domingo, 9 de setembro de 2012

PENAL 3/AULAS VIII e IX

AULAS VIII E IX

AULA VIII – DA PERICLITAÇÃO DA VIDA E DA SAÚDE

8.1 Art. 130 – Perigo de contágio venéreo

Tutela-se a incolumidade física e a saúde da pessoa, aqui exposta, por meio de relações sexuais ou qualquer ato libidinoso, ao contágio de moléstia venérea. Magalhães Noronha inclui a “vida” como bem jurídico tutelado (minoritário), todavia, o legislador não teve essa intenção, já que não previu a hipótese de resultado morte em decorrência do efetivo contágio. Nessa hipótese, o agente responderá por lesão corporal seguida de morte ou homicídio culposo.

Exemplos de doenças venéreas: cancro, hepatite, gonorreia etc.

Cuidado! expor a perigo: pena de 3 meses a 1 ano; se o agente quer transmitir: pena de 1 a 4 anos (forma qualificada). A ação penal é pública condicionada à representação.

8.1.1 Sujeitos do crime: ativo – pessoa portadora de moléstia venérea (crime comum), inclusive o cônjuge. Para Rogério Sanches, o crime é próprio, já que o tipo exige sujeito ativo portador de doença. Passivo – qualquer pessoa, havendo ou não o consentimento.

Questão: Caso a vítima saiba da moléstia e consinta com a relação, o agente deverá ser punido? Para Rogério Greco, se sobrevier uma lesão leve, não há falar em crime (disponibilidade relativa). Para a corrente majoritária, o consentimento não poderá excluir o delito, pois o que se protege é a disseminação da doença.

8.1.2 Consumação: trata-se de crime de ação vinculada, exigindo contato sexual (corpóreo) entre agente e vítima. Damásio defende que se o contato não for sexual (aperto de mão, ingestão de alimentos ou utilização de objetos), não haverá esse crime. Veja que é imprescindível a prova pericial da contaminação.

Questão: Quais são as doenças/moléstias venéreas que integram esse tipo penal? Trata-se de uma norma penal em branco, pois a expressão é genérica e indeterminada, devendo ser complementada por normas do âmbito do Ministério da Saúde.

8.1.3 Tipo subjetivo:

a) perigo de contágio doloso: o agente “sabe” estar contaminado e aceita a transmissão ao parceiro (caput).
b) dolo eventual: o agente “devendo saber” estar contaminado, assume o risco de transmitir a moléstia (caput). Há quem defenda, com base na exposição de motivos do CP, que a expressão “deve saber” se refere à culpa consciente.
c) dolo de dano: intenção positiva de transmitir a moléstia de que está contaminado – dolo direto (§ 1º).
d) dolo de dano com a efetiva contaminação do parceiro, resultando lesão grave ou morte: o agente responderá pelo art. 129 (lesão grave ou resultado morte, pois as penas são maiores). Bitencourt alerta que esse entendimento está equivocado, pois o próprio parágrafo 1º prevê punição para essa transmissão dolosa, não devendo prevalecer a aplicação de lesões corporais, salvo no caso de morte da vítima (lesão corporal seguida de morte).

A classificação do dolo acima em (direto e eventual) é trazida pela majoritária corrente. Todavia, corrente minoritária (Bitencourt) alerta que a expressão “deve saber” está relacionada, em verdade, com a potencial consciência da ilicitude.

8.1.4 Consumação: momento da prática do ato sexual capaz de transmitir a moléstia (crime formal). Se o agente usar preservativo, o dolo do agente será afastado. Agora, se o preservativo não resistir ao ato, entende-se que o agente assumiu o risco da transmissão, devendo ser punido por esse motivo.

8.1.5 Pontos relevantes:

1) Transmissão de HIV – poderá configurar lesão corporal seguida de morte, perigo de contágio de moléstia grave ou até mesmo homicídio. Entretanto, jamais poderá configurar perigo de contágio de moléstia venérea (não depende de relação sexual para a transmissão).
2) vale lembrar que se a transmissão adveio de estupro, a contaminação será causa de aumento do crime contra a dignidade sexual.

8.2 Art. 131 - Perigo de contágio de moléstia grave

Tutela-se a incolumidade física e a saúde física da pessoa. O tipo abrange não só as moléstias venéreas, mas todas as moléstias graves. Para parcela da doutrina, protege-se, também, a vida (o que não prevalece, pelos mesmos motivos do crime anterior). A ação penal é pública incondicionada.

Exemplos de moléstias graves: febre amarela, peste, cólera, tifo exantemático, varíola, alastrim, difteria, infecção puerperal, infecção do grupo tífico-paratífico, lepra, tuberculose aberta, impaludismo, sarampo, disinterias, meningite cérebro-espinhal, paralisia infantil, tracoma, leishmaniose etc.

Cuidado! Se houver transmissão de doença venérea grave de forma diversa de ato libidinoso, o crime praticado será esse do art. 131. Nada impede a configuração do crime em estudo se a moléstia grave for transmitida por ato libidinoso. Ex.: HIV.

8.2.1 Sujeitos do crime: ativo – qualquer pessoa, desde que contaminadas (crime próprio). Passivo – qualquer pessoa não contaminada.
8.2.2 Conduta: pune-se a pratica de qualquer meio direto (contato físico) ou indireto (sem contato físico), capaz de transmitir (delito de ação livre). O tipo penal menciona apenas que a moléstia tem que ser grave. De igual forma, há nesse crime uma norma penal em branco. Todavia, existe doutrina criticando esse entendimento (Pierangeli – aduz que, mesmo se a doença não estiver etiquetada em norma penal em branco, será considerada moléstia grave capaz de configurar o crime). Assim, a moléstia grave não precisa estar taxativamente descrita em outra norma (no mesmo sentido: Bitencourt, Luiz Régis Prado e FMB).

Questão: E se os objetos ou coisas que o agente utilizar, com o fim de transmitir a moléstia, já estiverem contaminados com germes e micróbios dos quais ele não é portador, responderá pelo crime em estudo? De acordo com Bitencourt e Rogério Greco (majoritário), o agente não deverá ser responsabilizado por este crime (art. 131, CP), mas, nada impede que ele responda por outro tipo penal (lesão corporal ou perigo para a vida de outrem). Ex.: agente saudável que perfura vítima com uma seringa contaminada.

8.2.3 Consumação: consuma-se com a prática do ato perigoso capaz de transmitir o mal visado (crime formal). Se resultar lesão de natureza leve, ficará esta absorvida (mero exaurimento). Contudo, se a lesão for grave ou resultar em morte da vítima, o agente responderá por esses crimes em concurso formal impróprio. Admite-se tentativa. Perceba que o crime é punido pelo dolo direto de dano, sendo o dolo eventual incompatível com o tipo (Mirabete).

A doutrina discute a possibilidade de transmissão por dolo eventual. Prevalece que não, pois o tipo exige finalidade de transmitir (dolo direto).

Questão: O que são crimes de intenção? São delitos que requerem um agir com ânimo, finalidade ou intenção adicional de obter um resultado, que vai além da realização do tipo penal, mas que não precisa ser alcançado para consumar o crime (consumação antecipada).

8.2 Pontos relevantes:

1) Transmissão de HIV: Para o STJ, configura tentativa de homicídio. Para o STF, trata-se de perigo de contágio de moléstia grave (HC 98.712/SP).
2) vítima já contaminada: Para a doutrina, trata-se de hipótese de crime impossível (Rogério Greco), salvo se a moléstia transmitida for diferente.
3) vítima que morre em decorrência da moléstia transmitida: deverá ser aplicada a regra do art. 19, CP – o agente responderá por lesão corporal seguida de morte (Rogério Greco).
4) transmissão realizada durante a amamentação: caso uma ama-seca, durante amamentação de uma criança, transmite a esta uma moléstia que desconhece ser contagiosa, não responderá pelo crime em tela. Agora, se sobrevier lesão corporal ou morte da criança e ficar comprovada a existência de culpa, a ama-seca responderá conforme o caso. Se, ao contrário, a criança transmitir a moléstia grave à ama-seca, os pais não responderão pelo crime, salvo se ficar comprovado o dolo.
5) erro de proibição: Bitencourt defende a possibilidade de ocorrer erro quando o agente supõe que em relação a seu cônjuge não há proibição de transmitir a moléstia grave (será capaz de reduzir apenas a pena, pois o erro aqui é inescusável). O mesmo autor defende também a ocorrência de erro de tipo quando o agente está contaminado, tem consciência de que é portador, mas desconhece que a moléstia é grave. O desconhecimento da elementar “grave” pode configurar o erro, embora seja difícil sua comprovação. Outro exemplo trazido está na hipótese que o sujeito ativo acredita estar contaminado com doença venérea, mas a moléstia é grave (imaginou a existência de uma doença que não existia, mas transmitiu outra que desconhecia). Contudo, Bitencourt alerta que para evitar impunidade do agressor, deverá ser aplicada a regra do “erro de subsunção” (o dolo foi o mesmo, qual seja, transmitir algo à vítima), devendo responder por lesões corporais.
6) transmissão de moléstia grave que resulta em epidemia: o agente responderá pelos crimes dos arts. 131 e 267, § 2º (modalidade culposa), em concurso formal.

8.3 Art. 132 - Perigo para a vida ou saúde de outrem

Tutela-se a saúde e a vida da vítima, sendo aplicável somente quando o comportamento do agente não incida em crime mais grave. Pune-se aquele que de qualquer forma coloca pessoa certa e determinada em perigo de dano direto, efetivo e iminente. Aqui, o crime é de ação penal pública incondicionada (competência do JECrim).

8.3.1 Sujeitos do crime: ativo – qualquer pessoa (crime comum). Passivo – pessoa certa e determinada, pois do contrário o crime será o de perigo comum ou contra a incolumidade pública (art. 250, CP). Nelson Hungria alerta que algumas pessoas não podem ser sujeitos passivos desse crime, desde que tenham o dever legal de afrontar ou suportar o perigo, salvo quando extrapolar os limites dos riscos. Ex.: bombeiros, policiais, enfermeiros, toureiros, operários de fábricas de explosivos ou produtos químicos etc.

8.3.2 tipo subjetivo: vontade consciente de, mediante ação ou omissão, colocar a vida ou a saúde de pessoa(s) determinada(s) em perigo. Ex.: patrão que não fornece equipamentos de segurança, desde que a omissão acarrete uma exposição concreta ao perigo. Perceba que a comprovação do perigo, nessa hipótese é indispensável, na medida em que o simples descumprimento das normas de segurança, por si só, tipifica a contravenção penal prevista no art. 19 da Lei 8.213/91 (legislação Previdenciária). O dolo pode ser direto ou eventual, em risco iminente. Não se pune a forma culposa. Rogério Sanches lembra que, havendo dolo de dano, isto é, querendo o agente atingir a vida ou a saúde de alguém, responderá por outro crime (tentativa de homicídio ou tentativa de lesão corporal).

8.3.3 Consumação: surgimento do risco (crime de perigo concreto). Se resultar em dano, como a morte ou lesões graves, o crime de perigo será absorvido pelo crime mais grave. Admite-se a forma tentada. Noronha alertava que esse crime possui um caráter “residual”, ou seja, somente poderá ser aplicado se não houver outro tipo punindo a conduta do agente. Não há punição para a modalidade culposa. Mas se sobrevier o dano, efetivamente, responderá o agente, conforme o caso, por lesão corporal culposa (somente se for aquela prevista do Código de Trânsito) ou homicídio culposo.
Questão: É notório que o crime de disparo de arma de fogo é mais grave que o delito em tela (perigo para a vida). Ocorre que o crime de disparo não deverá ser aplicado quando o agente tiver a finalidade de praticar outro crime (“desde que a conduta não tenha como a finalidade a prática de outro crime”). Nesse ponto, indaga-se: se a intenção do agente era por a vítima em perigo de vida, por qual crime deverá responder? Para Fernando Capez, deverá prevalecer seu dolo, ainda que o crime seja menos grave (perigo de vida). Rogério Sanches, por outro lado, defende a predominância do crime mais grave (disparo). Bitencourt explica que o disparo de arma de fogo deverá considerar o seguinte: (1) se o local é habitado ou a via é pública (se for local privado, não incide o Estatuto do Desarmamento); (2) se a vítima foi exposta ou não a perigo concreto.

Questão: E se do perigo resultar em crime culposo de lesão ou morte? Qual tipo penal deverá ser aplicado? Nesse caso, há duas situações: 1ª - morte culposa: esta absorverá o crime de perigo. 2ª - lesão culposa: deverá o agente responder pelo crime de perigo, pois este terá uma pena maior, evitando uma desproporção no desvalor das condutas.

8.3 Pontos relevantes:
1) Concurso de crimes: Bitencourt defende a possibilidade de concurso de crimes, pois, o fato de ser norma subsidiária, não incompatibiliza, por si só, o tipo penal com o concurso de crimes. Assim, se o agente coloca em perigo, com mais de uma conduta, duas pessoas determinadas, haverá concurso material. Por outro lado, se ele coloca várias pessoas determinadas e individualizadas, com uma só conduta, haverá concurso formal. Ex.: agredir motorista de ônibus com o veículo em movimento.
2) motorista que obriga o condutor do veículo da frente a imprimir velocidade incompatível com o tráfego, comete o delito em comento.
3) transporte ilegal ou perigoso de bóias-frias: incide na causa de aumento de pena, de 1/6 a 1/3 (perigo decorrente de transporte irregular de pessoas).
4) consentimento da vítima: a doutrina ensina que só não afastará o crime se a ato trouxer a probabilidade de resultar lesão grave, gravíssima ou morte (Rogério Greco). 


AULA IX - Art. 133 – Abandono de incapaz

O atual CP preferiu tratar o abandono em duas figuras: (1) abandono de incapaz (art. 133); e (2) abandono de recém-nascido (art. 134). O bem jurídico protegido das duas formas é a segurança da pessoa humana e seu bem estar social, protegendo o incapaz, sobretudo, contra concreta situação de perigo (protege-se a integridade físico-psíquica).

Obs.: O projeto do novo CP migra o abandono de recém-nascido para o abandono de incapaz, pois aquele é na verdade uma forma privilegiada de abandono (motivo de honra).

9.1.1 Sujeitos do crime: (1) ativo - qualquer pessoa que tenha especial relação de assistência e proteção com a vítima (a vítima deve estar sob os cuidados, guarda, vigilância ou autoridade do autor). Em outras palavras, o autor deve estar na condição de garante. Logo, trata-se de crime próprio. Faltando essa condição, poderá configurar outro crime: omissão de socorro, abandono material, abandono intelectual etc. (2) passivo – pessoa incapaz com relação de assistência com o sujeito ativo. A doutrina denomina esse crime de bipróprio.

9.1.2 Tipo objetivo: abandonar significa deixar desassistido, desamparado, incapaz de se defender dos riscos resultantes do abandono, que se encontre na especial relação de assistência já referida. Pune-se o abandono da própria pessoa e não o abandono do dever de assisti-la. O abandono, por si só, não tipifica a conduta, sendo indispensável que dele resulte um perigo concreto para a vida ou a saúde do abandonado. Trata-se de crime de perigo concreto, que depende de comprovação.

Perceba que essa incapacidade, mais que fática, é jurídica. Para Aníbal Bruno, essa incapacidade de se defender deve ser julgada não só conforme as condições pessoais da vítima, mas ainda segundo as circunstâncias em que se encontra. Pode tratar-se mesmo de adulto válido que se vê exposto em situação de perigo, da qual não pode, por si próprio, libertar-se. Tão incapazes são as crianças e os loucos quanto, em determinadas condições, os velhos, os paralíticos, os cegos, os enfermos, os bêbedos, como qualquer pessoa que, por qualquer motivo, não possa defender-se do risco a que fica exposta em razão do perigo. Aliás, como salienta Bitencourt, até mesmo uma pessoa plenamente válida, poderá estar em condição de incapacitada, ante a impossibilidade de se defender. Ex.: (1) pessoa abandonada em alto-mar em pequeno barco; (2) aprendiz de alpinismo abandonado pelo orientador no pico da montanha; (3) jovem auxiliar que o lenhador levou à floresta frequentada por animais perigosos e lá foi abandonado sem ter conhecimento do caminho de volta etc.

Atenção! Quem abandona alguém capaz (ou incapaz sem qualquer vínculo de assistência) não responderá por crime algum, salvo se a conduta adequar-se ao descrito na definição do crime de omissão de socorro (art. 135). Caso o agente tenha a posição de garantidor o agente responderá por eventual resultado danoso, lesão grave ou morte, por exemplo, se não evitá-lo. Agora, existindo a relação de assistência, sobrevindo o resultado danoso, o agente responderá pelo crime de abandono qualificado pelo resultado (há nesse caso, de acordo com Bitencourt, um equivoco do legislador). Criou-se a figura do garantidor privilegiado.

“com efeito, não deixa de ser paradoxal negar maior proteção exatamente ao incapaz, a quem o ordenamento jurídico considera hipossuficiente, pois, contraditoriamente, se do abandono de alguém capaz, maior, plenamente válido, resultar-lhe a morte, havendo aquele vínculo de ‘assistência’, o agente responderá pelo crime de homicídio, na forma comissiva omissiva, ao passo que, nas mesmas circunstâncias, se do abandono de um incapaz resultar-lhe a morte, o agente responderá somente pelo abandono de incapaz, qualificado pelo resultado (art. 133). Evidentemente que esse paradoxo persiste e somente poderá ser afastado, de lege ferenda, com a simples aplicação dos parágrafos do art. 133, adequando-o à Parte Geral, especialmente ao disposto no art. 13, § 2º”.

9.1.3 Tipo subjetivo: dolo de perigo, representado pela vontade e consequência de expor a vítima a perigo através de abandono. O dolo pode ser direto ou eventual. Vale lembrar que no delito doloso, o agente somente responderá quando conhece as condições/circunstâncias fáticas que constitui o crime. Faltando um ou outro elemento do tipo haverá erro de tipo (Roxin). Para Bitencourt, não há exigência de um especial fim de agir.

9.1.4 Consumação: efetivo abandono do incapaz, desde que este corra perigo real (concreto), ainda que momentâneo. Caso o agente reassuma o seu dever de assistência, socorrendo a hipotética vítima, o crime já estará consumado, podendo ser beneficiado pelo arrependimento posterior (art. 16, CP). Para Bitencourt, o arrependimento posterior ou eficaz são incompatíveis com esse crime na sua forma simples. Admite-se, em tese, a tentativa. Não há previsão da modalidade culposa. Contudo, se o abandono for culposo e resultar danos à vítima, o agente responderá por esse resultado (de forma autônoma – lesão corporal ou morte). Rogério Greco defende a aplicação do concurso de crimes entre o abandono e o resultado gravoso (lesão ou morte).

9.1.5 Majoração da pena: a) quando o autor for “CADI”, tutor ou curador da vítima (não se admite a inclusão de companheiro – união estável); b) vítima maior de 60 anos; c) abandono em lugar ermo – maior dificuldade ou impossibilidade de o incapaz encontrar socorro (não basta ser noite ou estar chovendo).

9.1.6 Pontos relevantes:
1) incapaz que foge da vigilância e assistência – se ele mesmo se coloca em situação de abandono, não configurará o crime, pois faltará a conduta do responsável capaz de produzir o desamparo da vítima, criando-lhe o risco efetivo.
2) obrigação de cuidado – os cônjuges são obrigados a cuidar um do outro (obrigação matrimonial), podendo configurar o crime em comento.
3) mãe que deixa filha, com menos de 4 anos de idade, na casa de pessoas estranhas, responde por esse crime, pois há risco de perigo configurado.
4) pai que sai para beber e deixa filho incapaz sozinho em casa, sem a companhia de um adulto, não prestando a devida assistência, responde pelo crime em tela.

9.2.1 art. 134 Exposição ou abandono de recém-nascido:

Para Nelson Hungria, não há distinção entre exposição e abandono, pois são idênticas, sinônimas, sendo utilizadas com o mesmo sentido. Bitencourt defende que as expressões não possuem o mesmo significado, lembrando que o direito não possui palavras inúteis. O bem jurídico protegido é a segurança do recém-nascido.

9.2.3 Sujeitos do crime: (1) ativo – somente pode ser a mãe (crime próprio), visto que objetiva ocultar desonra própria (honoris causa). É diferente que se trate de viúva ou adúltera, como sustentava a antiga doutrina, admitindo-se a própria mulher solteira, especialmente em casos de gravidez cada vez mais precoce, que vem acontecendo inclusive com pré-adolescentes, especialmente nas pequenas comunidades, onde a rigidez moral, normalmente, é mais acentuada. As adolescentes e pré-adolescentes são excluídas pela inimputabilidade, mas deverão receber a proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente. Bitencourt não admite a exclusão da prostituta como sujeito ativo desse crime. Dmásio, Hungria e Fragoso, admitiam que o pai incestuoso ou adúltero também poderia praticar esse crime. (2) passivo – somente o recém-nascido, fruto de relação extramatrimonial.

Questão: Qual é o tempo para a caracterização de recém-nascido? Para Hungria, é o momento em que a délivrance se torna conhecida de outrem, fora do círculo da família, pois, desde então, já não há mais ocultar desonra. Para Noronha, é aquele que nasceu a poucos dias. Damásio, por seu turno, entende que será recém-nascido até a queda do cordão umbilical. Fragoso e Bitencourt entendem ser aquele nascido há poucos dias, não ultrapassando um mês e desde que não se tenha tornado de conhecimento público.

Os autores, de modo geral, afirmam que o tipo penal pressupõe que o nascimento deve ter sido “sigiloso” para justificar a tipificação do delictum exceptum. Aníbal Bruno sustenta que o sigilo mencionado refere-se ao nascimento da vítima que se tenha dado em “segredo” e ainda não tenha vindo ao conhecimento de estranhos. Falar em nascimento sigiloso, segundo Bitencourt, parece um rematado exagero, quer porque a restrição não consta da definição legal, quer pela inadmissibilidade de conceber e gestar por longos nove meses sigilosamente.

Questão: E na hipótese de abandono de gêmeo recém-nascidos? O privilégio somente se justifica se a mãe abandonar a todos, caso contrário responderá pelo crime do art. 133, pois o abandono não teria sido para ocultar desonra própria. Abandonando gêmeos, a responsabilidade penal será na modalidade de concurso formal (FMB).

9.2.4 Consumação e tentativa: abandono efetivo do recém-nascido, desde que este corra perigo efetivo, isto é, concreto, ainda que momentâneo, pois é irrelevante a duração do abandono. Se a mãe reassumir o seu dever de guarda e assistência, socorrendo seu filho, mesmo assim, o crime já estará configurado, podendo, entretanto, ser beneficiada pelo arrependimento posterior. Para Bitencourt, o dolo não poderá ser eventual, pois há a necessidade de um especial fim de agir (ocultar desonra própria). Admite-se, em tese, a tentativa. Ex.: mãe que decidida expor o recém-nascido ao perigo é impedida no caminho antes de realizar seu intento.

A eventual superveniência de dano não pode ser abrangida pelo dolo, sob pena de configurar outra infração penal: homicídio ou, havendo a influência do estado puerperal, infanticídio. Não há previsão para a modalidade culposa. Contudo, se decorrerem do abandono culposo resultados danosos para a vítima, o agente responderá por esse resultado (lesão corporal ou morte), de forma autônoma, não qualificando o crime em apreço. Agora, se do abandono doloso sobrevier resultado mais grave (lesão ou morte), o agente responderá pela modalidade qualificada (crime preterdoloso).

Obs.: configura o crime quando o recém-nascido é entregue aos parentes sob a alegação de que os pais biológicos não possuem condições de criá-lo, jamais procurando para visitas ou reclamar privações.

9.3 art. 135 Omissão de socorro
O crime omissivo consiste sempre na omissão de determinada ação que o sujeito tinha obrigação de realizar e que podia fazer. Divide-se em próprio (crime de mera conduta) e impróprio (crime de resultado). Perceba que no crime omissivo próprio não há uma causalidade fática, mas jurídica, não devendo ser decorrente de deveres puramente éticos, morais ou religiosos.


Omissivo próprio (puro)
Omissivo impróprio (impuro) ou comissivo por omissão
O agente tem o dever genérico de agir (recai sobre todos).
O agente tem o dever jurídico (específico) de impedir o resultado (recai sobre determinadas pessoas) – o qual atinge somente o “garante” ou “garantidor”. Figura que existe para agir ou para evitar o resultado.
A norma mandamental decorre do próprio tipo.
A norma mandamental decorre de cláusula geral (art. 13, par. 2º, CP – o qual prevê quem é o garante ou garantidor).
A subsunção (fato/norma) é direta, eis que o dever de agir está na própria norma (a omissão está prevista no tipo incriminador).
Tipo – omissão
Subsunção DIRETA
Fato  - omissão
A subsunção é indireta. O dever de impedir o resultado deriva de uma cláusula geral (a omissão não está no tipo incriminador, está no art. 13, §2º - o tipo penal na verdade descreve uma ação – o fato consiste numa omissão).

Tipo – ação
(Subsunção INDIRETA – não possui tipologia própria)
Fato  - omissão
Responde por omissão de socorro.
Responde pelo crime comissivo, que traz o resultado que deveria ter evitado.
É unissubsistente, logo não admite tentativa.
É plurissubsistente, logo admite tentativa. Ex. salva-vidas que deseja que a vítima morra, mas um terceiro salva a vítima. O salva-vidas responderá por tentativa de omissão.
Natureza jurídica: ausência de ação esperada. Somente responde por dolo
Natureza jurídica: uma realidade onde falta a causalidade. O agente responde porque não age para evitar o resultado naturalístico. Lembre que se a omissão for dolosa o crime será doloso. Responde por dolo ou culpa

9.3.1 Bem jurídico protegido:

Preservação da vida e saúde do ser humano, tendo como fundamento o desrespeito ao dever de solidariedade humana (princípio moral erigido à condição de dever jurídico). Trata-se da violação de um dever geral. Caso seja um dever especial, constituirá outro crime. Lembra Damásio que o CP protege também a incolumidade pessoal do cidadão, não passando daí. Logo, não protege outros interesses, como a honestidade, a liberdade pessoal e o patrimônio. Caso uma pessoa saiba do cometimento de uma infração penal ou concorde psicologicamente com isso, não há falar em omissão de socorro, mas no máximo conivência criminosa, que não será punível a título de participação, salvo se constituir alguma forma de contribuição causal. Há vozes na doutrina que estendem a omissão para os casos acima (Noronha e Paulo José da Costa Jr.). Ex.: pessoa presencia homicídio e nada faz para evitar o resultado. Nesse ponto, Bitencourt lembra que o cidadão comum não está obrigado a evitar a prática de crime, pois não há essa determinação legal no CP (a obrigação se aplica às autoridades públicas – polícias e bombeiros).

9.3.2 Sujeitos do crime: (1) ativo – qualquer pessoa, não requerendo nenhuma condição particular, pois o dever genérico é de não se omitir. (2) passivo – a) criança abandonada ou extraviada; b) pessoa inválida, ferida ou desamparada; e c) qualquer pessoa em grave e iminente perigo. Note que o perigo deve ser de grandes proporções e prestes a desencadear-se, como, por exemplo, pessoa que se está afogando ou presa em qualquer coisa prestes a ser soterrada etc. Não importa quem tenha causado a situação de perigo (própria vítima, terceiros ou fenômenos naturais), salvo para o omitente (de forma dolosa ou culposa), que se transformará no garantidor e responderá não simplesmente por crime de perigo, mas por eventual resultado que advier da situação criada (art. 13, § 2º, CP).

9.3.3 Tipo objetivo: pode ser praticada de duas formas: a) direta/imediata (deixar de prestar, desde que não haja risco pessoal); b) indireta/mediata (não pedir socorro à autoridade pública). A doutrina ensina que o risco moral ou patrimonial não afasta a tipicidade da omissão, bem como o risco para terceiros (nesse caso poderá existir a excludente do estado de necessidade).

Questão: Admite-se concurso de agentes nos crimes omissivos? De acordo com a doutrina, admite-se tanto a coautoria quanto a participação em sentido estrito. Ex.: (1) duas ou mais pessoas, deliberadamente, unem as intenções para não socorrerem alguém (houve coautoria). (2) duas ou mais pessoas, presentes no local da situação de perigo, se negam de forma autônoma a prestarem o socorro (houve crime autônomo de cada uma). (3) pessoa que por telefone dá orientações a quem está no local da situação (houve participação).

Atenção! Não confunda participação em crime omissivo com participação por omissão em crime comissivo. Na participação no crime omissivo ocorre um agir positivo do partícipe que favorece o autor a descumprir o comando legal. Ex.: paciente que instiga o médico a não comunicar a existência de uma enfermidade contagiosa às autoridades sanitárias (será o partícipe da omissão). Por outro lado, na participação por omissão em crime comissivo o partícipe se omite de um dever e o autor comete a ação criminosa. Ex.: operador caixa que deixa o cofre aberto para facilitar o furto.

9.3.4 Consumação: ocorrerá no lugar e momento em que a atividade devida tinha que ser realizada. Por ser crime próprio ou puro, não admite tentativa. Agora, no caso de omissão imprópria, por depender de resultado naturalístico, admite-se a forma tentada. Vale lembrar que o erro quanto à situação de perigo, à possibilidade da conduta ou risco pessoal excluirá o dolo (erro de tipo).

Questão: E se a pessoa não souber da norma mandamental? Estar-se-á diante do erro de tipo mandamental (erro mandamental). É o erro de tipo na omissão imprópria.

9.3.5 Figuras majoradas: não há forma qualificada, pois é crime de perigo. Caso haja resultado naturalístico, o crime passará a ser de dano, aumentando a pena do agente. Se em razão da omissão sobrevier lesão corporal de natureza grave, a pena será aumentada de metadade e triplicada em caso de morte (essa mojorante é fixa). Como já estudado, nos casos de homicídio culposo e lesão corporal culposa, a omissão de socorro não constituirá crime autônomo, mas majorante daqueles.

9.3.6 Pontos relevantes:

1) Uma criança sendo jogada pela janela. Se o pai da criança observa a ação e nada faz, responderá por homicídio. Agora, se for um terceiro alheio à criança, responderá por omissão de socorro.
2) exigibilidade de conduta diversa - nos crimes comissivos integra a culpabilidade e nos omissivos funcionais serve como elemento do tipo penal.
3) agente ausente do local - não poderá responder pelo crime de omissão, mesmo tendo o dever jurídico de agir. Ex. 1: médico que sai mais cedo ou chega atrasado com a morte do paciente nesse ínterim; Ex. 2: salva-vidas conversando com a namorada longe do local do sinistro.
4) o CP adotou a T. normativa da omissão e não o da T. naturalística da omissão (causa natural física do resultado). Para Paulo José da Costa Júnior, a omissão do CP adotou a T. mista, pois há menção expressa das duas T. anteriores, dependendo do caso concreto.
5) responde pelo crime de homicídio culposo, e não omissão, o médico que, estando de plantão e, de sobreaviso em sua residência é acionado, mas negligentemente deixa de comparecer ao hospital, ministrando, por telefone, medicação.
6) respondem pela omissão de socorro os agentes que, mesmo tendo à disposição meios próprios para promover o transporte de pacientes em estado grave para outros hospitais, se negam a fazê-lo, resultando, na morte de algumas pessoas.
7) agente que não socorre vítima atropelada temendo agravar a situação – há uma motivação justa que permite afastar a censurabilidade do comportamento (inexigibilidade de conduta diversa). Mas, nesse caso, deverá buscar socorro.
8) omissão de socorro no Estatuto do Idoso - art. 97, Lei 10.741/03.
9) omissão de socorro no CTB – art. 304, Lei 9.503/97.
10) recusa da vítima em deixar-se socorrer – se o agente verificar, no caso concreto, que se trata de criança abandonada ou extraviada, ou pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo, deverá, mesmo contra a vontade expressa da vítima, prestando-lhe o necessário socorro (os bens protegidos são indisponíveis).

9.4 Art. 136 – Maus tratos

Os bens jurídicos tutelados são a vida e a saúde da pessoa humana, ou seja, a integridade fisiopisíquica do ser humano, especialmente daqueles submetidos a autoridade, guarda ou vigilância para fins de educação, ensino, tratamento ou custódia.

9.4.1 Sujeitos do crime: (1) ativo – somente quem se encontre na condição especcial de exercer a autoridade, guarda ou vigilância, para fins de educação, ensino, tratamento ou custódia (crime próprio). A ausência dessa relação especial afasta a sua adequação típica, podendo configurar outro crime: exposição de perigo da vida ou da saúde de outrem. (2) passivo – somente pessoas que se encontre subordinada nas relações acima.  

9.4.2 Tipo objetivo: são várias condutas típicas (conteúdo variado): (1) privar de alimentação (basta a privação relativa, pois a total poderá configurar o crime de homicídio); (2) privar de cuidados indispensáveis (materiais, afetivos ou morais); (3) sujeitar a trabalho excessivo ou inadequado; (4) abusar de meios corretivos ou disciplinares (aqui a ação inicial é lícita, mas há abusos na execução). Nas três primeiras figuras o crime é permanente. Na última, instantâneo.

Questão: O corretivo aplicado pelos pais aos filhos, que resulta em hematomas, configura esse crime? Se não afetar a saúde do menor, nem mesmo colocando-o em risco, não haverá excesso. Vale lembrar que se esse corretivo for aplicado por tutor, curador, professor, carcereiro, entre outros, ou seja, qualquer pessoa diferente dos pais, configurará o crime.

9.4.3 Tipo objetivo: Para Euclides Custódio da Silveira, é indispensável a consciência do abuso cometido, sob pena do erro de tipo. Está excluído o dolo de dano desse tipo penal, bastando a probabilidade de sua ocorrência (o crime é formal e de perigo).

9.4.4 Forma majorada: o Estatuto da criança e do adolescente acrescentou o § 3º, prevendo a elevação de 1/3 da pena em razão da menoridade da vítima.  Qualificam o crime: exposição que resulta lesão corporal de  natureza grave ou morte.

9.4 Pontos relevantes:

1) mulher vítima de maus-tratos – não poderá ter o marido como sujeito ativo, pois não há nenhuma relação de autoridade, guarda ou vigilância entre os cônjuges, seja para educação, ensino, tratamento, custódia ou qualquer outra finalidade. A situação será a mesma em relação ao filho maior de idade.
2) elementar especial do crime – Nelson Hungria defende que essa subordinação é um pressuposto para a configuração do crime. Para Frederico Marques, trata-se de um elemento constitutivo do tipo. Bitencourt, por sua vez, defende ser uma elementar típica especializante.
3) simples empurrão ou meto tapa, por mais antipedagógico que seja, não configura o crime.
4) maus-tratos e tortura – não existe coincidência de motivação entre esses crimes. Nos maus-tratos, o agente atua para fins de educação, ensino, tratamento e custódia. Na tortura, a intenção é aplicar castigo.
5) erro de proibido indireto (agente erra sobre os limites de uma causa de justificação).

9.5 art. 137 – Rixa (no projeto do novo CP: confronto generalizado)
Briga perigosa entre mais de duas pessoas (no mínimo três rixosos), agindo cada uma por sua conta e risco, acompanhada de vias de fato ou violências recíprocas. Trata-se de uma infração de menor potencial ofensivo. Flávio Queiroz de Moraes define como o “conflito que, surgindo do improviso entre três ou mais pessoas, cria para estas uma situação de perigo imediato à integridade corporal ou à saúde”.
Há quem defenda que deveria estar catalogada no título dos crimes contra a paz pública, pois há uma ameaça e perturbação a ordem e a paz públicas. O núcleo é participar. O bem jurídico protegido direto é a incolumidade da pessoa humana; o indireto é a ordem e a paz pública.

9.5.1 Tipo subjetivo: é o dolo. Note que o legislador disse mais o que deveria, pois fez a ressalva da intenção de separar os contendores. Se o agente durante a rixa muda seu ato para separar a rixa, responderá por esse delito (rixa).
O tipo penal exige o número plural de agentes (plurissubjetivo ou de concurso necessário). Lembre-se que os crimes plurissubjetivos se dividem em: condutas paralelas; concorrentes; e contrapostas.

9.5.2 Sujeitos do crime: Para Rogério Greco, o delito é sui generis, pois o sujeito ativo é ao mesmo tempo o sujeito passivo (os rixosos agem uns contra os outros).

Questão: Por ser crime de concurso necessário, admite-se participação? Vale lembrar que a participação pode ser: a) material: o agente toma parte na luta, trocando agressões (partícipe da rixa); b) moral: o agente não toma parte na luta, limitando-se a instigar os agressores (partícipe do crime de rixa). Note que ambos responderão pelo delito.

9.5.3 Consumação: com o início do conflito. Para a corrente majoritária, trata-se de delito de perigo abstrato ou de perigo presumido. Para a Defensoria Pública e STF (em alguns julgados) trata-se de crime de perigo concreto.

Execução do delito: para a maioria é crime unissubsistente, não admitindo fracionamento (tentativa). Nelson Hungria admite a tentativa no caso de frustrar o início da rixa combinada (ex propósito). Ex.: quando uma rixa foi combinada e alguém impede sua execução.

Subtaneidade da rixa: não é necessário que ela surja de improviso; pune-se também a preordenada. Não se admite a tentativa na rixa ex improviso, mas na ex proposito, em tese, é admitida. Ex.: três grupos rivais combinam a rixa, mas antes de iniciá-la são impedidos pela polícia.

Questão: É possível alegar legítima defesa na rixa? 1ª corrente - se a pessoa não estiver participando da briga, poderá alegar a excludente para a se defender para não ser engolido pelo tumulto; 2ª corrente - se a pessoa estiver participando da briga, não poderá alegar a excludente, mas poderá excluir outro crime quando diante de agressões desproporcionais, exorbitantes. Ex.: durante a rixa, alguém saca uma arma, nesse caso, devido a desproporcionalidade da possível agressão, o outro rixoso poderá sacar uma segunda arma para se defender.

Questão: E se resultar lesão grave ou morte, quais as consequências? 1º sistema - solidariedade absoluta: se da rixa resultar lesão grave ou morte, todos os participantes respondem pelo delito, independentemente de se apurar quem foi o seu real autor; 2º sistema - cumplicidade correspectiva: havendo morte ou lesão grave, não sendo apurada a autoria, todos responderão pelo delito, com sanção intermediária entre a de um autor e a de um partícipe do crime; 3º sistema - autonomia (adotado pelo CP): a rixa é punida por si mesma. Havendo lesão ou morte, qualifica-se o crime. Apenas o causador da lesão ou da morte responderá pela qualificadora (6 meses a dois anos). Note que mesmo qualificada continuará sendo de menor potencial ofensivo.

Hipótese de qualificadora: 1ª situação - não se apurando o causador da lesão grave, a vítima também responderá pela qualificadora, em razão do maior perigo da briga. Aqui há um resquício de responsabilidade penal objetiva no CP; 2ª situação - se em razão do tumulto houver morte, apurando-se a autoria do golpe fatal, há duas correntes: 1ª corrente - todos respondem pela qualificadora, sendo que o agressor fatal cumulará o homicídio, não havendo bis in idem (qualifica-se pelo maior perigo da luta); 2ª corrente - para evitar o bis in idem, o agressor fatal responderá pela rixa simples, cumulada com o homicídio. Os demais rixosos pela forma qualificada; 3ª situação - havendo abandono da luta, por um dos rixosos, antes da morte da vítima, não se apurando o autor do golpe fatal, todos responderão pela qualificadora, pois quem abandona concorre de qualquer forma para a briga ficar mais perigosa; 4º situação - em caso de substituição de rixosos, havendo morte da vítima, não se apurando o autor do golpe fatal, quem substituiu a vítima responderá pela rixa simples, pois não concorreu para a morte do substituído. Os demais rixosos respondem pela qualificadora.

9.5.4 Pontos relevantes:

1) eventuais não participantes da rixa, podem também figurar como vítimas do crime quando atingidos pelo tumulto.
2) a rixa também é conhecida como sururu, sarilho, banzé, fuzuê, rolo e baderna.
3) o local da rixa é irrelevante e a simulada não constitui crime, em razão da ausência do animus rixandi, ainda que sobrevenha lesão grave ou morte. Nesse caso, os rixosos responderão por crime culposo, de forma autônoma.
4) A rixa à distância é admitida, dispensando o corpo a corpo. Ex. arremesso de objetos (cadeira, garrafas etc.).
5) a troca de agressões verbais não configura rixa, podendo ser algum tipo contra a honra.
6) não é possível o perdão judicial.
7) rixa nos eventos esportivos (Estatuto do Torcedor), reclusão de 1 a 2 anos. Crime de menor potencial ofensivo.
8) Para Rogério Greco, é possível a modalidade omissiva quando o agente gozar do status de garantidor. Ex.: no interior da cela de uma delegacia, alguns detentos começam a se agredir reciprocamente, gerando uma pancadaria indiscriminada. O carcereiro responderá pelo crime, se assistir a tudo e nada fizer (omissão imprópria).
9) confronto entre dois grupos – não haverá rixa, mas vias de fato ou homicídio.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

ESPAÇO PARA CRÍTICAS, SUGESTÕES E PERGUNTAS.