AULA VII – CRIMES CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA
O Código Penal brasileiro no capítulo III do Título I traz
os delitos de perigo individual (Da Periclitação da Vida e da Saúde). O Título
VIII trata a respeito dos crimes contra a incolumidade pública (os crimes
aqui previstos são de ação penal pública incondicionada).
Perigo Individual é aquele que expõe ao risco de
dano, bem jurídico de uma pessoa determinada ou um número determinado de
pessoas. Já os delitos de perigo comum ou coletivo são aqueles
que expõem ao risco de dano interesses jurídicos de um número indeterminado de
pessoas.
O elemento subjetivo dos delitos de perigo comum é quase
sempre o dolo de perigo, no qual o sujeito age com o fim de criar um
perigo de dano a um ou vários bens jurídicos protegidos. No caso do Título VIII
a comunhão de bens que se pode proteger recebe o nome de incolumidade
pública. Isto quer dizer que a incolumidade pública reúne na sua ideia
a proteção concomitante de vários bens, como, por exemplo, a integridade
física, a vida, o patrimônio, a saúde pública e a segurança nos meios de transporte.
O dolo de perigo nesses delitos pode ser direto (quando o
agente age com o fim de expor o bem jurídico diretamente a risco de dano) ou
dolo eventual (quando o autor realiza a conduta assumindo o risco de produzir o
resultado, que é o perigo de dano)
Os delitos de perigo comum também são punidos, em regra,
culposamente (há exceções em que se pune apenas o dolo).
Forma qualificada: Quando o crime de perigo comum for doloso e dele
resultar lesão corporal de natureza grave, a pena privativa de liberdade é
aumentada de metade; se resultar morte é aplicada em dobro; quando se admite a
forma culposa, se resulta lesão corporal, a pena aumenta-se da metade; se do
fato resulta morte, aplica-se a pena cominada ao crime de homicídio culposo, aumentada
de um terço (CP, art. 258).
Havendo várias vítimas, responderá o agente por apenas um
delito qualificado pelo resultado, excluindo-se o concurso formal (Bitencourt).
Se do crime resulta morte e lesão corporal, aplica-se a qualificadora da morte,
por ser mais grave. Assim, havendo na lei expressa previsão da genérica
qualificação dos crimes de perigo comum em decorrência de lesões pessoais ou de
morte, não há como considerar separadamente tais resultados para admiti-los
como figuras autônomas, ao lado do crime de perigo que as ensejou. Todavia,
como o legislador somente qualifica o crime de perigo coletivo doloso (quando
houver morte ou lesão corporal grave), sobrevindo lesão corporal leve, será
inevitável admitir o concurso de crimes (de perigo comum e o de lesão leve).
Vale registrar que neste Título também se encontram crimes
de perigo abstrato e de perigo concreto:
Crimes de perigo abstrato são aqueles em que não é
necessária a comprovação do efetivo risco ao bem jurídico protegido, sendo suficiente
a realização da conduta. Cita-se como exemplo o tipo penal do art. 253 do CP
(Fabrico, Fornecimento, Aquisição, Posse ou Transporte de Explosivos ou Gás
Tóxico ou Asfixiante).
Crimes de perigo concreto são aqueles que exigem a
demonstração do efetivo risco ao objeto jurídico protegido no caso em concreto (ex.:
o art. 250 do CP – Incêndio).
8.1 Art. 250 Incêndio
O bem jurídico protegido é a incolumidade pública que
consiste nos vários bens jurídicos protegidos (vida, integridade física,
patrimônio etc.) de um número indeterminado de pessoas.
O resultado normativo é a efetiva afetação ao bem jurídico
protegido, proveniente de uma conduta dolosa ou culposa. É irrelevante para a
sua ocorrência qualquer resultado naturalístico.
O caput prevê a conduta básica do delito que é a
causação do incêndio que expõe a risco a vida, integridade física e patrimônio
de um número indeterminado de pessoas. O § 1º estabelece causas de aumento de
pena subjetivas (inciso I) e objetivas (inciso II). Por fim, o § 2º define o
incêndio realizado de forma culposa (negligência, imprudência ou imperícia).
8.1.2 Sujeitos do delito: Ativo – qualquer pessoa (inclusive o
proprietário). Passivo – coletividade.
8.1.3 Tipo objetivo: O crime de incêndio é de perigo, caracterizando-se pela
exposição a um número indeterminado de pessoas a perigo. Somente haverá o crime
em análise se o incêndio acarretar perigo para um número indeterminado de
pessoas ou de bens. Se o agente visar expor a perigo somente uma pessoa certa e
determinada, o crime será aquele do art. 132 do CP. Não basta a potencialidade
do perigo, pois é necessário que este seja concreto e efetivo.
Assim, se o fogo ficar setorizado em um cômodo da casa ou com facilidade de ser
apagado pela vítima ou terceiros, inexistirá o crime.
8.1.4 Tipo subjetivo: vontade consciente de causar incêndio. Se visar a
obtenção de vantagem pecuniária, em proveito próprio ou alheio, a pena será
majorada em 1/3. Poderá configurar crime contra a segurança nacional (art. 26
da Lei 6.620/78). Consuma-se com a superveniência da situação de perigo comum,
e não apenas com início do fogo. Não se trata de perigo abstrato, sendo
necessária não apenas a produção de fogo autônomo e relevante, mas também a
verificação do perigo concreto e efetivo, embora não se exija a produção de
chamas. Admite-se a tentativa.
8.1.5 Formas qualificadas: § 1º:
inciso I – intuito de obter vantagem pecuniária em
proveito próprio ou alheio (o agente que incendeia coisa própria para receber
seguro sem expor em perigo a coletividade responde pelo art. 171, CP).
Inciso II – (a) em casa habitada ou destinada a habitação
(basta que o agente saiba ser a casa destinada à habitação, sendo desnecessária
a presença de pessoas dentro dela); (b) em edifício público ou destinado a uso
público (igrejas, cinemas, teatros etc.) ou obra de assistência social
(hospitais, creches, sanatórios etc.) ou veículo de cultura (museus,
bibliotecas etc.); (c) em embarcação, aeronave, comboio ou veículo de
transporte coletivo (barcos, trens, ônibus, aviões – não precisam estar
ocupados com pessoas ou coisas); (d) em estação ferroviária ou aeródromo
(construções portuárias e estações rodoviárias); (e) em estaleiro, fábrica ou
oficina (mesmo que se verifique a ausência de pessoas no local); (f) em
depósito de explosivo (matéria detonante ou deflagrante), combustível
(substância capaz de fomentar o fogo) ou inflamável (substância facilmente
combustível); (g) em poço petrolífero ou galeria de mineração (em razão da
gravidade dos efeitos produzidos); (h) em lavoura, pastagem, mata ou floresta
(lavoura é terra cultivada; pastagem é campo coberto de ervas para a
alimentação do gado; mata é o conjunto de árvores de grande porte, e floresta é
agrupamento de matas).
8.1.6 Forma culposa: é admitida. Ex.: (1) pessoa ateia fogo em vegetação sem
guarnecê-la da proteção necessária, dando causa a incêndio, com consequentes
danos ao patrimônio alheio e perigo para a incolumidade pública; (2) agente
que, agindo com imprudência, provoca explosão ao inserir óleo diesel em lamparina
ainda acesa, permitindo, assim, que o fogo se alastre pela residência da
vítima, causando morte de uma pessoa.
8.1.7 Concurso com o crime de homicídio: quando o sujeito ativo objetiva,
com a produção do incêndio, matar ou lesionar pessoa certa, haverá concurso
formal entre o delito de incêndio e homicídio qualificado (art. 121, p. único,
III, CP), tentado ou consumado, ou o de lesão corporal, com a agravante do art.
61, II, d, CP. Se o incêndio é motivado por inconformismo político, o crime
será o do art. 20 da Lei 7.170/83.
Art. 20 - Devastar, saquear, extorquir, roubar,
seqüestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão,
praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou
para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas
clandestinas ou subversivas.
Pena: reclusão, de 3 a 10 anos.
Parágrafo único - Se do fato resulta lesão corporal
grave, a pena aumenta-se até o dobro; se resulta morte, aumenta-se até o
triplo.
8.1.8 Incêndio em mata ou floresta (crime ambiental): O art. 41 da Lei 9.605/98 dever
preponderar quando o incêndio não expõe em perigo a incolumidade pública, visto
que a norma ambiental resguarda a integridade das matas e florestas. Se o fogo,
porém, for provocado em lavoura ou pastagem, poderá incorrer o agente nas penas
do art. 250, CP, já que o art. 41, acima mencionado, refere-se tão somente ao
fogo potencialmente lesivo às matas e florestas (Luiz Régis Prado).
Atenção! Responde pelo crime em estudo o agente que
propositadamente põe fogo em vegetação de uma região que sabe ser habitada.
Questão: Que crime pratica o agente que ateia fogo em local
afastado de outras construções e pessoas? O fato poderá configurara o crime de
dano se com o incêndio não houve a criação de um perigo comum.
Questão: Por qual tipo penal responde o agente que provoca
incêndio ocasionando poluição atmosférica? Para a hipótese de poluição
atmosférica (com resultados lesivos à saúde humana, aos animais e à flora),
poderá incorrer o agente nas penas do art. 54 da Lei de Crimes Ambientais.
Questão: É necessário prova pericial para o crime em estudo? O
laudo técnico sobre o incêndio é indispensável para a comprovação da
materialidade do crime de incêndio (o laudo determinará o motivo, local de
início do fogo, o perigo gerado e a extensão do dano). Bitencourt defende que a
falta ou insuficiência de prova direta da ação de atear fogo prejudica a
reprovação penal, ainda que indícios levem à certeza da autoria.
8.1.9 Pontos relevantes:
1) a causação de incêndio em coisa própria, sem a produção
de perigo comum é considerado fato atípico.
2) atear fogo em restos de árvores já sem vida não
configura o delito do art. 41 da Lei 9.605/98, cujas elementares são: mata ou
floresta, vegetação cerrada e de grande porte (TJRS).
8.2 Art. 251 - Explosão
8.2.1 Tipo objetivo: a conduta tipificada é expor a perigo, que tem o sentido
de arriscar, colocar em perigo o bem protegido. Difere do art. 132, por
acrescentar o patrimônio de outrem na tutela penal (número incerto de pessoas).
a) Explosão: ato ou efeito de rebentar com violência,
estrondo, estrupo e deslocamento de ar.
b) arremesso de engenho de dinamite ou de substância de
efeitos análogos (consiste no lançamento a distância de artefato feito de
substância explosiva, que pode ser de dinamite ou nitroglicerina ou TNT,
explosivos à base de ar líquido, as gelatinas explosivas etc.).
c) colocação de dinamite ou substância de efeitos análogos
(pôr em determinado local).
8.2.3 Tipo subjetivo: não há finalidade especial (se for para fins de
vantagem pecuniária, o crime será majorado). Consuma-se com a explosão,
arremesso ou colocação do engenho (desde que haja iminente perigo). Admite-se a
tentativa.
8.2.4 Formas: (1) privilegiada: se o artefato usado não for dinamite
ou substância de efeitos análogos aplica-se pena mais branda; (2) majorada:
ocorrência de qualquer das hipóteses elencadas no art. 250, § 1º, I e II, CP
(do incêndio); (3) culposa: não abarca o mero arremesso ou a colocação
do artefato explosivo, mas somente a explosão. Caso não ocorra perigo à
incolumidade pública, e não sendo própria a coisa, responderá o agente pelo
delito de dano qualificado (art. 163, p. único, III, CP) ou pelo art. 42 da Lei
9.605/98. Se a explosão ofender a segurança nacional, o agente responderá pelo
art. 20 da Lei 7.170/83.
Atenção! Homicídio praticado com uso de explosivo – poderá
haver concurso formal (homicídio qualificado e explosão).
8.2.5 Pontos relevantes:
1) arremesso de fogos de artifício em local ocasionalmente
desabitado, não causando danos ao ambiente, não pode denotar o crime de
explosão, mas contravenção penal (art. 28, LCP).
2) bomba colocada ao lado da janela da sala de aula com o
objetivo de atingir desafeto faz com que sejam imputadas ao agente causador do
perigo as sanções cominadas no art. 251, § 1º, do CP.
3) queima de fogos e soltura de balões: art. 28 da LCP.
4) pesca com utilização de explosivos: crime ambiental
(art. 35).
8.3 Art. 252 Uso de gás tóxico ou asfixiante
8.3.1 Tipo objetivo: a conduta criminalizada é expor a perigo a vida, a
integridade física ou o patrimônio de indiscriminado número de pessoas. Na
execução dessa exposição a perigo o agente utilizará gás tóxico (que ocasione o
envenenamento) ou asfixiante (que ocasione sufocação). A natureza ou qualidade
do gás deve ser comprovada através de exame pericial. Noronha lembra que o gás
não precisa ser mortal, podendo até ser inócuo para o indivíduo, mas nocivo ao
patrimônio.
O crime é de perigo concreto, por isso já se
decidiu que “não caracteriza o crime previsto no art. 252 do CP a conduta de
quem adapta veículo automotor e com ele transita, acionado a gás liquefeito de
petróleo, em face da ausência de prova de perigo concreto” (TJSP).
8.3.2 Tipo subjetivo: somente serão responsáveis criminalmente os que
lhe tenham dado causa, ainda que indiretamente, com dolo ou culpa. O consuma-se
com a instalação da situação de perigo concreto. É indispensável a ocorrência
efetiva de perigo para a incolumidade pública. Admite-se, em tese, a tentativa
e a forma culposa.
8.3.3 Pontos relevantes:
1) A detonação de ampola de gás lacrimogêneo, mesmo em
recinto fechado, não tem toxicidade suficiente para criar o perigo exigido pelo
tipo penal. A conduta será atípica.
2) Se o gás não é tóxico ou asfixiante, poderá o ato
configurar contravenção penal (art. 38 da LCP).
3) o agente que com sua conduta visa expor a perigo de
vida número determinado de pessoas pratica o delito constante do art. 132, CP.
Caso a intenção do sujeito ativo seja provocar a morte de certa pessoa,
responderá também pelo delito de homicídio qualificado (art. 121, § 2º, III, CP),
em concurso formal.
4) utilização de gás lacrimogêneo pela polícia: poderá
utilizar desde que necessária a repelir agressões injustas, atuais ou iminentes
(legítima defesa ou estrito cumprimento de dever legal).
5) gás lacrimogêneo em instrução militar: deve ser
utilizado de forma cautelosa, evitando lesões corporais (queimaduras).
8.4 Art. 253 Fabrico, fornecimento, aquisição, posse ou
transporte de explosivos ou gás tóxico, ou asfixiante.
8.4.1 Tipo objetivo: condutas típicas alternativamente previstas (conteúdo
variado): (1) fabricar (elaborar, criar, produzir); (2) fornecer
(entregar a outrem, a título gratuito ou oneroso); (3) adquirir (obter,
gratuita ou onerosamente); (4) possuir (ter sob guarda ou à disposição);
e (5) transportar (conduzir ou remover de um lugar para outro). Não
há previsão para a modalidade culposa. A tentativa é de difícil
constatação, embora teoricamente possível (a corrente majoritária não enxerga a
figura tentada).
Nas figuras “possuir” e “transportar”, o crime é
permanente. As condutas devem ser praticadas sem autorização da autoridade
competente (ausência de causa de justificação). Logo, havendo autorização, não
há falar em crime. Bitencourt assevera que o desconhecimento da inexistência
dessa licença, ou mesmo da necessidade dela, podem caracterizar erro de tipo.
8.4.2 Pontos relevantes:
1) Explosivos deteriorado, insuscetível de alcançar sua
destinação normal, não caracteriza o crime do art. 252, CP, pois ausente o
perigo à incolumidade pública, tipificando-se modalidade de crime impossível.
2) a contravenção do art. 18, LCP é absorvida pelo crime
descrito no presente artigo. Se o fabrico de explosivos é meio para a prática
do crime de dano qualificado (art. 163, p. único, II, CP), não se verifica o
concurso material, mas a absorção daquele por este.
3) Nucci menciona que não é preciso que o material só
possa ser usado para o fabrico de explosivo, mas que, em determinado contexto, seja
usada para tal fim (faz uma comparação com o tráfico de drogas. Ex.:
transportar éter sem autorização é tráfico de drogas).
4) armazenamento de quantidade considerável de fogos de
artifício em estabelecimento comercial, sem a devida permissão da autoridade competente
configura o crime em comento.
5) revogação parcial do art. 253, CP pelo Estatuto do
Desarmamento: fabricar e possuir substância ou engenho explosivo (art. 16 da
Lei 10.826/03 – aqui não cabe liberdade provisória).
6) danos nucleares: ver arts. 22 e 26 da Lei 6.453/77.
8.5 Art. 254 Inundação
As águas são desviadas de seus limites naturais ou
artificiais, expandindo-se em tal quantidade que criam perigo de dano a
indeterminado número de pessoas ou coisas.
8.5.1 Tipo objetivo: o crime pode ser praticado por ação ou omissão, desde
que, na segunda hipótese, haja o dever de evitar a inundação. Consuma-se o
delito somente se houver exposição a perigo real de vida, da integridade física
ou do patrimônio de alguém. Logo, não basta qualquer alagamento ou
transbordamento. É necessário que o agente não consiga mais exercer domínio da
força natural das águas. Admite-se a forma tentada. Ex.: o agente desvia a
trajetória das águas de um riacho e antes que estas ganhem volume são detidas
ou reconduzidas ao leito próprio.
Não confunda a tentativa de inundação com o crime de
perigo de inundação (art. 255, CP). A distinção entre ambos é feita pelo
elemento subjetivo, “pois no perigo de inundação o agente não quer o alagamento
nem assume o risco de produzi-lo”.
8.5.2 Pontos relevantes:
1) se não se configura perigo à incolumidade pública, a
inundação poderá, conforme o caso, caracterizar o crime de usurpação de águas
(art. 161, § 1º, I, CP) ou dano (art. 163, CP).
2) concurso formal impróprio com o homicídio qualificado
(o agente responderá pelos dois crimes).
3) o alagamento de pouca monta poderá constituir o crime
de dano (art. 163, CP).
8.6 Art. 255 Perigo de inundação
8.6.1 Tipo objetivo: são três ações alternativamente previstas: (1)
remover (deslocar, transpor, transferir, mudar de lugar); (2) destruir
(eliminar, fazer desaparecer); ou (3) inutilizar (tornar inútil,
inoperante ou imprestável).
O sujeito ativo não quer a inundação, embora tenha
conhecimento do perigo de sua ocorrência. Parte da doutrina entende que a
superveniência da inundação faz com que o agente responda pelo crime do art.
255 em concurso formal com a modalidade do art. 254.
8.6.2 Tipo subjetivo: é o dolo de perigo, representeado pela vontade
consciente de praticar qualquer das condutas proibidas com a consciência de
expor a perigo a vida, a saúde ou integridade física, ou o patrimônio de
outrem. Consuma-se o crime com a prática de qualquer das condutas descritas,
criando o perigo comum, independentemente da ocorrência efetiva da inundação.
Esta, se ocorrer, representará somente o exaurimento do crime, já que não era
objeto do dolo. É inadmissível, teoricamente, a tentativa.
Obs.: Há julgados responsabilizando objetivamente a
administração pública quando demonstrado o nexo causal entre a inundação e a
ausência de manutenção de bueiros e limpeza de rios.
8.7 Art. 256 Desabamento ou desmoronamento
8.7.1 Tipo objetivo: desabamento ocorre em construção. Desmoronamento, em solo,
terra, rocha etc. Segundo a exposição de motivos, a conduta em exame consiste
no fato de causar, em prédio próprio ou alheio, desabamento total ou parcial de
alguma construção (item 80). Caso não sobrevenha risco à incolumidade pública,
poderá o desabamento caracterizar a contravenção prevista no art. 29, LCP. Se
não houver perigo comum, restringindo-se o desabamento com vítimas à área
interna do terreno, desclassifica-se para os art. 121, § 3º, e 129, § 6º, CP.
Se o desabamento ou desmoronamento foi alcançado mediante emprego de explosivo,
com a consequente produção de perigo concreto é mister a aplicação do principio
da consumação, respondendo o agente apenas pelo delito do art. 251 (explosão).
Obs.: há julgados responsabilizando o engenheiro responsável
pela obra, desde que haja nexo causal. Não há falar nesse crime se o
desabamento ou desmoronamento ocorrer em local sem acesso ao público (canteiro
de obras, por exemplo). Nesse caso, o agente responderá pela lesão ou morte
culposa.
8.8 Art. 257 Subtração, ocultação ou inutilização de
material de salvamento.
Essas condutas devem ser praticadas por ocasião de incêndio,
inundação, naufrágio ou outro desastre ou calamidade, e devem ter por objeto
aparelho, material ou qualquer meio destinado a serviço de combate a perigo, de
socorro ou salvamento. Os sujeitos ativos desse crime, normalmente, são aqueles
que têm o dever jurídico de prestar socorro imposto pelo art. 135, CP (Paulo
José da Costa Jr.).
8.8.1 Tipo objetivo (ação múltipla ou conteúdo variado): (1)
subtrair (tirar, levar astuciosamente); (2) ocultar (encobrir, esconder)
ou (3) inutilizar (destruir, tornar inútil). Pode o agente utilizar-se
de quaisquer meios (violência, fraude ou ameaça). Ex.: comunicação de falsas ordens.
O comportamento omissivo, por si só, não caracteriza este
crime, salvo se o omitente tiver o dever legal de impedir a produção do
resultado (art. 13, § 2º). Se o incêndio, inundação ou naufrágio for resultado
da conduta do agente, poderá o agente responder pelo concurso material de
crimes. Caso o sujeito ativo tenha subtraído ou danificado o aparelho o
material alheio destinado ao socorro ou salvamento, responderá pelo crime de
furto (art. 155) ou dano (art. 163), em concurso material.
8.8.2 Tipo subjetivo: não há previsão para a modalidade culposa.
8.9 Art. 259 Difusão de doença ou praga
Coíbe as condutas que possam causar danos a florestas,
plantações ou animais de utilidade econômica. A simples exposição a perigo
justifica a proteção, pois a eventual produção de dano é irrelevante para a
caracterização do crime.
8.9.1 Tipo objetivo: difundir significa espalhar, disseminar, propagar.
Doença é a perturbação, a alteração da saúde ou, ainda, o processo que causa
enfraquecimento ou morte dos animais ou plantas; no caso, deve tratar-se de
doença grave isto é, de moléstia grave e transmissível (ex.: peste bubônica,
febre aftosa, lagarta das plantas, gelequídeo etc.). Praga é qualquer outro mal
grave que atinge a coletividade de plantas ou animais; praga, à semelhança da
epidemia, é um “surto maléfico” e transeunte, capas de danificar floresta,
plantação ou animais de utilização econômica. Pune-se a modalidade culposa.
Há julgados condenando proprietário de animal portador de
doença contagiosa que permite que seu animal saia do isolamento e coloca em
perigo a vida de outros animais.
Atenção! Esse crime é de perigo abstrato.
Obs.: Para Luiz Régis Prado, esse art. foi tacitamente
revogado pelo disposto no art. 61 da Lei de Crimes Ambientais, que comina pena
de reclusão, de 1 a 4 anos, e multa, para o agente que disseminar doença ou
praga ou espécies que possam causar dano à agricultura, à pecuária, à fauna, à
flora ou aos ecossistemas. Vale lembrar que nesse caso há
uma novatio legis in mellius (aplicação retroativa).
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