sábado, 11 de agosto de 2012

PENAL 3/AULA IV e V


AULA IV – CONTINUAÇÃO CRIMES CONTRA A PESSOA

4.1 Suicídio (autoquiria / autocídio): instigar, induzir e auxiliar.

Art. 122, CP:

Objeto jurídico e bem material: a vida e a pessoa contra quem se volta a conduta do agente.
Eliminação voluntária e direta da própria vida. Cuidado! Quem executa a morte consentida responderá por homicídio e não suicídio. Lembre-se que a tentativa de homicídio é fato atípico (no sudeste da Ásia é punida com a morte).

Consuma-se com a morte da vítima ou lesão corporal grave (tentativa qualificada). Para Nelson Hungria, a consumação ocorre com o simples induzimento, instigação ou auxílio, sendo a morte ou a lesão condições objetivas de punibilidade (Nelson Hungria). Contudo, Bitencourt e Damásio defendem que a ausência desse resultado incidirá na atipicidade (o resultado grave é elemento do delito). Para a doutrina majoritária (Capez, Damásio e Fragoso), não se admite a tentativa (é um exemplo de crime material que não admite tentativa). Bitencourt defende a possibilidade de crime tentado, pois o crime se consuma apenas com a morte. A lesão grave, em verdade, ainda que classificada como tentativa qualificada não deixará de ser tentativa.

A ação será pública incondicionada, admitindo-se o sursis processual. Perceba que somente haverá o crime mediante dolo.

Induzir é criar uma ideia inexistente (faz nascer a vontade). Ex.: praticar maus tratos reiterados contra a vítima (dolo eventual);
Instigar é reforçar uma ideia já existente;
Auxiliar é ajudar o suicida; é prestar assistência material. Ex.: empresta a corda ou o revólver. Não poderá participar dos atos executórios, pois nesse caso haverá homicídio. Ex.: (1) chutar o banquinho da forca; (2) empurrar do edifício; (3) ajudar amarrar a pedra no pescoço do suicida; (4) segurar a espada etc.

Questão: É possível participação na participação em suicídio? É plenamente possível, pois uma terceira pessoa poderá prestar auxílio ao autor da participação (que comete os atos do tipo penal), concorrendo para o delito. Formas de participação: (1) moral (induzimento ou instigação); (2) material.

Sujeito passivo: Qualquer pessoa, desde que tenha capacidade de resistir. Esse delito pressupõe vítima certa e determinada, quer dizer, se for publicado um livro, vídeo ou música incentivando o suicídio não estará caracterizado o delito em tela, muito menos apologia ao crime.

4.2 T. que explicam os motivos:

A) Psicopatológicos (BIONDEL): atribuído a um estado psicopatológico (ato sintomático) crônico ou eventual.
B) Sociológica (DURKHEIM): a própria sociedade produz as condições que levam o indivíduo ou suicídio.
C) Psicanalítica (FREUD): o suicídio resultaria de um autossadismo, ou seja, de uma energia agressiva contra o próprio agente. Essa teoria explica, também, os equivalentes de "suicídio" (alcoolismo acidentes intencionais etc.).
D) Psicogenética (BONNET): essa teoria explica que o suicídio sempre tem origem em um psicotrauma.

Note que a pena será duplicada se for praticado por motivo egoístico (ex.: para não dividir herança ou receber valor de seguro) ou se a vítima for índio, incapaz de oferecer resistência (ex.: embriagada, deprimida, angustiada) ou maior de 14 e menor de 18 anos (se for menor de 14 responderá o agente por homicídio. Nucci faz uma comparação com o art. 217-A: se o menor de 14 anos não é capaz de consentir uma relação sexual, certamente não será para eliminar a própria vida). Vale lembrar que há uma corrente defendendo a relativização da vulnerabilidade.

Obs.: não se admite a forma culposa. Ex.: namorada que se mata após o rompimento do namoro e os pais acusam o namorado como autor. Há quem defenda ser possível o dolo eventual. Ex.: pai expulsa o filho de casa, tendo razões para acreditar que o filho cometerá suicídio.

4.3 Pontos relevantes

1) Se a capacidade de resistência da vítima for nula (criança de tenra idade, demente etc), o agente responderá por homicídio.
2) O auxílio deve se limitar a atos acessórios. Se o agente praticar os três verbos do tipo, responderá por um só crime.
3) Greve de fome de preso - o diretor responderá por participação em suicídio pela omissão.
4) Lembre-se que deve resultar morte ou lesão corporal grave. Do contrário, haverá tentativa impunível. Da mesma forma, aquele que fica gritando “pula, aperta o gatilho etc.” cometerá fato atípico, salvo se a vítima fizer o que o incentivador gritou. Quem disser isso brincando não poderá ser punido (Paulo José da Costa Jr).
5) Pacto de morte ou suicídio a dois - aquele que convida alguém para tomar veneno ou aspirar gás tóxico. Quem praticar o ato executório responderá pelo delito. Ex.: (1) quem abrir a torneira do gás responderá pelo delito de homicídio qualificado pela asfixia, desde que sobreviva; (2) se o participante não abrir a torneira e sobreviver, responderá pelo induzimento ou instigação ao suicídio; (3) se não houver consumação por fatos alheios à vontade do executor, quem executou responderá por tentativa de homicídio, caso não resulte lesão grave; (4) se os dois abriram a torneira de gás e sobreviveram, responderão ambos por homicídio tentado. Agora, em qualquer das hipóteses anteriores que não resulte morte, mas lesão corporal grave, o sobrevivente responderá por induzimento ao suicido consumado; (5) se um terceiro abre a torneira de gás e os dois suicidas sobrevivem, somente responderá por crime quem abriu a torneira (dupla tentativa de homicídio); (6) se os dois sofrerem lesões grave, quem abriu a torneira responderá por tentativa de homicídio e o outro por instigação, induzimento ou auxílio ao suicídio.
6) roleta russa ou duelo americano – quem sobreviver responderá pelo induzimento ao suicídio a título de dolo eventual. Agora, se houver fraude indutora a erro será hipótese de homicídio (Capez).
7) Omissão no auxílio: 1ª corrente - Não há auxílio por omissão, pois auxiliar é conduta comissiva (Frederico Marques, Damásio e Roberto Lyra); 2ª corrente - é possível quando o agente tem o dever jurídico de impedir o resultado, não se distinguindo causa e condição. T. da equivalência dos antecedentes (Nelson Hungria, Nucci, Mirabete e FMB). Ex.: (1) a mãe que percebe que a filha desiludida com o namoro resolve por cabo da própria vida e nada faz para impedi-la; (2) enfermeiro que tem o dever de deixar objetos longe do doente com propósito suicida; (3) pai que percebe que o filho abriu a válvula de gás e nada faz; (4) carcereiro que deixa o preso ingressar na cela com um sinto sabendo que este tem a intenção de se matar. Perceba que para haver o crime o agente deve saber da intenção do suicida.
8) Testemunhas de Jeová – transfusão de sangue sem o consentimento do paciente (tentativa de suicídio). O art. 146, § 3º, CP permite a intervenção compulsória do médico (hipótese de estado de necessidade sui generis).

4.4 Infanticídio

O art. 123 é mais específico do que o art. 121, porque tem elementos especializantes: (i) próprio filho, (ii) estado puerperal e (iii) genitora. Alguns chamam o art. 123 de homicídio privilegiado. É uma forma especial de homicídio. Critério causa honoris (relevante valor moral). A legislação anterior punia esse delito mesmo após uma semana do nascimento.

Sujeito Ativo: Parturiente sob influência do estado puerperal. Se a mãe matar o filho sem essa influência cometerá homicídio.

Questão: Admite-se concurso de pessoas nesse crime? 1ª Corrente à o “Estado puerperal” é condição personalíssima incomunicável. Logo, não admite concurso de agentes. Esta condição personalíssima não existe no art. 30 do CP; 2ª Corrente (majoritária) à o Estado puerperal é condição pessoal comunicável. Assim, admite-se concurso de agentes (isso explica o crime ser próprio e não de mão própria).

4.5 Hipóteses:

1ª situação: parturiente e médico matam o nascente ou neonato. A parturiente e o Médico (em coautoria) responderão pelo 123, CP.
2ª situação: parturiente auxiliada pelo médico mata o nascente ou neonato. A parturiente responderá pelo art. 123, CP e o médico pelo art. 123, CP, na condição de partícipe.
3ª situação: médico auxiliado (instigado) pela parturiente, mata o nascente ou neonato. O médico responderá pelo art. 121, CP e a parturiente pelo art. 121, CP, na condição de partícipe. Note que a parturiente, nesse caso, responderá por um delito mais grave, ferindo o P. da proporcionalidade. Tecnicamente isso está certo, mas a doutrina soluciona com duas saídas: 1ª Corrente (majoritária) à o médico e a parturiente responderão pelo art. 123, CP (Fragoso, Noronha e Delmanto). 2ª Corrente à o médico responderá pelo art. 121, CP e a parturiente pelo art. 123, CP (Frederico Marques).

Sujeito Passivo: Nascente (durante o parto) ou neonato (logo após o parto).

Tipo objetivo (Conduta): tirar a vida extrauterina do filho. Matar (= art. 121,CP) + durante ou logo após o parto. Trata-se de elemento temporal constitutivo do delito. Se for antes do parto, o crime será o de aborto. Se for depois do parto, o crime será o de homicídio.  O difícil é definir até quando configura o “logo após”, e quando começa o “depois do parto”.

A doutrina diz que o “logo após” perdura enquanto a gestante estiver sob a influência do estado puerperal. Assim, o logo após” coincide com a duração do estado puerperal. O estado puerperal é determinado no caso concreto, pois cada parturiente poderá ter um estado puerperal de determinado tempo. Precisa-se de perícia para a constatação desse estado. O estado puerperal é um desequilíbrio fisiopsíquico (fisiopscológico).

Estado Puerperal – é o estado que envolve a parturiente durante a expulsão da criança do ventre materno, produzindo profundas alterações psíquicas e físicas. De acordo com Francisco Dirceu Barros, dispensa-se a perícia, pois tal estado é corriqueiro e normal em qualquer parto.

Puerpério / sobreparto / pós-parto – é o período que se estende do início do parto até a volta da mulher às condições pré-gravidez.

Obs 1: é preciso, também, que haja uma relação de causa e efeito entre o Estado Puerperal e o crime, pois nem sempre ele produz perturbações psíquicas na parturiente (este alerta está na exposição de motivos do CP).
Obs 2: dependendo do grau de desequilíbrio fisiopsíquico, a parturiente pode sofrer o mesmo tratamento do inimputável ou semi-imputável (Mirabete).
Obs 3: Para Nelson Hungria, trata-se de crime personalíssimo, incomunicável (delito de mão própria). Hoje prevalece que a elementar admite coautoria e participação, sendo um crime próprio.
Obs 4: Trata-se de um crime bipróprio, ou seja, tanto o sujeito ativo quanto o passivo são específicos.
Obs 5: Não se admite invocação do parágrafo único do Art. 26 (redução de pena), por incidir em bis in idem, salvo se somada a outra causa que retire a autodeterminação da mãe (redução de 1 a 2/3 ou aplicação de medida de segurança).
Obs 6: Se for cometido sob a influência de psicose puerperal (doença mental), a mãe deverá ser sumariamente absolvida pela excludente de culpabilidade.
Atenção! Se uma mãe deixar o filho morrer afogado com o leite durante a amamentação cometerá homicídio culposo e não infanticídio.

Tipo subjetivo: Só é punido a título de dolo, isto é, não é punível na modalidade culposa (a negligência é atípica).

Questão: E se a mãe matar o próprio filho de forma culposa sob influência do estado puerperal? 1ª Corrente à o fato é atípico, vez que inviável, na hipótese, atestar a ausência da prudência (Damásio); 2ª Corrente (majoritária) à a parturiente responde por homicídio culposo, servindo o estado puerperal como circunstância elementar de pena, e não excludente de crime (Bitencourt, Mirabete, Hungria e Capez). Ex.: dar a luz em ônibus, bondes ou trens, fazendo com que o neonato bata a cabeça e venha a óbito.

A consumação do infanticídio se dá com a morte do nascente ou neonato, sendo perfeitamente possível a tentativa. Trata-se de um delito material (é delito plurissubsistente). Admite-se a omissão imprópria. Ex.: deixar de alimentar o filho dolosamente.

Questão: Carminha deu a luz a um filho. Ela dividia quarto com Nina que também acabara de dar a luz. Carminha, em estado puerperal, entrou no quarto e esfaqueou o filho de Nina achando que era o seu. Qual crime ela cometeu? Ela continuará respondendo pelo infanticídio, em razão do art. 20, §3°, CP, pois se considera as qualidades da vítima virtual, e não real (erro sobre a pessoa).

Cuidado!

Art. 123, CP (infanticídio)
Art. 134, § 2º, CP (abandono de incapaz)
Crime contra a vida
Crime de perigo
A finalidade da mãe é matar o filho
A finalidade da mãe é ocultar a gravidez
A morte é provocada com dolo de dano
A morte é provocada de forma culposa
A competência é do tribunal do júri
A competência é do juiz singular

Questão: Mãe em estado puerperal que mata neonato anencéfalo comete infanticídio?



AULA V - ABORTO

Questão: O certo é aborto ou abortamento? Há quem defenda não existir diferença alguma. Porém, corretamente, a medicina legal diz que o delito não é aborto, mas abortamento, pois este é a conduta, aquele o resultado dessa conduta. Para essa corrente, é tão errado chamar abortamento de aborto como chamar de homicídio um cadáver. O cadáver não é crime, é o resultado do crime denominado homicídio.

5.1 Conceito: É a interrupção da gravidez com a destruição do produto da concepção.
Bem jurídico protegido: Protege-se a vida intrauterina. Por ser crime doloso contra a vida será julgado pelo tribunal do júri. Veja que tecnicamente não é um crime contra a pessoa (feto ou embrião não são pessoa).

Questão: Quando a mulher é considerada grávida? Com a fecundação ou com a nidação? São conceitos de biologia. A fecundação é o encontro do espermatozóide com o óvulo. O depósito na parede do útero do óvulo fecundado chama-se nidação. Essa distinção é necessária, pois se for considerada a fecundação como o momento da gravidez, ocorrerá o abortamento pelo uso da pílula do dia seguinte. Para o direito, prevalece que a gravidez ocorre com a nidação (normalmente 14 dias após a fecundação). Para a biologia e religião ocorrerá com a fecundação.

Nidação à até o 2º mês (aborto ovular) à até o 4º mês (aborto embrionário) à do 4º ao 9º mês (aborto fetal). Note que para ocorrer o abortamento o feto não precisa sair do útero.

Obs.: Klatz Forest, defende a descriminalização do abortamento.

Cuidado! Anúncio de meio abortivo é uma contravenção penal, não crime.

Art. 20, LCP: Anunciar processo, substância ou objeto destinado a provocar aborto: Pena - multa.

Há quem defenda que a Lei das Contravenções tem que ser totalmente revogada, por ferir o P. da ofensividade mínima.

5.2 Abortamento:

Espécies:

a) Natural – interrupção espontânea da gravidez (indiferente penal);
b) Acidental – decorre de quedas, traumatismos e acidentes em geral (indiferente penal);
c) Criminoso – art. 124/126, CP;
d) Legal ou permitido – art. 128, CP (dispensa autorização judicial);
e) Miserável / econômico-social – praticado por razoes de miséria (é crime);
f) “honoris causa – praticado para interromper gravidez adulterina (é crime);
g) Eugênico/eugenésico – praticado em face dos comprovados riscos de que o feto nasça com graves anomalias psíquicas ou físicas. O aborto de feto anencefálico é um exemplo dessa espécie.

5.3 Estado fisiológico da gravidez:

a) pílulas e o “DIU” são métodos abortivos considerados anticoncepcionais (penalmente irrelevantes – exercício regular de um direito);
b) o início é a fecundação natural ou artificial;
c) a destruição de óvulo em tubo de ensaio não é abortamento nem dano, pois não há valor econômico. Para ser aborto tem que estar no útero.
d) gravidez extrauterina (nas trompas ou ectópica – fora do útero) também não será aborto se interrompida;
e) na gravidez suposta ou putativa também não haverá aborto (crime impossível). Outrossim, na gravidez molar (desenvolvimento anormal do ovo).

5.4 Abortamento criminoso

A) Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento

Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque:
Pena - detenção, de um a três anos.

Autoaborto (crime de mão própria – pune a gestante praticando ou consentindo o aborto) Não admite prisão preventiva para a gestante primária (art. 313, I, CPP). É uma infração de médio potencial ofensivo. Médio porque admite Suspensão Condicional do Processo. É um crime doloso contra a vida (intrauterina) que admite sursis processual. A pena mínima não suplanta 1 ano.

Sujeito Ativo: Gestante. Admite participação (namorado pode induzir a namorada a praticar abortamento).

Questão: Esse delito admite concurso de agentes? 1 ª corrente - por ser crime de mão própria, não admite coautoria. Se o terceiro for além da atividade acessória, responderá como autor do art. 126, CP (Bitencourt); 2ª corrente - Admite-se a coautoria. Contudo, o coautor responderá pelo art. 126 do CP, exceção pluralista da T. Monista. (Luiz Régis Prado).

Sujeito Passivo: 1ª Corrente – o Estado (o feto não é titular de direitos, salvo aqueles expressamente previstos em lei); 2ª Corrente (majoritária) - a vítima é o feto (abrange todos os estágios da vida intrauterina).

Questão: Qual a importância prática em saber se a vítima é o Estado ou o feto? A relevância está no caso da gravidez de gêmeos. Se a gravidez for de gêmeos, a 1ª corrente vislumbra apenas um crime. Já a 2ª corrente visualiza pluralidade de crimes em concurso formal.

Condutas:

a) Autoaborto (mulher grávida provoca nela mesma a interrupção da gravidez).
b) Consente para que outrem provoque. O terceiro responde pelo art. 126.

Tipo Subjetivo: Dolo

Questão: É possível dolo eventual? Sim, no caso da gestante suicida (Nelson Hungria). Frederico Marques traz o exemplo da mulher que prevê a possibilidade de abortar praticando esforço físico (prática de esporte), assumindo o risco do crime. Note que a tentativa de suicídio sem a morte do feto não será punida por política criminal. Não se pune a modalidade culposa ou preterdolosa.

Consumação: consuma-se com a morte do feto (delito material), não importando se esta ocorre dentro ou fora do ventre materno, desde que decorrente das manobras abortivas. Tratando-se de delito plurissubsistente, admite-se tentativa.

Obs. 1: se o feto for expulso com vida e a mãe renova a intenção de matar com facadas na criança ou enforcamento, será homicídio. Para a maioria, a tentativa de aborto resta-se absorvida nessa hipótese. Lembre-se que para ser infanticídio é imprescindível o estado puerperal. Como a mãe já pretendia matar antes do nascimento, jamais será infanticídio.
Obs. 2: Gravidez psicológica - delito putativo por erro de tipo (crime de alucinação).
Obs. 3: Para o CP o consentimento é permitido pela gestante a partir dos 14 anos. Não confunda com a capacidade do direito civil.

B) Aborto provocado por terceiros sem o consentimento da gestante

Art. 125 – provocar aborto sem o consentimento da gestante (pena de 3 a 10 anos; não admite sursis processual e cabe prisão preventiva ainda que o agente seja primário).

Sujeito ativo: crime comum (qualquer pessoa)

Sujeito passivo: delito de dupla subjetividade passiva (a gestante e o feto). Outro delito duplamente subjetivo é a violação de correspondência (remetente e destinatário). Provocar aborto é interromper intencionalmente a gravidez.

Questão: Qual crime responde alguém que chuta a barriga de mulher que sabe grávida, fazendo com que ela perca o bebê? A jurisprudência diz que é aborto (dolo eventual) + lesão corporal contra a mulher. Note que será submetido ao júri.

Questão: Marido que mata a esposa que está grávida responde por qual delito? Responderá por dois delitos: homicídio da esposa (dolo direto) e aborto (dolo eventual). A jurisprudência diz que será concurso formal impróprio. Ex. 1: homem que desfere facadas em mulher grávida matando-a e expulsando o feto que também foi ferido e morre dias depois (concurso formal + aborto provocado). Ex. 2: Uma mulher com 9 meses de gestação é esfaqueada e o feto também é atingido. A mulher sobrevive aos golpes e seu filho morre dias após o nascimento em decorrência dos ferimentos. Nesse caso, estará configurado o homicídio do bebê.

Tipo subjetivo: Dolo direto ou eventual. Admite-se tentativa (crime plurissubsistente).

C) Provocar aborto com o consentimento da gestante
Art. 126 – provocar aborto com consentimento da gestante (consentimento criminoso). Não cabe prisão preventiva para o agente primário (pena de 1 a 4 anos).

Sujeito ativo: terceiro provocador (crime comum). Trata-se de concurso necessário de agentes, punido de forma autônoma (exceção à T. monista).

Sujeito passivo: apenas o feto (a gestante que consentiu responde pelo art. 124 do CP)

Questão: E se a gestante que consentiu, no meio do processo se arrepender? Se o 3° provocador não parar, responderá pelo art. 125, CP.

Questão: O namorado que leva a namorada até a clínica de aborto para a interrupção da gravidez. Quais crimes praticam cada um dos agentes? A namorada praticou aborto do art. 124, CP. O namorado será partícipe desse crime. Note que quem instiga ou auxilia a gestante a procurar um médico para abortar responderá por participação em aborto consentido. Se o namorado pagou um terceiro provocador para interromper a gravidez da namorada com o consentimento desta, a namorada responderá pelo art. 124, o terceiro provocador e o namorado pelo 126, este último como partícipe do provocador.

Obs. 1: Cuidado com o parágrafo único - dissenso presumido (não consentimento presumido por lei): se a gestante for menor de 14 anos, alienada mental ou se o consentimento foi conseguido com grave ameaça ou violência, responderá o agente pelo art. 125, CP. Note que o agente tem que saber dessas condições, senão responderá pelo art. 126. Há quem entenda existir concurso material entre aborto não consentido e constrangimento ilegal. Contudo, em decorrência do P. da subsidiariedade esse entendimento não prevalece. No dissenso real, o consentimento da gestante será provocado mediante violência  ou grave ameaça.
Obs. 2: Lembre-se que os únicos crimes dolosos contra a vida classificados como hediondos são o homicídio qualificado e o simples quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio. O aborto não é hediondo.  

Art. 124
Art. 125 (dissenso real + presumido – art. 126, parágrafo único)
Art. 126
Aborto provocado pela gestante ou c/ o seu consentimento
Provocar aborto sem consentimento da gestante
Provocar aborto com consentimento da gestante
Pena de 1 a 3 anos
Pena: 3 a 10 anos (grande potencial - inafiançável)
Pena: 1 a 4 anos (Médio potencial ofensivo)
Sujeito Ativo: mãe. Admite coautoria (3º responde pelo 126).
Sujeito Passivo: o feto

Sujeito Ativo: Qualquer pessoa (Crime comum)
Sujeito Passivo: 1) Gestante (que não consentiu); 2) Feto.
Trata-se de um delito de dupla subjetividade passiva.
Sujeito Ativo: Qualquer pessoa (Crime comum)
Sujeito Passivo: Feto
A gestante que consentiu pratica o art. 124

Sursis processual - não admite preventiva e primária (art. 313,I, CPP)
Admite preventiva mesmo se o agente for primário.
Não admite preventiva, mas o sursisprocessual sim.


Tipo Subjetivo : Dolo (direto ou eventual)
Tipo Subjetivo: Dolo (direto ou eventual)
Tipo Subjetivo: Dolo (direto ou eventual)
Delito Material: morte do feto.
Delito Material:  morte do feto.
Delito Material:  morte do feto.
Admite a tentativa
Admite a tentativa
Admite a tentativa

Obs.: Lembre-se que será fato atípico se a gestante não sabia que o feto já estava morto e toma o remédio abortivo (crime impossível).

No art. 124 e 126 vislumbra-se uma exceção pluralista à teoria monista (outras exceções no CP: art. 29, § 2º; art. 235 §1º; arts. 317; 333; 342; 343). Os crimes de abortamento são cometidos por comissão, mas admite-se a omissão imprópria.

5.5 Forma Qualificada

Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.

Obs.: O legislador diz que essa é uma forma qualificada. Todavia, tem-se uma majorante, uma verdadeira causa de aumento de pena (majoritária).

O aborto será majorado: se a lesão for grave ou ocorrer a morte da gestante. É imprescindível que esses resultados sejam culposos: dolo no aborto e culpa na lesão grave ou morte (crime preterdoloso). Aplica-se a majorante somente aos crimes dos artigos 125 e 126. Nucci defende que essa causa de aumento não prevê uma hipótese autêntica de preterdolo, admitindo o dolo eventual no crime consequente, bem como a tentativa.

Questão: Por que o art. 124 jamais será majorado pelo art. 127? Porque o direito não pune a autolesão. Note que não incidirá nem mesmo para o partícipe.

Questão: Para incidir a majorante do art. 127 é necessário o sucesso do aborto? Não! Simplesmente pelos meios utilizados já se pode aplicar a majorante. Logo, é dispensável a consumação para incidir a majorante de pena.

Questão: O 3° provocador que não consegue interromper a gravidez, mas culposamente provoca a morte da gestante, que crime pratica? 1ª Corrente - (Capez) responderá por aborto qualificado consumado pela morte da gestante. Justificativa: trata-se de crime preterdoloso, não admitindo tentativa. Aplica-se o mesmo raciocínio da Súmula 610, STF:

“HÁ CRIME DE LATROCÍNIO (ABORTO), QUANDO O HOMICÍDIO SE CONSUMA, AINDA QUE NÃO REALIZE O AGENTE A SUBTRAÇÃO DE BENS DA VÍTIMA (AINDA QUE NÃO OCORRA A INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ)”.

2ª Corrente - responderá por aborto qualificado tentado, pois não ocorreu o aborto e somente a morte da gestante. O preterdolo admite tentativa quando a parte frustrada do crime for a dolosa. Ex.: A parte dolosa não ocorreu por causas alheias à vontade do agente (dolo tentado). Não é possível a tentativa na parte culposa do crime (prevalece).

Note que para ocorrer a qualificadora o aborto não precisa ocorrer, basta resultar culposamente lesão ou morte da gestante em decorrência dos meios empregados pelo agente. Se houver dolo no aborto e dolo na lesão ou morte, haverá concurso formal de delitos (dois crimes).

5.6 Outros pontos relevantes:

1) aborto provocado em acidente de trânsito: se for a própria gestante, não será punível. Agora, se provocado o acidente por terceiro pela imprudência, responderá pelas lesões corporais de natureza culposa (expulsão do feto).
2) aborto de gêmeos – se o agente sabia da gravidez gemelar, responderá pelo concurso formal impróprio. Agora, se ele não sabia, responderá por crime único de aborto (Rogério Greco). Se a mulher desconhecia a existência de gêmeos e consentiu o aborto, não responderá pelo concurso formal impróprio, mas o médico que retirou os dois fetos, sim.
3) redução embrionária – Segundo Francisco Dirceu Barros, é plenamente possível o abortamento de alguns dos embriões quando a gestante estiver grávida de trigêmeos, quadrigêmeos ou mais e isso, de acordo com a perícia médica, torna a continuidade da gravidez inviável.
4) duração da gravidez no Código Civil: mínimo 180 dias; máximo 300 dias (não tem qualquer repercussão penal).

5.7 Art. 128 – Aborto legal ou permitido

Questão: Qual é a natureza jurídica desse delito? Prevalece que a natureza jurídica é de descriminante especial. É uma causa especial de exclusão da ilicitude (Bitencourt), e não de extinção de punibilidade. LFG diz que o inciso I é uma espécie de estado de necessidade, e, como espécie de estado de necessidade, excluirá a ilicitude. Já o inciso II, é uma espécie de exercício regular de direito, que pela teoria da tipicidade conglobante excluirá a tipicidade. Em resumo: trata-se de excludente de ilicitude.

Análise do Inciso I:

Aborto Necessário/Terapêutico/profiçático/preventivo

I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante; [forma especial de estado de necessidade]

a)     Praticado por médico
b)    Risco para a vida da gestante (não basta perigo para a saúde da gestante)
c)     Inevitabilidade do aborto

Obs. 1: dispensa o consentimento da gestante.
Obs. 2: Dispensa autorização judicial.
Questão: E se esse aborto foi praticado por outra pessoa (um enfermeiro, por exemplo)? O enfermeiro alegará estado de necessidade de terceiro (art. 24, CP). Note que ele não poderá alegar o art. 128, I (aqui tem que ser médico).

Questão: Precisa do consentimento da gestante ou o médico poderá agir sem esse consentimento? O consentimento da gestante é dispensável, mesmo que ela prefira morrer, o médico poderá interromper a gestação.

Análise do Inciso II

Aborto Sentimental/humanitário/ético
II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal. [forma especial de exercício regular de direito]

a)     praticado por médico
b)    gravidez resultante de estupro
c)     consentimento da gestante ou de seu representante legal quando incapaz

Obs. 1: dispensa autorização judicial. Será uma forma especial de exercício regular de direito. Note que para LFG será atípico (tipicidade conglobante).
Obs. 2: o STF tem decisões exigindo B.O. do estupro. Não necessita de processo crime contra o estuprador. Note que se o estupro for invenção da gestante, o médico será isento de pena (erro de tipo) e a gestante responderá por aborto consentido.
Obs. 3: é permitido o aborto também no estupro de vulnerável (art. 217-A)
Obs. 4: não há restrição quanto ao tempo de gestação.

Questão: E se for praticado por enfermeiro? Praticará crime, ou do art. 125 ou do art. 126, CP. Note que não poderá alegar estado de necessidade por ausência de perigo morte da gestante. Todavia, Bitencort alerta que a isenção de pena deve ser analisada no caso concreto, pois a inexigibilidade de comportamento diverso poderá favorecer a enfermeira.

Questão: Abrange atos libidinosos diversos (atentado violento ao pudor) de conjunção carnal?

Lei 12.015/2009
Antes
Depois
Sim, por analogia benéfica.
Sim, por expressa disposição legal.

5.8 Aborto de Feto Anencéfalo

Espécie de aborto eugênico/eugenésico

Anencéfalo: embrião, feto ou recém nascido que, por malformação congênita, não possui uma parte do sistema nervoso central, faltando-lhe os hemisférios cerebrais, possuindo apenas uma parcela do tronco encefálico.

Do ponto de vista da Lei
Do ponto de vista da Doutrina
Do ponto de vista da Jurisprudência
Não está permitido (é crime). Por falta de previsão legal, a doutrina defende não ser crime.
Pode configurar hipótese de inexigibilidade de conduta diversa para a gestante (Bitencourt).
Autoriza esta espécie de abortamento desde que:
a) anomalia que inviabiliza a vida extra-uterina,
b) anomalia atestada em perícia médica
c) prova do dano psicológico à gestante
A exposição de motivos do CP diz ser crime.
Hipótese de atipicidade, pois o feto não morre juridicamente; não existe vida intrauterina.
STF: O supremo julgou a ADPF 54, que trata desse tema, permitindo o aborto.
Existe projeto de lei autorizando.
Princípio da intervenção mínima (a questão diz respeito somente à saúde e direito da mulher)


Obs. 1: Discute-se a possibilidade de contemplar outras hipóteses. Ex.: agenesia renal - ausência de rins. Há julgados permitindo esse aborto (RT 791/581). Contudo, Nucci adverte que pelo avanço da medicina, a anomalia, por si só, não poderá autorizar o aborto.
Obs. 2: a permissão judicial desse tipo é uma hipótese de causa supralegal de exclusão da culpabilidade.
Obs. 3: Bitencourt entende que o feto anencefálico não será objeto material de crime, pois estará presente a impropriedade do objeto (hipótese de crime impossível).

AULA VI - LESÃO CORPORAL

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