tentativa. É crime de grande potencial ofensivo junto com o caput.

Tipo subjetivo: vontade consciente. A dúvida sobre a idoneidade da moeda pode configurar o dolo eventual. Salvo a última hipótese típica (introduzir em circulação), nas demais há sempre, em regra, conhecimento por parte de quem recebe a moeda de sua falsidade o que o fará responder igualmente pelo crime. Fragoso lembra que a introdução na circulação pode dar-se inclusive por abandono em lugar público, desde que haja consciência da possível circulação.

B) Circulação de moeda falsa recebida de boa-fé (art. 289, § 2º)

ART. 289, §1º DO CP
ART. 289, §2º DO CP
O agente age com manifesta má-fé.
O agente adquire de boa-fé, mas em seguida restitui a circulação com má-fé.
Mas se restitui a circulação de boa-fé e só depois descobre que era falsa a moeda, que crime foi praticado? FATO ATÍPICO.

Trata-se de forma menos grave do crime, em que o agente apenas visa obter ressarcimento do prejuízo que lhe foi infligido (crime privilegiado). O sujeito ativo desse crime pode ser qualquer pessoa, exceto os falsificadores e seus agentes ou intermediários, que conhecem a condição da moeda.

Questão: O agente tem que agir com dolo direto ou o eventual? Somente o dolo direto tipifica o crime, não abrangendo o dolo eventual, pois no tipo há a seguinte expressão: “depois de conhecer a falsidade”.

O crime se consuma exatamente no instante em que a moeda é colocada em circulação. A doutrina admite a tentativa.

Se o agente não provar a boa-fé no momento em que recebeu a moeda, nem por isso será enquadrado sumariamente na modalidade mais grave (art. 289, § 1º), porque para que está possa ser reconhecida incumbe à acusação provar que o agente conhecia a falsidade, devendo a dúvida resolver-se em favor do réu.

O recebimento pode ocorrer a qualquer título, de forma direta ou indireta, inclusive por doação. Contudo, se for por meio de furto ou qualquer outro crime ou achado, deverá o agente responder pelo crime do art. 289, § 1º. Note que a simples devolução da moeda à própria pessoa que entregou, será fato atípico.

C) Fabricação ou emissão irregular de moeda (art. 289, § 3º)

Pune o funcionário público ou diretor, gerente, ou fiscal de banco de emissão que fabrica, emite ou autoriza a fabricação ou emissão (crime funcional). Na verdade, trata-se de crime contra a administração pública (crime próprio).

A ação consiste em fabricar, emitir ou autorizar a fabricação ou emissão de moeda com título ou peso inferior (não superior) ao determinado em lei. Entende-se por título, no sentido da lei, a proporção ou teor da liga metálica legalmente estabelecida para a composição da moeda. A segunda modalidade do crime é referente à produção de papel-moeda em quantidade superior (não inferior) à legalmente autorizada. A produção de quantidade maior de moeda metálica é fato atípico, e o interprete da lei não pode colocá-la. O crime é punido a título de dolo e se consuma com a prática de qualquer um dos núcleos.

Haverá concurso material se o agente praticar em seguida qualquer outro crime, com a moeda produzida irregularmente (peculato, estelionato etc.).

D) Desvio e circulação indevida (art. 289, § 4º)

Pune quem desvia e faz circular moeda, cuja circulação não estava ainda autorizada.

Pode ser praticado por qualquer pessoa (funcionário ou não): retirar o dinheiro da destinação (transitória ou definitiva) que lhe é atribuída por lei ou regulamento, e introduzi-lo em circulação, abusivamente. Para a existência do crime não se exige que o agente obtenha vantagem pessoal, nem a ação de desviar a pressupõe. O crime pode ser praticado pelo funcionário que infringe as regulamentações devidas e lança a moeda em circulação. Se após o desvio não houver a circulação, haverá apenas tentativa.

15.5.5 Art. 290 Crimes assimilados ao de moeda falsa

O crime é comum e se o funcionário público for o agente haverá uma qualificadora. O funcionário público tem que “trabalhar na repartição onde o dinheiro se achava recolhido, ou nela tem fácil ingresso, em razão do cargo”. Embora reunidos em um só dispositivo legal, três são efetivamente os crimes previstos: formar, suprimir e restituir à circulação.

(1) Formar cédula, nota ou bilhete representativo de moeda com fragmentos de cédulas, notas ou bilhetes verdadeiros; passa a costurar uma nota falsa com fragmentos de uma nota verdadeira. Dispensa a colocação da moeda no mercado.

(2) suprimir, em nota, cédula ou bilhete recolhidos, para o fim de restituí-los à circulação, sinal indicativo de sua inutilização; o agente mexe apenas no sinal que invalida a nota, retirando o carimbo de inutilizacão. Dispensa a colocação da moeda no mercado.

(3) restituir à circulação cédula, nota ou bilhete em tais condições, ou já recolhidos para o fim de inutilização; o agente restitui notas inviabilizadas à circulação. NÃO dispensa a colocação da moeda no mercado.

Ao contrario com do crime de moeda falsa (art. 289), a aquisição e o recebimento da moeda nas condições descritas no art. 290, não foram elevadas à categoria de crime, subsistindo o delito de receptação.

O dolo envolve o conhecimento de que o papel-moeda é formado com fragmentos de cédulas ou se acha recolhido.

Este crime não se confunde com a introdução de moeda falsa em circulação (art. 289, § 1º), em que a ação tem por objetivo moeda falsificada por fabricação ou alteração.

Art. 289.
Art. 290
Falsificador responde pelo art. 289 caput
Falsificador responde pelo art. 290 caput
Receptador responde pelo art. 289 , § 1º
Receptador responde pelo art. 180 do CP

Obs.: A moeda metálica está excluída deste crime.
O delito é punido a título de dolo, com uma observação: esse dolo tem uma finalidade especial, que é a de restituir à circulação. Se a restituição à circulação for feita pela mesma pessoa que formou a cédula, suprimiu os sinais de inutilização ou subtraiu o papel-moeda destinado à inutilização, haverá um só crime, pois a última ação será fato posterior não punível (Fragoso).

11.5.6 Art. 291 Petrechos para falsificação

Fabricar, adquirir, fornecer, a título oneroso ou gratuito, possuir ou guardar maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de moeda. Trata-se de crime autônomo, excepcionando a regra de não punição de atos preparatórios (crime comum).

Segundo Fragoso, este crime é subsidiário em relação ao crime de moeda falsa (art. 289). Caso o agente desista voluntariamente da falsificação, subsistirá o crime de petrechos para falsificação de moeda.

Não há aparelhos que falsifiquem única e exclusivamente a moeda. Logo, não precisa ser maquinário específico para a falsificação. É irrelevante a alegação de que o fim era a produção de moeda verdadeira, pois, necessariamente, a moeda que for produzida será considerada falsificada, em razão da exclusividade da União em emiti-la (competência da justiça federal). É imprescindível a perícia.

Questão: Se o agente foi encontrado com os petrechos e com as moedas falsas, quantos crimes ele praticou? Os petrechos ficarão absorvidos pela falsificação. Assim, o art. 289 absorverá o art. 291.

Decidiu o STJ que se os petrechos apreendidos não se prestam apenas para a falsificação da moeda, servindo para outras fraudes, a competência será da Justiça Estadual.

15.6 Emissão de título ao portador sem permissão legal (Art. 292)

Dede os tempos do império já se cuidava de reprimir a emissão irregular de títulos ao portador, cuja circulação entendia-se que afetava a moeda de curso legal.

A proibição encontra fundamento no propósito de impedir que títulos ao portador concorram com a moeda, perturbando-lhe a circulação normal e ofendendo, como se fossem moedas falsas, a fé pública.

O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa (aquele que emite título ao portador), crime comum.
A conduta incriminada é de emitir (lançar em circulação) nota, bilhete, ficha, vale ou título ao portador ou a que falte indicação do nome da pessoa a quem deva ser pago. Título ao portador é aquele que constitui uma obrigação de pagar determinada importância a quem o apresente como detentor. É também título ao portador aquele a que falta indicação do nome do favorecido.

Obs.: É lícito o uso de vales provisórios, empregados normalmente na vida comercial, destinados a circular em ambiente restrito e emitidos para fins específicos. Ao contrário do que ocorre no crime de moeda falsa (art. 289), não basta aqui a formação do título, que será meramente ato preparatório. A permissão legal exclui o crime. Ex.: letra de câmbio, cheque, ações de sociedades anônimas.

A consumação ocorre no momento em que o agente introduz o título em circulação, entregando-o ou enviando-o ao tomador. O crime é formal e admite tentativa. A forma do título ou a inscrição nele contida é perfeitamente irrelevante, desde que contenha inequívoca promessa de pagamento de dinheiro.

Parágrafo único: recebimento ou utilização de títulos como dinheiro

Trata-se de atividade acessória em relação à emissão, mas cuja idoneidade para aumentar ou estender o dano ao interesse penalmente tutelado é manifesta.
O crime consiste em receber ou utilizar (como instrumento de valor ou meio de troca, ou seja, função específica da moeda) como dinheiro.


AULA XII – FALSIFICAÇÃO DE TÍTULOS E OUTROS PAPÉIS PÚBLICOS

12.1 Art. 293 Falsificação de papéis públicos

A proteção penal aqui se exerce em relação a papéis representativos de valores ou relativos a valores de responsabilidade do Estado, ou a arrecadação de impostos e taxas. Segundo Hungria, “entre tais papéis, há os que têm afinidade com o papel-moeda, destinando-se a meio (e comprovante) de pagamento de certos tributos, contribuições fiscais ou preços públicos; e há os que se assemelham mais aos documentos em geral, representando, nas hipóteses previstas, meios probatórios contra a administração pública”.

12.1.1 Bem jurídico protegido: fé pública, no aspecto da garantia da autenticidade de títulos e papéis públicos. Sujeitos do crime: (1) ativo - crime comum, salvo no caso do inciso III, § 1º, em que somente poderá ser sujeito ativo o comerciante ou o industrial (crime próprio). A qualidade de funcionário agrava o crime. (2) passivo - Estado e, secundariamente, o ofendido pela conduta. A materialidade do fato consiste em falsificar, fabricando ou alterando, qualquer dos papéis e títulos que estão previstos nos incisos do art. 293 e são objetos da ação delituosa. Em qualquer das suas modalidades o crime é formal e se consuma com a falsificação. Admite tentativa.

12.1.2 Uso de papéis falsificados (art. 293, §1º): não se pune o uso praticado pelo autor da falsificação, visto tratar-se de fato posterior impunível.

12.1.3 Supressão de sinais indicativos de inutilização (art. 293, §2º): os papéis são autênticos, mas há carimbos ou sinais indicativos de sua inutilização. A ação pode ser praticada por qualquer meio e o crime se consuma com a efetiva supressão, praticada com o chamado dolo específico (fim de tornar os papéis novamente utilizáveis). O uso desses papéis constitui o crime previsto no § 3º do mesmo artigo, podendo constituir exaurimento quando usado pelo agente que suprimiu o sinal. Exige a consciência de que os papéis se achem na situação a que a lei se refere, bastando, porém, o dolo eventual.

12.1.4 Restituição à circulação de papéis falsos recebidos de boa-fé: crime privilegiado (idem à circulação de moeda falsa).

12.2 Art. Petrechos de falsificação (art. 294)

Idem à fabricação de moeda falsa, o legislador erigiu os atos preparatórios para falsificação de papéis em crime autônomo.

12.3 Agravante especial (art. 295): refere-se às condutas delituosas dos arts. 293 e 294. Não basta ser funcionário público, pois é necessário que este se aproveite das facilidades que lhe proporciona o cargo / função que desempenha.

12.4 FALSIDADE DOCUMENTAL

Documento é todo escrito devido a um autor determinado, contendo exposição de fatos ou declaração de vontade, dotado de significação ou relevância jurídica. É todo objeto que, por si só, comprova um fato (todos acreditam), possuindo relevância jurídica.

12.2.1 Características do documento:

1. forma escrita: nem todo escrito é um documento. Documento não autenticado não pode ser objeto dos crimes de falsidade documental. O escrito deve ser feito sobre coisa móvel, que possa ser transportada e transmissível (não abrange o escrito em imóvel ou veículo). Pode ser feito à mão ou por meio mecânico ou químico, podendo ser empregados os sinais alfabéticos de qualquer língua e, inclusive, sinais taquigráficos, numéricos, criptográficos ou telegráficos, desde que constituam expressão do pensamento. No caso de reprodução mecânica, é indispensável à subscrição manuscrita, não sendo documento, portanto, os trabalhos impressos (livros, revistas, jornais etc.). Não constitui documento o escrito indecifrável ou aquele que somente o autor pode entender.

2. autor determinado: identificação do autor do escrito (que não é necessariamente a pessoa que o escreveu, mas aquelas a quem se deve a declaração de vontade). O escrito anônimo não é documento. Em regra, a identificação é feita pela assinatura aposta ao documento, mas não se exclui a que possa decorrer do próprio conteúdo, desde que a lei não exija expressamente a subscrição. Incabível, contudo, buscar a identificação do autor em elementos estranhos ao próprio escrito. A assinatura pode ser feita por abreviação de parentesco (“teu pai”, “teu irmão” etc.) ou por pseudônimo reconhecido, desde que através dela seja possível identificar o autor. A impressão digital, porém, não substitui a assinatura (Fragoso).

3. conteúdo ou teor: manifestação de vontade ou exposição de fatos. Não há documento sem conteúdo. A simples assinatura aposta a um papel ou a um quadro não constitui documento. Este deve conter uma manifestação do pensamento realizada através da narração ou exposição de um fato ou uma declaração de vontade (documentos declarativos e expositivos). O escrito ininteligível ou sem sentido não é documento.

4. relevância jurídica: conteúdo juridicamente apreciável, isto é, a expressão de pensamento deve acarretar consequências jurídicas. Esse conteúdo deve ser atual ou presente, e não passado ou futuro. Se o documento é especialmente destinado a servir como meio de prova, ele será um instrumento. Outros escritos podem ser documentos de ocasião, quando, sem terem sido preconstituídos como meio, em determinado momento tornam-se idôneos à comprovação de fatos juridicamente relevantes. A circunstância de ser juridicamente nulo não exclui o documento da tutela penal. Há documentos ou atos que, na ausência de certos requisitos, são considerados pela lei civil absolutamente nulos e que nem por isso são insuscetíveis de falsidade punível. Evidentemente, contudo, não constituirá documento o ato nulo, juridicamente irrelevante, isto é, incapaz de produzir qualquer consequência no mundo do direito; todavia aqui não se atende à nulidade, mas à inexistência do documento.

Os documentos podem ser públicos ou particulares, estando ambos protegidos pela tutela penal, em diferentes dispositivos. Diz-se genuíno o documento, quando seu autor aparente é o seu autor real. Diz-se verídico o documento em que a declaração de vontade ou exposição que contém, corresponde à realidade dos fatos. A falsidade operada em relação à autenticidade do documento é material; a que se refere à veracidade do conteúdo, é ideológica (Fragoso).

12.2.2 Art. 296 Falsificação de selo ou sinal público

Os selos e sinais públicos a que a lei penal aqui se refere, não constituem documentos. São, porém, comumente empregados como elementos de certificação ou autenticação documental, o que justifica a classificação. Uma vez apostos ao documento, tais passam a fazer parte integrante dele.

A falsificação (fabricação ou alteração) deve ter como objeto selo público destinado a autenticar atos oficiais (destinação objetiva) da União, de Estado ou de Município. O conteúdo do selo é irrelevante e a falsificação será sempre por imitação do sinal autêntico. A falsificação de selo imaginário não é crime. No caso de alteração, o agente modificará o selo genuíno, para fazê-lo passar por outro, atribuindo-o a outra autoridade.

Atenção! A falsificação de selo público de titularidade de autoridade estrangeira não configura o delito, mas poderá constituir meio para outro crime. Não precisa ser uma falsificação perfeita, bastando ter idoneidade de enganar indeterminadas pessoas. O crime se consuma com a falsificação, independentemente de qualquer outro resultado.

A) Uso de selo ou sinal falsificado (art. 296, § 1º): uso para autenticar ou certificar ato oficial. A simples detenção do sinal/selo falsificados não é crime. O agente deve saber da falsificação. O uso do selo por parte de quem falsificou será fato posterior impunível.

B) Utilização indevida (art. 296, II): utilização abusiva de selo ou sinal verdadeiro. Aqui o sujeito ativo é normalmente funcionário público, porém, o crime é comum. Se o sinete ou instrumento necessário à aposição do selo for obtido mediante furto, haverá concurso material de crimes.

Não haverá crime sem que a utilização indevida tenha sido realizada em prejuízo alheio ou proveito próprio ou de outrem. Tanto o prejuízo como o proveito podem ser de qualquer espécie ou natureza (material ou mora). É indispensável que esse resultado (dano ou vantagem, para si ou para outrem) se verifique efetivamente, pois constitui o momento consumativo do crime.

Se a utilização abusiva for para falsificar um documento, haverá um único crime (falsidade documental). Aplica-se o P. da absorção. Sendo o agente funcionário público, e cometendo o delito prevalecendo-se da função, a pena é aumentada de um sexto. Tal disposição abrange qualquer das condutas previstas no art. 296.

12.3 Falso material (arts. 297 e 298)

Art. 297
Art. 298
Pena de 2 a 6 anos
Pena de 1 a 5
Crime comum, majorado (1/3) quando praticado por funcionário público.
Crime comum, não majorado quando praticado por funcionário público. O STJ entende que essa circunstância deve ser considerada na fixação da pena base.
Falsificar ou alterar no todo ou em parte
Falsificar ou alterar no todo ou em parte
Documento público ou equiparado a público
Documento particular (aquele que não for público)
É imprescindível a capacidade de iludir (perícia)
É imprescindível a capacidade de iludir (perícia)
Exige-se dolo, sem fim especial
Exige-se dolo, sem fim especial
Dispensa o efetivo uso do documento
Dispensa o efetivo uso do documento (crime formal)
Admite-se tentativa (ainda que formal)
Admite-se tentativa (ainda que formal)

Cuidado! Cópia de cheque utilizada durante a noite (na balada) poderá iludir o homem médio. Por esse motivo, Rogério Sanches alerta que o correto é utilizar como parâmetro as circunstâncias em que foi utilizado o documento para iludir, e não o homem médio.

12.3.1 Art. 297 – infração de maior potencial ofensivo, não admite suspensão condicional do processo. Caso o agente seja primário, ainda assim, caberá prisão preventiva. Pena de 2 a 6 anos. No caso de documento particular, crime de menor potencial ofensivo (pena de 1 a 5 anos), admite-se a suspensão condicional do processo.

Sujeitos do crime: (1) ativo – crime comum. Note que, se for funcionário público a pena pode ser aumentada de 1/6. Tratando-se de documento da Previdência, responderá o agente pelo art. 297, § 3º. (2) passivo – primário, o Estado; secundário, o prejudicado.

Conduta: falsificar ou alterar. Pressupõe dolo (sem finalidade especial do agente). Havendo finalidade do agente, o crime poderá ser outro.

Falsificar
Alterar
Ao todo (total) à o agente cria o documento
Em parte (parcial) à aproveita os espaços em branco
Substituição de palavras ou rasuras

A consumação ocorre no momento em que é praticada uma das ações nucleares previstas no tipo. Tratando-se de delito plurissubsistente admite-se tentativa.

ð Documento formal e substancialmente público é aquele emanado por funcionário público competente, inerente ao interesse publico.
ð Documento formalmente público de conteúdo privado é aquele emanado de entes públicos. Ex: tabeliões.

Essa distinção não tem consequência na prática, pois a lei penal equipara, para mesmo tratamento, a falsificação em ambos os casos.

São considerados documentos públicos: (1) os emanados por paraestatais (SEM, FP e EP); (2) títulos ao portador (cheque); (3) ações de S/A ou comandita por ações; (4) livros de sociedade comercial; (5) testamento particular. Note que o cheque quando deixa de ser transmissível por endosso (perda do prazo de protesto), passando a ser transmissível por cessão civil (endosso póstumo), voltará a ser considerado documento particular.

O telegrama é um documento particular, em regra, pois se a falsificação recair sobre as anotações oficiais que o telegrama contiver terá caráter público. Lembre-se que os escritos a lápis não configuram documento, em decorrência da insegurança da sua manutenção.

Para Fragoso, o documento público que a lei penal aqui contempla é não só o nacional, como também o estrangeiro, desde que no exterior seja considerado documento público, e desde que tenha atendido às formalidades exigidas para sua eficácia no Brasil.

Caso o documento seja dotado de irrelevância jurídica, poderá ser alegada a atipicidade. Contudo, Fragoso entende que a força probante do documento público é irrelevante, de modo que não interessa à configuração do crime o fato de portar o documento fé pública, circunstância que, todavia, poderá ser considerada na medida da pena.

A falsificação pode dar-se pro formação, no todo ou em parte, de escrito com aparência de documento público (contrafação), bem como por alteração de documento verdadeiro (a alteração do documento falso não é crime). A simples eliminação de parte do conteúdo (juridicamente relevante) constituirá o crime previsto no art. 305 (supressão de documento). É irrelevante que o conteúdo do documento falsificado ou alterado seja verdadeiro ou falso. Em qualquer caso, exige-se o exame de corpo de delito, pois o crime deixa vestígios, sendo indispensável à apresentação do documento falsificado. O exame de corpo de delito indireto é inadmissível.

Trata-se de crime de perigo. A tentativa é admissível, já que não a exclui o crime de perigo.

12.3.2 Art. 298 - Documento particular é aquele feito sem forma especial, formado por particulares e sem a intervenção de oficial público. É de notar-se que são documentos particulares os atos públicos nulos como tais, por serem feitos por oficiais incompetentes ou por não se revestirem das formalidades legais. O crime pode ser praticado por contrafação, total ou parcial, ou por alteração do documento verdadeiro. Em qualquer caso, consuma-se com a falsificação ou alteração, independentemente do uso efetivo, já que se trata de crime formal.

A tentativa é admissível. Aqui também será indispensável, para o reconhecimento da falsidade punível, a existência de prejuízo alheio, atual ou potencial, de qualquer natureza.

12.3.3 Falsificação de documento e princípio da especialidade

Público: para fins eleitorais.
Art. 2º, da Lei 7.492/86 (crimes financeiros) – documento representativo de título ou valor mobiliário. Pena de 2 a 8 anos.
Privado: para fins eleitorais.

12.4 Art. 299 Falsidade ideológica

Tutela-se a fé pública, mas em seu conteúdo. Só poderá ser praticado por qualquer pessoa que tenha o dever jurídico de declarar a verdade. Há duas penas: de 1 a 5 anos se o documento for público e de 1 a 3, se o documento for particular. Não existe o crime quando a falsa ideia recai sobre documento cujo conteúdo está sujeito à fiscalização da autoridade. Ex.: uma parte se declarou falsamente a hipossuficiência e o juiz confirmou a falsidade. O STJ entendeu que compete à autoridade fiscalizar isso, determinando o trancamento do inquérito.

Objeto material da ação será sempre documento público ou particular. A materialidade do fato consiste em omitir, em tais escritos, declaração que deles deveria constar, ou neles inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que deveria ser escrita. Pode assim o crime ser praticado por ação ou omissão.
Diz-se que há falsidade ideológica mediata, quando o agente faz inserir no documento através de terceiro (geralmente oficial público), declaração falsa ou diversa da que deveria ser feita. Se o terceiro estiver consciente da falsidade, haverá concurso de agentes. A falsa informação prestada pelo agente, neste caso, pode ser feita verbalmente ou por escrito.

Deve haver finalidade especial: criar obrigação e extinguir ou prejudicar direitos. Caso contrário, será fato atípico. Ex. 1: senhora que falsifica certidão de nascimento para enganar namorado. Ex. 2: duas pessoas que mentem o local de acidente de trânsito. Note que a omissão não admite tentativa.

Questão: A falsidade necessita de perícia? Como a falsidade afeta o documento em sua ideação e não autenticidade ou inalterabilidade, é desnecessária perícia. Cuidado! O p. único (majorante de pena) aduz que, se o agente é funcionário público ou se a falsificação é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de 1/6.

Declarar falsamente paternidade em assentamento de registro civil, não incide a falsidade ideológica, pois há tipo específico: art. 241 e 242 do CP. Trata de recém-nascido (registrar como próprio o filho de outrem). Cuidado com as falsidades especiais dos arts. 350 do Código Eleitoral e 66 da Lei 9605/98 – falsificar licenciamento ambiental.

ð Falsidade material - o sujeito cria ou altera um documento verdadeiro.
ð Falsidade ideológica - o documento é formalmente verdadeiro, mas seu conteúdo é falso.

Questão: A substituição de fotografia em RG configura qual delito? 1ª corrente - Configura o art. 307, delito de menor potencial ofensivo (AGU); 2ª corrente - configura a falsidade de documento público do art. 297, CP (majoritária).

Quanto à tentativa, cumpre distinguir: na forma de omitir declaração, o crime será omissivo puro, e não admitira tentativa. Todavia, na forma de inserir ou fazer inserir declaração falsa, é perfeitamente possível a tentativa, já que se pode fracionar o processo executivo.

12.4.1 Abuso de folha em branco: O agente se aproveita de documento ou papel assinado que lhe é entregue em confiança, ou de que tem a posse ou detenção, para preenchê-lo abusivamente. A ação geralmente é praticada para obter vantagem patrimonial. Não há previsão no CP para esse abuso. Todavia, a Exposição de Motivos (nº 61) aduz que o fato está conceitualmente incluído na falsidade ideológica (Fragoso). Perceba que a folha de papel assinada inteiramente em branco não é documento, por faltar-lhe conteúdo. Não há dúvida, porém, de que se torna documento, desde que ocorre o preenchimento dos claros ou da parte em branco. Considera-se folha assinada em branco, não só a que se apresenta inteiramente em branco, contendo apenas a assinatura, como aquela que contém apenas alguns espaços em branco, a serem preenchidos, ou que podem ser preenchidos. Há, em qualquer caso, uma falsidade, pois o conteúdo do documento aparece como sendo de autoria do signatário, o que constitui, sem qualquer dúvida, falso.

12.4.2 Pontos relevantes:

1) a falsificação grosseira não configura o delito de falsidade, dependendo de perícia, salvo nos casos de substituição de fotografia (STF e STJ).
2) inserir conteúdo falso em documento verdadeiro em branco. Para Hungria, se houver posse legítima do documento, haverá falsidade ideológica. Agora, se a posse for ilegítima, a falsidade será material. Em se tratando de nota promissória emitida sem alguns de seus requisitos essenciais, é permitido ao portador de boa-fé do título preencher os espaços em branco. Trata-se da aplicação da súmula 387, STF.

12.5 Art. 300 Falso reconhecimento de firma ou letra (o tabelião ou responsável)

Trata-se de modalidade de falsidade ideológica em que a fé pública vem tutelada contra a falsa autenticação documental, praticada em geral por tabeliães (crime próprio). A condição de funcionário, sendo elementar ao crime, transmite-se, evidentemente, ao coautor (art. 30), que responderá pelo crime em exame, posto que não tenha tal qualidade. O crime consuma-se com a falsa atestação, independentemente de qualquer outro resultado (crime formal).

12.6 Art. 301 Certidão ou atestado ideologicamente falso (funcionário público competente).

Crime próprio e outra modalidade de falsidade ideológica. A ação só pode ser praticada por funcionário público, na execução de ato de ofício. A simples condição de funcionário não basta, devendo o ato constituir atribuição funcional. A materialidade do fato consiste em atestar ou certificar falsamente fato ou circunstância que habilite alguém a obter qualquer vantagem de caráter público.

O crime consuma-se com a formação do falso atestado ou certidão (que será documento público), independentemente de qualquer outro resultado (pode, assim, o documento permanecer na posse do funcionário). Pode a falsidade ser parcial, isto é, relativa apenas a fato ou circunstância referida na certidão ou atestado, desde que condicionante da obtenção de vantagem.

12.7 Art. 302 Falsidade de atestado médico

Espécie de falsidade ideológica. Estes documentos pressupõem uma capacidade técnica ou científica, e neles se deposita maior fé pública, precisamente pela maior dificuldade de seu controle. Trata-se de crime próprio (somente o médico pode praticá-lo). O atestado dever ser dado no exercício da profissão, o que significa que seu conteúdo deve relacionar-se com fatos cuja constatação incumbe ao médico realizar. A falsidade, que pode ser total ou parcial, pode ser praticada com a consignação de fato inverídico ou com a omissão de fato verdadeiro, desde que juridicamente relevante. Se houver finalidade lucrativa aplica-se cumulativamente multa.

Se o agente for funcionário e se o ato for praticado em razão de ofício, o crime será o de corrupção passiva (art. 317).

Atenção! O uso do atestado falso constitui o crime previsto no art. 304, podendo médico responder como co-autor pelo crime que vier a ser praticado com o atestado falso se lhe conhecia a destinação.

12.8 Art. 303 Reprodução ou adulteração de peça filatélica

No conceito Celso Delmanto, peça filatélica compreende os cartões, ou blocos comemorativos, obliteradores, provas etc. Protege-se a fé pública no particular aspecto da autenticidade de selos e peças filatélicas que tenham valor para coleção. Igual tratamento não se dispensou às moedas antigas e recolhidas, usadas para coleção. A falsidade operada em relação às mesmas somente será punível como elemento do crime patrimonial que vier a ser praticado.

A ação deve ter necessariamente por objeto selo recolhido ou inutilizado para fins postais (caso contrário, o crime será o do art. 293, I) ou qualquer outra pela filatélica, desde que tenha valor para coleção.

12.9 Art. 304 Uso de documento falso

Apresentar o documento falso. A pena dependerá do tipo de documento, se público ou particular. Caso o documento seja apresentado pelo próprio falsificador, o uso será um post factum impunível. Agora, se apresentado por pessoa distinta, quem apresenta responde pelo 304 e quem falsifica pelo 297.
Pode o uso ser de qualquer natureza (judicial ou extrajudicial) e deve consistir em ação, sendo incabível por omissão. Não haverá crime sem a existência de conduta positiva por parte do agente, na utilização do escrito. É imprescindível que se trate do próprio documento falso, não bastando o uso de uma cópia ou de uma fotocópia não autenticada (que nem sequer é documento). O crime é instantâneo, consuma-se com a simples utilização do documento, sem que seja necessário indagar da existência de qualquer proveito ou dano.

O uso de vários documentos falsos numa mesma ação delituosa implica em concurso formal de crimes. O uso do mesmo documento falso em relação a várias pessoas constitui crime continuado

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