segunda-feira, 23 de julho de 2012

TGP - AULAS 1 e 2

AULA I – INTRODUÇÃO

Questão: O que é o direito processual? Ramo que estuda a função jurisdicional exercida pelo Estado. Possui duas acepções: (1) científica - exercício da função; (2) normativa - rege o exercício. Lembre-se que o Estado Democrático de Direito, no exercício de seu poder soberano: (1) Legislativo; (2) Executivo; (3) Judiciário – aqui está a TGP.

Até o século XIX, o direito processual não tinha autonomia. Constituía parte do direito privado. Na virada desse século, ocorreu uma profunda transformação dogmática do processo na Europa Ocidental (Giusppe Chiovenda, Francesco Carnelutti e Mauro Cappelletti). O grande marco do processo foi a obra Acesso à Justiça (Mauro Cappelletti) – um apanhado de vários sistemas processuais pelo mundo (identificou as ondas renovatórias). A ideia de Cappelletti era a de tornar o acesso à justiça assegurado a todos, produzindo resultados individuais e socialmente justos, deixando em segundo plano as formalidades processuais.

O acesso à justiça deve ser amplo, garantindo:
1) o devido processo legal;
2) o contraditório e a ampla defesa;
3) participação das partes na formação do convencimento do juiz;
4) busca de uma solução justa.

Obs.: para que se tenha acesso assegurado à justiça é preciso eliminar as dificuldades econômicas (oferta de assistência jurídica integral e gratuita).

1. SOCIEDADE E TUTELA JURÍDICA
ubi societas ibi jus.

Questão: Qual a causa dessa correlação entre sociedade e direito? Está na função ordenatória, quer dizer, na coordenação dos interesses que se manifestam na vida social, de modo a organizar a cooperação e composição de eventuais conflitos. Em resumo, a tarefa da ordem jurídica é a de controle social.

Para Aristóteles, “o homem é um animal político, que nasce com a tendência de viver em sociedade”. Há quem defenda que o homem viveu uma fase pré-jurídica. Contudo, os historiadores são uníssonos em afirmarem que o direito e a sociedade nasceram e caminham juntos. Ex.: Robinson Crusoé e o índio Sexta-Feira.

2. CONFLITOS E INSATISFAÇÕES

intersubjetivos (patrimoniais e pessoais). É sempre um fator antissocial. Aqui surgem os conflitos de interesse, gerando insegurança

CONFLITOS:

Pessoas Vs. Pessoas ou Pessoas Vs. Estado

Desses conflitos surge o conceito de Lide, que de acordo com Carnelutti, é o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida (discutida) ou insatisfeita.

INTERESSES: (i) individuais; (ii) públicos (difusos); (iii) coletivos.

INDIVIDUAIS

COLETIVOS
DIFUSOS
São aqueles em que a situação favorável à satisfação de uma necessidade pode determinar-se em relação a um indivíduo, isoladamente. Ex.: o uso de uma casa.

A situação favorável à satisfação de uma necessidade não se pode determinar senão em relação a vários indivíduos, em conjunto. Ex.: o uso de uma área comum em condomínio.

São aqueles em que a situação favorável à satisfação de uma necessidade não se pode determinar senão em relação aos titularizados por uma cadeia abstrata de pessoas. Ex.: meio ambiente.


3. MEIOS DE RESOLUÇÃO DOS CONFLITOS

1) Autotutela / autodefesa: (1) ausência de um julgador distinto das partes; (2) imposição da decisão por uma das partes.
2) Autocomposição: (1) desistência (renúncia ao direito); (2) submissão (renúncia à resistência); (3) transação (concessões recíprocas).
3) Arbitragem: um terceiro surge para decidir de forma imparcial (em regra, por sacerdotes e anciãos).
4) Jurisdição: ???

Obs. 1: com a arbitragem, observa-se o aparecimento da figura do juiz antes mesmo do legislador.
Obs. 2: perceba que, a autocomposição e a arbitragem limitavam-se a fixar a existência ou não do direito. O cumprimento da decisão continuava dependendo da autotutela.

Questão: Quando surge a jurisdição? A partir do momento em que o Estado passa a se impor aos particulares, invadindo a esfera de liberdade destes, surge a jurisdição. Inicialmente, com a figura do pretor (magistrado), firmando-se concretamente com a Lei das XII Tábuas (450 aC), do Direito Romano  aqui surge o legislador.

Questão: Como funcionava esse primeiro indício de jurisdição? Os cidadãos em litígio compareciam perante o pretor, firmando o compromisso de aceitar a decisão (litiscontestatio), e ao árbitro (apud judicium). Em verdade, o pretor (representante do Estado) apenas ditava as regras para que o árbitro julgasse de forma justa.

Após esse período arcaico, o pretor ganhou mais força / autonomia, passando a reconhecer ele próprio o mérito dos litígios. Essa nova fase, iniciada no século III d.C., ficou conhecida por período cognitio extra ordnem. Nesse ponto, encerra-se o ciclo da chamada justiça privada (para a justiça pública).

RESUMO:

Antes do Estado conquistar para si o poder de decidir o direito no caso concreto, ocorreram 3 fases:
1 - autotutela e autocomposição
2 - arbitragem facultativa
3 - arbitragem obrigatória (aqui surge o processo)
 - jurisdição (em sentido moderno).

Atenção! Leitura obrigatória: (1) LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, 11ª ed, Método. texto: Divisão orgânica do poder – “tripartição de poderes”. p. 323-327; (2) CORREIA, Marcus Orione. Teoria Geral do Processo, 5ª ed, Saraiva. Texto 1: ondas renovatórias.


AULA II – A FUNÇÃO ESTATAL PACIFICADORA

2.1 Finalidade da jurisdição [será aprofundada na aula XI]

O Estado visa pacificar 3 ordens com a jurisdição:

1ª ordem – social
2ª ordem – política (manter a ordem política)
3ª ordem – jurídica

Outras apontadas pela doutrina: educação, liberdade, vontade concreta de direito.

2.2 Meios Alternativos de pacificação social

No Brasil, a autotutela é definida como crime, seja quando praticada por particular (art. 345, CP), seja pelo próprio Estado (350, CP). A autocomposição não é incentivada e a arbitragem praticamente desconhecida. Lembre-se que a autodefesa, excepcionalmente é admitida no Brasil: legítima defesa e desforço imediato.

CP - Art. 345 - Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite:
Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência.
Parágrafo único - Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.

CP - Art. 350 - Ordenar ou executar medida privativa de liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder:
Pena - detenção, de um mês a um ano.
Parágrafo único - Na mesma pena incorre o funcionário que:
I - ilegalmente recebe e recolhe alguém a prisão, ou a estabelecimento destinado a execução de pena privativa de liberdade ou de medida de segurança;

2.3 Ruptura com o formalismo

a) conciliação - É incentiva desde a Constituição Imperial . Ex.: (i) JECrim; (ii) art. 847 e 850; (iii) 125, IV, CPC.

CLT - Art. 850 - Terminada a instrução, poderão as partes aduzir razões finais, em prazo não excedente de 10 minutos para cada uma. Em seguida, o juiz ou presidente renovará a proposta de conciliação, e não se realizando esta, será proferida a decisão.

§ único - O presidente da Junta, após propor a solução do dissídio, tomará os votos dos vogais e, havendo divergência entre estes, poderá desempatar ou proferir decisão que melhor atenda ao cumprimento da lei e ao justo equilíbrio entre os votos divergentes e ao interesse social.

CPC - Art. 125. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-lhe:
I - assegurar às partes igualdade de tratamento;
II - velar pela rápida solução do litígio;
III - prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da Justiça;
IV - tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes.

b) arbitramento (não vale no penal)

Conciliação: i) endoprocessual (transação penal); ii) extraprocessual (juiz de paz – não se aplica ao Direito Penal).

2.4 Controle jurisdicional indispensável (ligado à liberdade)

P. da nulla poena sine judicio - Proíbe-se a autotetula do Estado e autocomposição entre Estado e acusado.

Alguns países permitem a submissão à pena pecuniária. Ex.: plea of guilty do direito inglês. Há também o bargaining (transação entre acusação e defesa – EUA). Nesse ponto, é de se notar que no Brasil há a transação penal, antes mesmo da instauração do processo (art. 98, I, CRFB/88). Cumpre registrar que a Lei 9.099/95 trouxe 4 medidas despenalizadoras: (1) composição civil dos danos; (2) pena alternativa; (3) representação condicional; e (4) sursis processual (p/ pena mínima de 1 ano).

2.6 O Processo e o Direito Processual

As funções do Estado moderno estão ligadas:
a)     à vida e ao desenvolvimento da nação;
b)    ao fortalecimento dos valores humanos da personalidade;
c)     garantia de liberdade e bem estar social (welfare state);
d)    pacificação dos conflitos com justiça.

2.7 Legislação e Jurisdição

O Estado regula as relações interssubjetivas através de 2 atividades: (1) legislação – normas abstratas; (2) jurisdição: aplicar a legislação ao caso concreto.

Questão: O que é ordenamento jurídico?

Há duas teorias que tentam explicar:

Teoria dualista – Chiovenda
Teoria unitária – Carnelutti
O ordenamento se divide em material e processual.
Não há como separar o direito material do processual, pois eles se completam. Os direitos nascem quando existir uma sentença

 Lei material  +   Processo  +  Procedimento = Direito Processual = Jurisdição                                    

Direito Material: é o arcabouço jurídico que disciplina as relações jurídicas referentes a bens e utilidades da vida (CP, CC, CLT etc.).
Processo: soma de atividades em cooperação, poderes, faculdades, deveres, ônus e sujeições que impulsionam a atividade jurisdicional.
Direito Processual: é o exercício conjugado da jurisdição pelo Estado-juiz.

Obs.: o direito processual pátrio foi tradicionalmente norteado pelo P. dispositivo, segundo o qual o juiz, mantendo-se equidistante, aguarda a iniciativa das partes no que se refere à afirmação dos fatos constitutivos de seu direito e a respectiva produção de provas. Cuidado! há exceções.

2.8 A instrumentalidade do processo

O processo é um instrumento a serviço da paz social (social, político e jurídico).
Possui dois aspectos: Positivo (liga o sistema processual à ordem jurídica); negativo (não deve possuir uma regra absoluta).

[Próxima aula: Aula III – Fases do direito processual]

Leitura obrigatória: Texto 2 - gerações de direitos: liberdade, igualdade e fraternidade.

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